Correio da Cidadania

Com os Coletes Amarelos: contra a representação, pela democracia (1)

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Raramente na História um presidente da República [da França] foi tão odiado como hoje é Emmanuel Macron. Seu discurso televisionado no dia 10 de dezembro, realizado a seu pedido com pompa e circunstância, e as migalhas que ele, nesta ocasião, distribuiu com “compaixão” aos pobres — sem reavaliar de forma alguma as medidas mais injustas incentivadas ou decididas por ele mesmo, primeiro como conselheiro de [François] Hollande, depois como ministro da economia e, por fim, como presidente — em nada mudarão este fato.

A explicação dessa rejeição maciça é bem conhecida: o desprezo de classe que ele demonstrou, tanto em suas ações quanto em suas palavras, volta-se violentamente contra ele mesmo, com toda a força de uma população em cólera, e não há nada tão merecido. Com a insurreição social dos Gilets Jaunes[i] o véu é retirado pelo menos por um momento. O “novo mundo” é o antigo piorado: desde novembro passado essa é a principal mensagem enviada pelas pessoas vestidas com seus coletes amarelos.

Em 2017, Macron e a sua empresa “En Marche”[ii] aproveitaram o profundo desprezo das classes popular e média contra os governantes — que até então não se cansavam de piorar as condições de trabalho e a vida cotidiana delas — para ganhar, contra todas as expectativas, a corrida presidencial. Nessa conquista do topo das instituições, Macron não hesitou em usar cinicamente o registro populista do “demissionismo”[iii] e da tábua rasa para prevalecer, ele que nunca foi nada além de um “candidato da oligarquia”, e em particular da sua corporação de elite, a Inspetoria de Finanças[1][iv].

A manobra foi grosseira, mas funcionou por inércia. Macron venceu, com ideias minoritárias, devido a um duplo voto de rejeição: no primeiro turno contra os partidos neoliberais-autoritários (os gêmeos do Partido Socialista e dos Republicanos[v]) e no segundo turno contra a candidata do partido neofascista francês. Com a renovação, desde a primavera de 2017, os eleitores tiveram direito a um agravamento e a uma aceleração sem precedentes de tudo aquilo que haviam rejeitado anteriormente.

Espantados, foram atingidos por uma onda de medidas que, uma após a outra, enfraqueceram o poder de compra e o poder de ação das classes popular e média. E isso em favor das classes mais privilegiadas e das grandes empresas. Pesquisas recentes sobre este ponto não se enganam: nas condenações às políticas macronianas, o recorte de classe aparece à plena luz do dia.

A restauração do ISF [impôt de solidarité sur la fortune — Imposto francês sobre as grandes fortunas], o aumento do SMIC [salaire minimum interprofessionnel de croissance — salário mínimo francês] e o restabelecimento da indexação das aposentadorias à inflação são solicitações encontradas entre as principais reivindicações dos Gilets Jaunes, que vão muito além da supressão do aumento do imposto sobre o combustível e a moratória sobre o custo da eletricidade e do gás, e dizem muito sobre o significado social do movimento. Somente a propaganda desavergonhada do governo sobre as Ligas de 1934[vi], o “sedicioso” e o “faccioso”, complacentemente retransmitida pela mídia subserviente e por algumas “personalidades midiáticas” ou por alguns líderes sindicais desonestos, fez alguns acreditarem que o movimento era intrinsecamente fascista.

Deve ser dito e repetido aqui com força: se a extrema-direita tentou assimilar essa cólera popular, e se às vezes foi bem-sucedida, foi apenas devido à falência da esquerda política e dos sindicatos em sua função de defesa social dos interesses da maioria. Os Gilets Jaunes, queiramos ou não, alcançaram o que trinta anos de lutas sociais não conseguiram fazer: colocar no centro do debate a questão da justiça social. Melhor, eles impuseram, e não poderia ser de forma mais clara, a questão fundamental para toda a humanidade: o vínculo entre justiça social e justiça ecológica.

Uma revolta antineoliberal

Apenas podemos compreender essa revolta social colocando-a em relação com o tipo de transformação que o poder atual pretende reforçar através do ajuste fiscal e da brutalidade dos regulamentos. A “revolução” macroniana não é nada além da implementação, de uma forma radical e precipitada, de uma concepção dominante da sociedade baseada na competição, no desempenho, na rentabilidade e no “escoamento” da riqueza de cima para baixo.

Prolongando uma política constante de isenções fiscais do capital e das empresas, Macron continuou e ampliou a transferência dos encargos fiscal e social para as famílias, especialmente as mais modestas, aumentando, em nome da “competitividade”, os impostos mais desiguais que recaem sobre o consumo.

Em outras palavras, é escolhendo o caminho mais puramente neoliberal que ele tem procurado transformar a França, desejando assim, para esta “revolução” que lhe serviu de programa, se fazer de bom aluno para o patronato, para os comissários europeus e para os “investidores internacionais”, tudo ao mesmo tempo. Macron não foi o primeiro e sem dúvida não será o último, mas ele queria se destacar, sendo melhor do que Sarkozy e Hollande juntos.

Sem dúvida, Macron provavelmente não tem as costas largas o suficiente e nem todos os requisitos necessários para transformar os “gauleses refratários”, os “iletrados” e os “zés ninguéns” em adeptos da “nação startup” e apoiadores da queda do custo do trabalho. Gerir o Estado e administrar o governo como um grande patrão faria em uma multinacional — de acordo com as novas normas de uma alta gestão pública convertida aos ideais capitalistas — não era suficiente.

A centralização e a verticalidade da Quinta República, a repressão policial em todas as direções, a arregimentação, até a aniquilação, de uma maioria parlamentar composta por neófitos insossos e oportunistas reconhecidos, esses têm sido até hoje os meios institucionalmente poderosos, mas ainda assim insuficientes para fazer com que as pessoas aceitem a degradação de suas condições de vida e a redução de seus meios de ação, tanto no nível local quanto no nível dos locais de trabalho.

A vida real prevaleceu sobre as ilusões de uma oligarquia cega pela sua “verdade” e que tinha acreditado que sua hora tinha chegado pela eleição milagrosa de um presidente infantilmente embebido da onipotência política que as instituições fundamentalmente antidemocráticas lhe deram. A insurreição social dos Gilets Jaunes, interrompendo a máquina neoliberal de Macron, mostrou os limites disso que se deve chamar de bonapartismo gerencial.

Uma última manobra?

Essa prática autoritária do governo fez com que o neoliberalismo chegasse a um ponto de ruptura. Sem dúvida, os atuais governantes, apoiados pelo patronato, estão tentando uma última manobra cuja natureza já podemos adivinhar, e que consiste em utilizar a crise social e política para reforçar a neoliberalização da sociedade de maneira mais sutil do que a “blitzkrieg” [guerra-relâmpago] da primeira temporada de Macron. Nós já conhecemos os principais argumentos. O primeiro, com o apoio sem nenhum escrúpulo deontológico de todos os canais de televisão e rádio, é o habitual chamado à ordem diante da “violência” atribuída unilateralmente aos manifestantes, naturalmente cúmplices dos jovens delinquentes que se entregam ao saque ao final das manifestações.

Assustar e ao mesmo tempo solicitar a ajuda de todas as forças “responsáveis” não é apenas exonerar o governo de suas próprias responsabilidades, mas também esconder todas as violações das liberdades mais fundamentais como a de se manifestar (duas mil prisões arbitrárias), e justificar os métodos violentos usados pela força policial contra os manifestantes (especialmente o uso perigoso de flash balls e de granadas ditas de dispersão).

A partir deste ponto de vista, a humilhação coletiva imposta aos estudantes secundaristas de Mantes-la-Jolie recorda os piores métodos de colonialismo, na continuidade do “tratamento” da revolta de 2005, e faz as palavras de Ségolène Royal particularmente revoltantes. Já o segundo argumento consiste em colar nos manifestantes tudo o que, em suas reivindicações díspares, vai no sentido de uma redução do gasto público. Essa é a tática já escolhida por Geoffroy Roux de Bezieux, porta-voz da MEDEF [Mouvement des entreprises de France, maior federação patronal francesa] sem hesitar em se vangloriar da eficácia dos cortes de impostos de Trump!

Fazer dessa grande mobilização social um movimento neopoujadista[vii] de pequenas empresas esmagadas por impostos e encargos sociais, impulsionado pela “sobrecarga” fiscal, mais do que pela injustiça social, tem a vantagem de fazer acreditar que o único meio de aumentar o poder de compra consiste em reduzir a parte socializada da renda e em diminuir a oferta de serviços públicos após uma redução nos impostos (porque não está em questão, no atual contexto, reduzir as despesas militares e policiais).

A menos que, de uma maneira mais sarkoziana, e este parece ser o caminho escolhido por Macron, isto sirva para incentivar as horas extras livres de impostos, um sonho da MEDEF. Evita-se, evidentemente, tocar nos privilégios fiscais dos mais ricos, na liberdade concedida à evasão de riqueza, nos escândalos do CICE e do CIR, dispositivos que, sem contrapartida, controle ou constrangimento, consistem em transferir dezenas de bilhões para empresas que não precisam. Essa manobra exigirá a nomeação de bodes expiatórios, evidentemente.

Por que não mirar, não os “ricos”, como provavelmente a maioria dos Gilets Jaunes gostaria, mas os servidores públicos da base, mais numerosos, mais bem pagos, mas não produtivos o suficiente? Por que não lhes pedir alguns sacrifícios extras em nome da solidariedade com os mais pobres? Sabemos que entre “os corpos intermediários” sindicais há alguns que já têm a caneta na mão para ratificar os retrocessos sociais mais flagrantes. Não se trata, menos ainda, e isto não é o mais escandaloso do discurso presidencial, de colocar no centro do debate a “questão da imigração”, mesmo do Islã, embora este não seja, de todo o coração, o discurso dos Gilets Jaunes.

 Estudantes secundaristas de Mantes-la-Jolie

As duas vias

No entanto, nada aconteceu após a intervenção televisionada de Macron do dia 10 de dezembro. Nada diz que a raiva voltará rapidamente para a cama. Seria bastante surpreendente se o poder fosse abalado. Dois outros caminhos logo se abrirão à sociedade francesa à medida que também se abram para todas as sociedades do mundo. A via nacionalista, protecionista, hiperautoritária, antiecológica, de Trump, Bannon, Salvini, Le Pen, Bolsonaro, Orban ou Erdogan, que prosperam por todo o mundo explorando as frustrações e ressentimentos gerados pelo neoliberalismo. Longe de ser uma alternativa, esse caminho é uma nova versão histórica, radicalmente antidemocrática, em um momento em que as consequências sociais, políticas e ambientais pautam a questão da mudança substantiva do sistema econômico e político.

Esse caminho serve para nos fazer acreditar que a restauração de um Estado-nação governado com mão de ferro, dotado de todos os seus atributos de soberania interna e externa, capaz de fechar as suas fronteiras aos imigrantes, de impor sobre a população as leis mais duras das finanças e do mercado e de recusar todos os acordos internacionais sobre o clima, é a única maneira de melhorar a situação social da grande maioria da população. Trump é hoje o campeão versátil desta linha e ele é muito auxiliado, neste papel, por Macron.

O caminho democrático, ecológico e igualitário, que se afirmou há décadas em todas as lutas sociais e de resistência ao neoliberalismo, no movimento de justiça global [altermundismo], no movimento das praças, em muitos laboratórios do comum, é o único capaz de evitar o colapso dos ecossistemas e a desintegração e fragmentação das sociedades. Sua única falha é que ainda não tem uma expressão majoritária e uma nova forma política. É que este caminho, de início, sofre a traição da esquerda governamental, especialmente a “socialdemocrata”, e é hoje tragicamente enfraquecido por dirigentes de organizações mais preocupados com seus próprios interesses de boutique do que com sua responsabilidade histórica.

A questão mais atual é, portanto, saber se o levante dos Gilets Jaunes permitirá ou não a linha democrática, ecológica e igualitária superar a linha identitária, nacionalista e de conotações fascistas que ganhou na Itália e agora no Brasil.

A recusa da representação política e a auto-organização do movimento

Tem sido observado frequentemente que o movimento reúne indivíduos de diferentes classes, de diferentes idades, de diferentes opiniões. Alguns desvios de tipo racista, misógino ou francamente fascista ocorreram, e ainda podem acontecer aqui e ali, ou até mesmo se desenvolver. Saques e quebras de lojas por gangues de jovens ocorreram em alguns bairros da capital e nos centros de outras cidades, que serviram de álibi para desacreditar o movimento social. Esta ainda não é a lógica profunda do movimento, que é diverso, plural e muitas vezes animado na base pelas mulheres.

Se um iluminado isolado convocou um general ao poder, ele não é, de modo algum, o representante legítimo de um movimento que recusa precisamente qualquer usurpação da representação. A lógica atual e profunda do movimento não é a de contar com um líder encarnando o povo, desagradando teóricos do populismo para os quais é o representante que faz o povo e lhe dá unidade.

Não se trata mais de renovar a “representação nacional” após a dissolução, desagradando aos líderes da France insoumise ou do Rassemblement national[viii] que buscam canalizar o movimento para o campo parlamentar. Todos sabem, ou deveriam saber, que neste jogo é o partido neofascista que ganhará o prêmio. Sem prejulgar os resultados do movimento dos Gilets Jaunes, a primeira lição que podemos identificar é a capacidade instituinte que eles têm mostrado, recusando antecipadamente qualquer assimilação e somente confiando em sua própria força coletiva para se fazer ouvir e para formular suas reivindicações sem o cálculo tático do aparelho, a partir das únicas condições insuportáveis vividas por indivíduos reais e até então invisíveis.

O que foi largamente apresentado pelas antenas e pelos estúdios de TV como a principal fraqueza do movimento, sua “incapacidade” de se fazer representar, ainda é a sua característica mais marcante, de que se deve compreender o escopo: não é somente uma “incapacidade” da qual se deve falar, é uma recusa, em princípio, de qualquer representação. E essa recusa é plenamente justificada. Há aí uma consequência de uma profunda crise de legitimidade dos governos, dos políticos eleitos, da mídia e até mesmo dos sindicatos, crise provocada e exacerbada pela radicalização neoliberal das oligarquias – quanto a isso há poucas dúvidas. Mas há outro aspecto, que raramente é comentado e que, no entanto, é a contrapartida positiva dessa recusa de qualquer representação.

É que diante desse recesso de uma democracia representativa que não mais representa a sociedade, a resposta mais espontânea dos Gilets Jaunes tem sido a auto-organização das ações, das barreiras, dos bloqueios e das manifestações, até a elaboração conjunta, durante as reuniões e as assembleias, de reivindicações coletivas. Esta é uma formidável lição para os partidos e organizações sindicais, cuja resposta tradicional é supervisionar as massas e jogar de cima para baixo as demandas, as consignas e as palavras de ordem. Sem dúvida não é mais o Nuit Debout[ix], mas o ponto comum com as ocupações das praças é o desejo de tomar as questões coletivas em suas próprias mãos. O apelo dos Gilets Jaunes da Commercy é exemplar do espírito de democracia direta que anima os comitês de base. Vale a pena citar grandes trechos:

Aqui em Commercy, em Meuse, funcionamos desde o início com assembleias populares diárias, onde cada pessoa participa igualmente. Organizamos bloqueios da cidade, estações de serviço e barreiras com filtros. Durante o processo construímos uma cabana na praça central. Nós nos encontramos lá todos os dias para nos organizar, decidir sobre as próximas ações, dialogar com as pessoas e dar as boas-vindas àqueles que se juntam ao movimento.

Também organizamos “sopas solidárias” para viver belos momentos juntos e nos conhecermos. Em plena igualdade. Mas agora o governo e algumas partes do movimento propõem nomear representantes por região! Ou seja, algumas pessoas se tornariam os únicos “interlocutores” das autoridades públicas e resumiriam nossa diversidade. Mas nós não queremos “representantes” que acabem falando por nós! (…) Não é para entender melhor nossa raiva e nossas demandas que o governo quer “representantes”: é para nos enquadrar e nos enterrar! Tal como acontece com a liderança do sindicato, ele procura intermediários, pessoas com quem poderia negociar. Quem ele poderá pressionar para aplacar a erupção. Pessoas que ele poderá em seguida cooptar e colocar para dividir o movimento e enterrá-lo. Mas fazem isso sem contar com a força e inteligência do nosso movimento.

Sem contar que estamos pensando, nos organizando, melhorando nossas ações e deixando-os assustados, enquanto amplificamos o movimento! E acima de tudo, não costumam mencionar que há uma coisa muito importante, que em toda parte o movimento dos Gilets Jaunes reivindica de várias formas, muito além do poder de compra! Esta coisa é o poder do povo, pelo povo, para o povo. É um novo sistema onde “aqueles que não são nada”, como dizem com desprezo, recuperam o poder sobre todos os que se empanturram, sobre os governantes e sobre os poderes do dinheiro. É a igualdade. É a justiça. É a liberdade. Veja, é o que nós queremos! E começa da base!

Se nomearmos “representantes” e “porta-vozes” isso acabará por nos deixar passivos. Pior: vamos reproduzir rapidamente o sistema e funcionar de cima para baixo assim como os crápulas que nos dirigem. Estes autoproclamados “representantes do povo”, que estão enchendo seus bolsos, que fazem leis que apodrecem a vida e que servem aos interesses dos ultrarricos! Não coloque o dedo na engrenagem de representação e da assimilação. Este não é o momento de confiar nossa palavra a um pequeno punhado, mesmo que eles pareçam honestos. Que eles nos escutem a todos ou que não escutem a ninguém!

Desde Commercy, portanto, pedimos a criação em toda a França de comitês populares, que funcionam em assembleias gerais regulares. Nos lugares onde o discurso é livre, onde nos atrevemos a nos expressar, nos exercitar, nos ajudar. Se deve haver delegados, é ao nível de cada comitê popular local dos Gilets Jaunes, o mais próximo da palavra do povo. Com mandatos imperativos, revogáveis e rotativos. Com transparência. Com confiança.

Qualquer um que tenha visto os autores deste apelo se revezando na frente do microfone para evitar qualquer captação das falas por um “representante” compreende instantaneamente a profundidade da demanda democrática que anima esse movimento. Mais uma vez, é muito mais que desconfiança, é uma rejeição da substituição pela qual uma minoria se arroga o direito de falar e de agir no lugar da maioria. Devemos saudar a grande clarividência dessa declaração: a partir do dia 6 de dezembro, os “representantes” sindicais, com a notável exceção da [União Sindical] Solidaires, se apressaram para vir em auxílio de um Macron totalmente isolado e tonto, o que não deixou de provocar uma reação de revolta dentro da própria CGT [Confédération Générale du Travail, uma das maiores confederações sindicais da França].

Os famosos “corpos intermediários” estão totalmente alinhados com a lógica da representação e é por isso que eles só podem ajudar Macron com vistas a recuperar o controle, longe de serem capazes de encarnar um resultado positivo da crise do regime. É claro que nada garante que as possibilidades abertas por essa democracia em ação se realizarão. A única coisa que importa neste momento é que vale a pena lutar por essa conquista. Deixemos para os neoblanquistas da “insurreição vindoura” e os outros celebrantes da “violência pura” seus desprezos pela invenção democrática.

Os desordeiros que se enxertam nas manifestações e que não participam das decisões coletivas contribuem igualmente para despossuir o movimento de sua democracia interna. A questão é saber se o espírito profundamente democrático do movimento será profundo o suficiente para se perpetuar e imunizar a sociedade das tentações fascistas que poderiam se desenvolver em caso de seu fracasso e decadência. E essa questão por si só obviamente engaja a nossa responsabilidade, toda nossa responsabilidade.

Pierre Dardot é filósofo e pesquisador no laboratório Sophiapol da Universidade Paris-Ouest Nanterre-La Défense, especialista no pensamento de Marx e Hegel.

Christian Laval é um pesquisador francês da história da filosofia e da sociologia na Universidade Paris Nanterre.

Seus trabalhos centram-se em três grandes temas: a história do utilitarismo, a história da sociologia clássica e a evolução dos sistemas de ensino.

Este artigo foi traduzido pelo Passa Palavra a partir do original disponível aqui.

A parte 2 será publicada em 4 de janeiro

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