Correio da Cidadania

Ocupação e protesto por saúde denunciam privatismo e promessas não cumpridas

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Cansados de esperar respostas concretas às promessas não cumpridas pelo governo, os integrantes do Fórum São Paulo de Saúde organizaram uma ocupação de um prédio abandonado na zona sul de São Paulo, no populoso bairro da Capela do Socorro. Iniciada na noite de sexta-feira, 7, e encerrada no domingo à noite, a incursão visava chamar a atenção da população para o descaso com que esse tema tão caro às campanhas eleitorais é tratado.

 

“Ocupamos um local onde deveria estar funcionando um serviço de saúde, porque a indignação já superou todos os limites. Cadê o dinheiro, para onde foi o que se pretendia investir? Quando os serviços serão realmente públicos?”, questiona Paulo Spina, membro do Fórum e funcionário de um Centro de Atenção Integrada à Saúde Mental, em entrevista ao Correio da Cidadania.

 

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Ele se refere à promessa de campanha de 2008 feita por Gilberto Kassab, que garantia a construção dos três primeiros hospitais por meio de Parceria Público-Privada (PPP) na cidade. O lugar ocupado era um dos três, enquanto os outros seriam na Penha e na Brasilândia. Além disso, também foram prometidos 50 novos serviços de odontologia, outro plano que não saiu do papel na gestão que se encerra em dezembro.

 

“Não houve muita oferta dos consórcios, tampouco captação de recursos, além de problemas na justiça... Os consórcios construiriam e depois gerenciariam os hospitais, além de receberem a concessão de serviços não assistenciais, como limpeza e lanchonetes”, explica Heitor Pasquim, outro integrante do Fórum de Saúde entrevistado pelo Correio.

 

Dessa forma, o movimento reforçou sua posição anti-privatizações, uma vez que novamente ficou atestada a ineficiência de tal modelo, cujas maravilhas só se verificam no discurso dominante. “A situação é grave e merece radicalidade. Esperamos respostas claras do governo. Queremos compromisso com unidades e serviço. Sem PPP”, avisa Spina, lembrando que o Fórum já havia promovido um protesto na Unidade Básica de Saúde Cantinho do Céu, também na zona sul, em favor da ampliação das instalações de saúde no costado da cidade habitado por mais de 3 milhões de pessoas.

 

Como se sabe, os investimentos sociais dos governos tucanos estão sempre associados a generosas contrapartidas às empresas que concorrem pela concessão de determinado serviço. Na área da saúde, isso se verifica através das Organizações Sociais (OS), surgidas em 2008 e que sofrem forte contestação de trabalhadores e usuários.

 

Além de manejarem verbas públicas não explicitadas, foram alvo de CPI em 2009, quando ficaram evidenciadas várias obscuridades acerca do uso de dinheiro público que recebiam pra administrar hospitais e postos de saúde. Definidas como “porta aberta pra corrupção e precarização do trabalho”, recebem recursos cada vez mais vultosos dos governos tucanos, a despeito da velha conversa de que a cidade e o estado não possuem recursos suficientes pra investirem e gerenciarem hospitais.

 

“Além de suas metas produtivistas, um absurdo no campo da saúde, nos locais geridos pelas OS corre solto o assédio moral e a superexploração do trabalho. Qualquer um que tiver atuação política, sindical, descoberta é demitido sumariamente. Foi o meu caso, que, enquanto trabalhei na UBS do Jabaquara, atuava clandestinamente no Fórum”, denuncia Heitor.

 

Objetivo atingido

 

Durante as 48 horas de ocupação, foi possível verificar uma considerável repercussão midiática, inclusive por parte dos principais meios de comunicação. Além disso, houve bastante adesão popular, com participação dos moradores da Capela do Socorro, que também habitaram o local durante o período e participaram das atividades promovidas pelos organizadores do protesto-ocupação.

 

“O local está abandonado há 10 anos, assusta os moradores locais, é ponto de tráfico e violências. Por isso, fizemos um pouco de arrumação, limpeza, pintura, no que contamos com muita colaboração da comunidade”, conta Paulo Spina. “Nos outros dois hospitais prometidos também fizemos atos, paramos o trânsito, passamos a mensagem”, completa.

 

Em resposta ao movimento, o governo prometeu dialogar durante a semana, mas por ora nada acontece, o que já começa a irritar os trabalhadores e usuários que participam dos protestos. “A prefeitura sempre enrola, e isso cansa a população...”, constata Heitor. “Falamos com a assessoria do governo, que prometeu tentar acionar o secretário, mas ela já disse que, por ser domingo à noite, seria difícil. Fizemos uma festa de inauguração com bastante participação dos moradores do bairro, denominamos o local de Hospital Popular e agora esperamos respostas”, relata Spina.

 

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“O secretário de saúde, Januário Montone, réu sob acusação de fraudes em licitações da merenda escolar, está se recusando a dialogar com o Fórum Popular de Saúde. Por que será?”, queixaram-se, em mensagem pública desta quarta-feira, 12.

 

De toda forma, os articuladores do movimento mostram otimismo, calculando que obter respostas práticas de um governo prestes a sair do poder beira à utopia. E que, por se tratar de um tema que não escapa às preocupações de um único cidadão, é possível fortalecer a luta em favor de conquistas na área da saúde pública e no combate às privatizações desse serviço essencial.

 

“Vimos que a repercussão foi muito boa, muita gente já prestou solidariedade. Fomos chamados pra uma unidade de saúde que passa por processo de privatização em Embu, fizemos um ato. Hoje fomos chamados pra participar de outro ato em Peruíbe. As pessoas estão vendo que tem gente mobilizada com isso e se estimulam a entrar na luta. Era o que queríamos com essa ocupação”, comemora Paulo Spina.

 

Apesar disso, o Fórum faz críticas às atuais dinâmicas de luta na área de saúde, muito restritas aos conselhos, gabinetes e sindicatos enfraquecidos. “Precisamos colocar os movimentos de saúde de novo nas ruas pra conter o apetite da iniciativa privada, que, entre outras coisas, quer 25% dos leitos do SUS, ao mesmo tempo em que, até nos hospitais privados, vemos as filas aumentarem e os serviços de especialidades diminuírem”, alertou.

 

Ignorando os tempos eleitorais que parecem suspender todos os demais assuntos da vida pública, o movimento avisa que não tem descanso pela frente. “Nessa semana, o governo só enrolou, não fez nada ainda. Se continuar assim, vamos subir o tom. Queremos fortalecer esse processo e o final de semana foi animador. Queremos que esse movimento atinja as pessoas, que estão indignadas, mas também resignadas. São muitas promessas descumpridas. O secretário de Saúde está ocupado com a campanha do Serra, mas nos deve respostas. Já o Kassab, anos atrás, ajudou a escrever o Plano de Metas elaborado pelo Movimento Nossa São Paulo, aprovado na Câmara. Sabe de tudo isso, portanto. São três pontos: promessas feitas em 2008, maior financiamento do setor e não às privatizações. O que existe hoje é um apagão na saúde”, resumiram os manifestantes entrevistados.

 

Leia também:

Um olhar sobre a saúde pública em São Paulo

Controle social do SUS está emperrado em São Paulo

 

 

Gabriel Brito é jornalista do Correio da Cidadania.

Comentários   

0 #1 Não é só São PauloMaria 15-09-2012 10:10
Quando a saúde se transforma num grande negócio


Por Michel Zaidan Filho, especial para o Blog de Jamildo

No mesmo instante em que o governador Eduardo Campos e o seu secretário da Saúde anunciavam o fim do Centro Médico do Hemope, com a doação de equipamentos de última geração, suspensão de comida para os internos e outras medidas restritivas, o IMIP anunciava a inauguração de novos leitos para pacientes de leucemia ou hemodiálise.

Não deve ter sido mera coincidência os dois eventos.

Na verdade, a política de saúde do governador parece ser o desmonte do Sistema Único de Saúde e a transferência da assistência médica pública para a fundação privada.

A questão que se pergunta, nem pela natureza desse socialismo do PSB (porque de socialismo não tem mais nada, sim, familismo), mas o que será da saúde pública depois que Eduardo Campos sair do governo de Pernambuco?

O povo terá que se submeter às condições e exigências de uma fundação privada (financiada com dinheiro público) para obter o seu tratamento ou terá que pagar - direta ou indiretamente - ao IMIP para ter um direito líquido e certo, tutelado juridicamente pelo Estado?

Não se sabe se o neto de Arraes já tinha essa intenção deliberada, desde que assumiu, ou se foi depois das trapalhadas dos secretários de saúde da primeira gestão.

O fato é que o governador sempre alimentou a idéia de transferir determinados serviços públicos para a iniciativa privada, como forma de escapar da responsabilidade social e penal pela má prestação dos serviços.

Tudo agora parece dar razão a quem desconfiava da intenção privatizante do dirigente estadual, sob alegação de mais eficiência nas políticas públicas.

Não está longe o dia em que se concretizará o prognóstico de um dirigente sindical dos médicos de que o IMIP reunirá os melhores quadros profissionais, com a ajuda do Poder Público Estadual, egressos da Faculdade de Medicina, do Hospital das Clínicas, do Serviço Público de Saúde etc.

A questão de fundo é que legitimidade tem o governador de Pernambuco para transferir para uma instituição privada recursos, pessoal e equipamentos, em detrimento do sistema público de saúde, em aberta contradição com a Constituição Federal que reza ser a saúde, como a educação e demais direitos sociais, uma obrigação do Estado e um Direito do cidadão?

Quem autorizou Eduardo Campos a fazer esta gestão público-privada, que esvazia a competência do Estado em oferecer políticas públicas de qualidade aos cidadãos e realoca os recursos no chamado "terceiro setor", sob a desculpa da busca pela efetividade, a eficácia e a eficiência, como proclama o catecismo da concepção gerencial da administração pública?

O pior é que essa modalidade espúria de "gerencialismo" se casa com uma imagem de "falimismo" que parece transformar a gestão pública em propriedade particular da família Arraes em Pernambuco.


Ora é o irmão que usa como lhe convém os recursos destinados à cultura, ora é a mãe, nomeada ministra do Tribunal de Contas da União, ora é a prima-noiva do neto do escritor Ariano Suassuna- que tem de ser publicamente defendida, enfim, é um misto de duas tendências ruins: uma modalidade subdesenvolvida de gerencialismo - entendida como mera transferência de políticas públicas para o setor privado - e o velho familismo que se arrasta desde os tempos coloniais através de Casas Grandes, que se reproduzem ao longo da história.

O que o ministério público tem a dizer sobre isso?
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