Meia sola não resolve
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- Wladimir Pomar
- 23/04/2015
No dia 8 deste mês, o professor Alfredo Bosi publicou um artigo no qual deplorou “a corrupção que envolveu alguns membros” do PT, afirmou que “as mazelas do partido constrangem e entristecem ainda mais profundamente os seus antigos filiados ou simpatizantes que o viram nascer e crescer, em um contexto de luta democrática e esperança política”, e apelou à reflexão sobre a história desse partido.
Segundo ele, “uma história, o que está longe de ocorrer com a maioria das agremiações partidárias que hoje fragmentam o cenário político brasileiro... uma história que honra os seus fundadores e desonra os que traíram os seus valores”. Uma história feita principalmente por “homens e mulheres pertencentes às comunidades de base da periferia... reunidos em nome de um ideal que parecia ter soçobrado em 20 anos de ditadura: o ideal de uma democracia política em busca de uma democracia econômica”.
Apesar dessa história, Bosi se pergunta se a “chegada ao poder terá desmentido os ideais daquele tempo” e, “responde com objetividade: sim e não. Sim, porque há uma relação intrínseca entre poder e abuso do poder, poder e corrupção, realidade que não é absolutamente só brasileira...”. Não havendo no Brasil “formas de democracia participativa, precisamente um dos valores pregados pelos militantes do PT”, Bosi acredita que tal ausência seria “causa direta dos desvios que tanto abalaram a confiança no partido”, levando os eleitos a se distanciarem dos eleitores e se enlearem “na teia da burocracia partidária”.
Assim, apesar do “ethos distributivista dos governos Lula e Dilma”, que retirou “da pobreza extrema 36 milhões de brasileiros”, “o PT é o bode expiatório fácil de todas as situações difíceis por que passa a economia brasileira em um contexto internacional adverso”. Sua responsabilidade estaria sendo “hipertrofiada”, mas ela “tem de ser apurada e cobrada pela nação”. Bosi acredita que isso “será um justo purgatório, próprio do sim e do não, mas não a punição infernal com que desejam castigá-lo os seus adversários, maus perdedores no jogo democrático”.
As palavras do professor Bosi expressam os sentimentos e, também, a perplexidade de milhares, ou dezenas, ou centenas de milhares de militantes e simpatizantes do PT. Eles não esquecem a história e os feitos do PT. Mas não perdoam que os “eleitos” tenham se distanciado das mulheres e dos homens das bases partidárias, tenham abandonado a prática da democracia participativa no partido, e que vários deles tenham se deixado enredar pelas malhas da burocracia e da corrupção.
Além disso, embora esses militantes e simpatizantes acreditem que as “responsabilidades” de membros e dirigentes do PT nos escândalos de corrupção estejam sendo “hipertrofiadas”, elas precisam ser apuradas e cobradas, não só pelo partido, mas também pela “nação”. Portanto, o que esperam do diretório nacional do partido, assim como de seu próximo congresso, são medidas que recuperem o histórico de participação democrática e de lutas, e corrijam os desvios que fizeram com que o PT se tornasse um “bode expiatório fácil”.
Nesse sentido, a decisão da última reunião do diretório nacional do PT, proibindo os diretórios partidários de receberem contribuições financeiras de empresas, mas liberando seus candidatos a continuarem a praticar esse procedimento que não faz distinção entre dinheiro limpo e dinheiro sujo, criou uma situação esdrúxula. Deu a filiados candidatos a cargos eletivos, com maiores ligações e acessos a empresários privados, uma vantagem excepcional sobre os demais. Portanto, não passou de uma meia sola rombuda, ou uma emenda pior do que o soneto, que vai agravar ainda mais os problemas internos do PT.
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Wladimir Pomar é escritor e analista político.