Correio da Cidadania

Setor elétrico, mais um debate interditado

0
0
0
s2sdefault

Resultado de imagem para eletrobras
O texto serve apenas para explicitar a dificuldade do nosso Instituto Ilumina divulgar informações que contestem políticas fortemente defendidas pela grande mídia. Como algumas pessoas podem ter percebido, a maioria dos jornais critica muito o presidente Bolsonaro, mas apoia integralmente as ideias do Ministro Paulo Guedes.

O que se segue é apenas um curioso relato do que ocorre quando se tenta argumentar com fatos. 

No dia 24/09 O Globo publicou o seguinte editorial:

Privatização da Eletrobras não pode ser abandonada pelo Congresso

 Nunca foi fácil privatizar estatal. Para isso, é preciso enfrentar visões ideológicas que confundem empresa pública com “empresa do povo”, e resistências no Congresso, onde há́ grupos que, de forma fisiológica, se valem de estatais para nomear apaniguados e até́ fazer negócios. 

As dificuldades aumentaram com a decisão do Supremo de que a venda do controle de empresas-mãe, aquelas que têm subsidiárias, só́ pode ser feita com aprovação do Legislativo. É o caso da Eletrobrás, cujo projeto da necessária privatização vem do governo Michel Temer, que não teve forca política para executá-la, depois do caso da gravação de uma conversa nada republicana sua com o empresário Joesley Batista, nos porões do Jaburu.

 No evento “E agora Brasil?” em Brasília, promovido pelo GLOBO e pelo “Valor Econômico”, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, aconselhou o governo a não incluir a Eletrobrás logo na fase inicial do seu programa de privatizações, devido à rejeição do negócio pela maioria da bancada de 48 senadores do Norte e Nordeste. Se a ideia é ganhar tempo para mais conversa, a fim de convencer os recalcitrantes, vale seguir a ponderação. 

Pode até ser que o poder de convencimento que converteu votos para a outrora demonizada reforma da Previdência volte a funcionar. 

Também há argumentos fortes em favor da venda do controle da empresa, a ser feita via lançamento de ações no mercado, para reduzir a participação do Estado no capital da companhia de 60% para menos de 50%. No modelo do que foi feito na privatização do controle da BR Distribuidora.

 A Eletrobras voltou a dar lucro depois dos ajustes feitos. Por exemplo, a venda de seis distribuidoras deficitárias, no Norte e Nordeste, operação em que também houve resistência política. A atração de grupos privados é vital para o cumprimento dos programas de investimento necessários para sustentar o crescimento da economia que vem por aí. O Brasil não ficará para sempre estagnado, caso as reformas de fato prossigam. 

Tanto quanto isso, as privatizações precisam ser feitas para abater a elevada dívida pública próxima dos R$ 4 trilhões, e em elevação. Ela chegará em breve a 80% do PIB, enquanto em países comparáveis ao Brasil este índice é em média de 50%. Além disso, os recursos são necessários para evitar o rompimento do teto dos gastos. 

Diante de tantas afirmações sobre contestáveis visões ideológicas, sem nenhuma expectativa, enviei uma simples carta de leitores.

Não há problema que um jornal tenha opiniões e as expresse em editoriais. O dilema se dá quando essa opinião se esvai para o noticiário e argumentos contrários à privatização da Eletrobras são sempre omitidos. Seguindo a comparações internacionais feitas no editorial de 24/09, é preciso dizer que, entre os países com matriz elétrica semelhantes ao Brasil, nenhum deles privatizou todo o seu parque hidroelétrico. Outra omissão sempre cometida é a de nunca revelar que a Eletrobras só se fragilizou porque foi usada para “remendar” erros do modelo privado mercantil existente desde 1995 e que, até agora, só entregou tarifas altas e lucros para advogados dada a grande judicialização do mercado. 

Roberto Pereira D’Araujo, Diretor do Instituto ILUMINA

Por incrível que pareça, recebi a seguinte mensagem do Globo no mesmo dia 24/09.

Prezado Roberto, tudo bom?

O senhor pode escrever um texto com 3.800 caracteres e encaminhá-lo, por favor, a Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo., que é o editor de “Opinião do Globo?

Obrigado.

Cordialmente, sds.

Fiquei agradecido e impressionado com a sugestão. Enviei o seguinte artigo no mesmo dia. Claro que nenhuma garantia de publicação estava sendo dada.

Desinformação, a verdadeira inimiga. 

Roberto Pereira D’Araujo (*) 

É triste e lamentável a quantidade de mitos presentes na mídia e nas redes sociais sobre a privatização brasileira, sempre louvada como solução. Será que o cidadão se lembra que, de 1990 até 2006, o país vendeu quase 80 estatais na área de Siderurgia, Petroquímica, Fertilizantes, Elétrico, Transportes, Mineração, Portos, Bancos, Gás, Aviação e todo o sistema de Telecomunicações?

É certo que muitas empresas deveriam ser privatizadas, mas, por que o estado teve que investir em tantos setores? Qual foi a performance da economia do país após essa liquidação? O Estado resolveu seu déficit fiscal? Ao vender tantas empresas prontas e faturando, o investimento privado reagiu? 

As respostas são frustrantes. A dívida pública, que em 1994 era 37% do PIB, saltou para 76% em 2002. Segundo dados do BNDES, o saldo das empresas vendidas atingiu US$ 106 bilhões, valor, que comparado às atuais desonerações e subsídios concedidos equivalem a apenas dois anos. Além disso, de 1990 até 2018, o crescimento médio do PIB não passou de 2,2% ao ano. Apesar da pífia performance, que nos avisa que algo está errado, o Brasil está prestes a repetir os mesmos deslizes.

Dentre as novas liquidações, chama a atenção o caso da Eletrobras. Ela escapou da primeira leva porque, ao se anunciar a venda de ativos existentes, abandonou-se o investimento em novas usinas e linhas e o resultado foi um racionamento de 25% do consumo em 2001, um recorde mundial.

Essa sobrevivência custou caro à empresa, pois os defeitos do processo privatista mercantil brasileiro continuaram a desmoronar sobre ela. Distribuidoras de estados menos desenvolvidos não interessaram ao setor privado e a Eletrobrás foi obrigada a se endividar para adquirir as empresas do Acre, Rondônia, Roraima, Amapá, Alagoas e Piauí.

Não bastasse esse “jeitinho” para resolver o problema da privatização defeituosa, a Eletrobrás foi obrigada a perder seus contratos em 2003, apesar de mais baratos. Como o consumo havia se reduzido 15%, continuou gerando sua energia hidroelétrica! Essa energia foi liquidada no mercado livre por menos de R$ 20/MWh por 3 anos seguidos. Proibida de tentar reduzir o prejuízo, pode-se afirmar que ela subsidiou de forma oclusa o bizarro mercado livre brasileiro, onde usinas não são remuneradas exatamente pela energia que geram. Alguma vez se viu esse detalhe exposto na imprensa?

Com os subsídios oclusos e explícitos, o mercado livre passou a ser uma via especulativa do curto prazo. Mesmo atingindo 30% da carga total, não participou da expansão do sistema. Mais uma vez, a Eletrobras foi usada para incentivar o setor privado oferecendo parcerias onde ela é minoritária e assume grande parte dos custos administrativos. Um total de 178 sociedades mostra que, mais uma vez, o capital privado decepciona e exige, além do BNDES, parcerias de uma estatal. 

O ato final de fragilização veio com a MP 579, uma tentativa absurda e frustrada de reduzir tarifas às custas apenas das usinas da estatal, sem qualquer diagnóstico sobre as razões desse indisfarçável aumento. Mais uma vez, do outro lado, o setor privado agradeceu. A mídia e o atual governo preferem acusar a Eletrobras de ineficiência, mas, falhas de modelo e a baixa pujança privada sempre estiveram por trás da fragilização da empresa.

Já que Bolsonaro é admirador do presidente Trump, poderia perguntar porque ele não privatiza as usinas americanas, já que a hidroeletricidade representa apenas 8% do consumo. Ampliando a curiosidade, poderia se conscientizar de que nenhum país com hidroeletricidade na sua matriz vende suas usinas.

A situação se agrava quando nem o presidente da nação parece estar informado sobre o que realmente aconteceu. Vamos aguardar as consequências.

Depois de perguntar se seria publicado, recebi apenas no dia 02/10 a seguinte mensagem do editor de opinião do Globo.

Roberto,

vamos publicar seu artigo no on-line.

tks

abs

Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.,

Traduzindo, o artigo não seria publicado no jornal impresso, mas sim na versão online. Tudo bem! Imagine, receber um “convite” para o artigo a partir de uma carta de leitores que contesta a posição editorial do Globo e vê-lo lido por assinantes do jornal! 

Só que não! Até agora nem o artigo foi publicado e nem a carta! 

Certamente não será publicado e o Ilumina já está acostumado com essa “pequena” dificuldade que, infelizmente, impede um debate amplo e honesto. 

É o muro! 

Roberto D’Araujo é engenheiro e ex-assessor da Eletrobrás. Também é diretor do Instituto Ilumina. 

0
0
0
s2sdefault