Correio da Cidadania

Mais transparência (e mais cultura de segurança) na questão nuclear

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A usina nuclear Angra 3 foi licenciada em 2010 sem prever acidentes “severos” e desconsiderando pareceres de engenheiros da CNEN e exigências do MPF. Publicamos no dia 5 de março, na Folha de S. Paulo, um artigo sobre os riscos assim criados. Uma réplica do Presidente da Eletronuclear no dia 17 diz que o projeto foi atualizado, mas não apresenta provas. A questão é muito grave, no entanto, a Folha não publica tréplicas. A quem quiser se informar melhor só resta ler um texto explicativo em www.brasilcontrausinanuclear.com.br (nota de Chico Whitaker encaminhada em 27 de Março de 2019 ao Painel do Leitor da Folha de São Paulo).   

O artigo publicado no dia 5 de março (Chico Whitaker: “Brumadinho, Flamengo, Angra: e o bom senso?”), pondo em dúvida a atualização do projeto obsoleto da usina nuclear Angra 3, mereceu uma resposta de Leonam Guimarães, presidente da Eletronuclear. Isto é significativo. Porém, mais ainda é a ausência da informação necessária, apesar de o interlocutor dizer que a questão já foi amplamente esclarecida.

Na verdade o presidente da Eletronuclear se ateve a afirmações discutíveis sobre a relação entre energia nuclear e ameaças climáticas, ou sobre a cultura de segurança na CNEN e na Eletronuclear – ao que parece tão pouco exigente como a das mineradoras em suas barragens.

Sua réplica foi pobre, depois que foi divulgado mundialmente que a Licença de Construção concedida em 2010 pela Comissão Nacional de Energia Nuclear foi possível graças ao engavetamento de parecer de seus próprios engenheiros de segurança. Como lembrado no artigo contestado, era necessário, segundo esse parecer, passar o projeto pelo crivo das normas editadas pela Agência Internacional de Energia Atômica, preparadas depois dos acidentes de Three Miles Island em 1979 e de Chernobyl em 1986, o que não foi feito pela Eletronuclear.

Esses acidentes, chamados “severos”, em que o reator derrete e a usina explode, eram considerados impossíveis até 1979. São raros, mas se tem que fazer de tudo para evitá-los, porque provocam catástrofes sociais e ambientais que duram centenas ou milhares de anos. Mas isto parece não comover nossos responsáveis do setor nuclear.

Face à identificação do engavetamento do parecer na CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear), o Ministério Público abriu uma investigação e concluiu que o projeto precisava ser revisto. Mas como engavetar as 400 páginas dessa investigação? A Eletronuclear preferiu menosprezar a inteligência dos Procuradores, assim como o tinha feito com a CNEN.

Prometeu a apresentação de uma análise de segurança de forma a incluir os acidentes severos depois de completada a construção de Angra 3. Mas se isto for realizado corretamente, será necessário derrubar partes substanciais da usina e praticamente reiniciar a obra.

Por exemplo, para dar mais solidez ao sistema de contenção para se evitar a liberação de radioatividade em caso de explosão de hidrogênio e para criar um modo de recolher e resfriar o núcleo fundido do reator, a fim de evitar comprometimento do piso do edifício e contaminação do solo – recursos já previstos nos atuais modelos de usina da empresa responsável pelo projeto de Angra 3. O que certamente exigiria uma nova licitação, decorrente de mudança substancial do objeto do contrato assinado.

Em 2011 ocorreu um terceiro acidente “severo”, em Fukushima, no Japão. O muro para conter eventuais tsunamis fora construído com 4 metros de altura. Mas os pareceres técnicos previam ondas de 15 metros. O tsunami aconteceu, as usinas perderam totalmente a energia elétrica, o reator fundiu, não havia recursos pra conter o material fundido que atingiu o solo, contaminando a água do mar. E houve a explosão de hidrogênio bem conhecida.

A investigação do Parlamento japonês concluiu que essa falha na cultura de segurança do seu país resultou do que chamou de “conluio” entre empresas e governo. Haveria também aqui no Brasil “conluios” desse tipo? Um dos processos que recentemente levaram à prisão o ex-presidente Michel Temer está relacionado com Angra 3.
 
Chico Whitaker, Heitor Scalambrini Costa, Renato Cunha e Zoraide Vilasboas são facilitadores da Articulação Antinuclear Brasileira. Assinam em nome dos demais facilitadores

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