Correio da Cidadania

O direito de nascer

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Operações policiais no Rio de Janeiro deixam, em média, mais de um morto por dia nas favelas do Rio de Janeiro
Foto: Ilustração da militarização das favelas cariocas, não guarda relação direta com o conteúdo do artigo. Créditos: AFP

Uma mulher grávida morreu baleada em ação da PM no Rio de Janeiro. O bebê não teve o direito de nascer, de sair do ventre materno para o mundo. A violência é tamanha que quem nem sequer nasceu, corre risco. Parece que vai ser preciso acrescentar aos belos direitos já descritos na bela teoria, o direito de nascer. Mais ou menos assim, ó: “Todo ser humano tem o direito de sair da barriga, de vir ao mundo” – embora não tenha pedido para existir. E o direito à vida, quando será plenamente efetivado? No caso, duas vidas perdidas, interrompidas.

Há o perigo do coronavírus, há o perigo da miséria, da fome, da marginalidade social, isso para nós que nascemos e crescemos e há agora o perigo para os fetos que repousam tranquilos nos ventres maternos. Nesse país violento, nem resguardado por sua mãe um bebê está seguro. Cabe a pergunta: onde estão os ‘pró-vida’ que se dizem defensores dela? E outra: onde estão os que protestaram contra o aborto fruto de um estupro? Há uma seletividade, uma classificação de tipos de vidas?

Uma vida foi ceifada antes mesmo de vir à luz. Há na língua de Camões algum adjetivo capaz de expressar isso? É preciso que o povo se indigne, volte a se indignar, seja capaz de indignação perante tal fato. A velocidade das notícias e dos absurdos a que assistimos diuturnamente não pode fazer com que esqueçamos tão rápido o que não deveria ser facilmente esquecido. Não pode ser instituído o reinado da indiferença, por mais absurdidades que aconteçam, por mais que o povo esteja treinado a estarrecimentos.

Pior é saber que Kathlen de Oliveira não foi a única e bom seria saber que casos assim não aconteceriam com outras mulheres vulneráveis por tantos motivos. De acordo com o Instituto Fogo Cruzado, entre 2017 e 2021, 15 grávidas foram vítimas de balas, 8 dessas morreram e 7 ficaram feridas.

Em meio à assombrosa violência que graceja em todo lugar e a qualquer horário, há o empenho para a liberação de armas para a população. Sim, ao invés de ofertar instrumentos de vida, o que se oferta são instrumentos causadores de morte.

São muitas as mortes: mortes por coronavírus, mortes pela violência, mortes aos poucos pelo pauperismo que assola milhões e milhões.

Ah, a Copa América está aí. O circo foi garantido, já o pão...


Felipe Feijão é graduado em filosofia e escritor.

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