Correio da Cidadania

Guerra da Ucrânia: chega-se ao topo do comando

0
0
0
s2sdefault


2023 iniciou-se no leste europeu com a continuidade do conflito russo-ucraniano, já assinalado pela ausência da perspectiva de paz duradoura no horizonte próximo, haja vista o cessar-fogo determinado pelo presidente Vladimir Putin em virtude da celebração do Natal ortodoxo, gélido em várias localidades da nação agredida devido aos cortes de fornecimento de energia por causa dos ataques.

A duração da trégua do dirigente foi apenas dia e meio. Aponte-se que Cirilo, patriarca de Moscou e de toda Rússia, tem sido férreo apoiador da atuação militar russa, a despeito do desgaste do relacionamento de sua instituição com a contraparte ucraniana.

A interrupção dos combates recupera remota lembrança de dezembro de 1914 durante a I Guerra Mundial, momento no qual efetivos britânicos, franceses e alemães fraternizaram por período similar – revive-se o evento de quando em quando de modo artístico como na música, por exemplo, Pipes of peace, de Paul McCartney, de 1983.

A par do aspecto religioso, a suspensão, embora de curta extensão, contribuiu para a preparação de novos assaltos por Moscou, ciente também de que Washington e Berlim se articulam para fornecer equipamentos a Kiev como dezenas de veículos blindados de grande porte como os caríssimos Bradleys e Marders respectivamente para auxiliar a defesa do território.

A recuperação de áreas em novembro último estimulou sem hesitação o moral dos contingentes ucranianos. No entanto, a chegada da equipagem germano-americana não será tão rápida como espera o mandatário Volodymyr Zelensky: deve estender-se por semanas, prazo no qual os russos podem aproveitar-se para investidas intensas em lugares avaliados como estratégicos.

Apesar do ganho de tempo, o Kremlin demonstra dificuldades de compor suas linhas de frente a contento, de maneira que tem recorrido ao alistamento até de detentos, indultados de modo pleno desde que executores do tempo de serviço solicitado – cerca de seis meses - em unidades mercenárias como a famigerada Wagner.

Não se tem estimativa precisa do número de recrutados dessa forma, visto ser segredo de Estado. Especula-se a cifra ao redor de quarenta mil conscritos, segundo a organização não governamental Russia Behind Bars. Iludidos por promessa de soldos elevados e lançados a campo sem treinamento adequado, são eles, por conseguinte, os integrantes da maior parte das baixas das batalhas - https://www.theguardian.com/world/2023/jan/05/putin-orders-36-hour-truce-in-ukraine-for-orthodox-christmas. Ademais, em caso de aprisionamento pela Ucrânia, há embaraço com o fito de definir a situação jurídica na qual os prisioneiros se inseririam.

Enquanto os dois lados aprontam-se para combates extenuantes, aliados próximos anseiam por compromisso diplomático, malgrado momentâneo; no entanto, o Kremlin só aceita sentar-se – bi ou multilateralmente - à mesa se houver o reconhecimento prévio das quatro regiões incorporadas à força, ao país ao passo que Mariyinsky se ocorrer o inverso. Além disso, ela deseja o retorno da Crimeia, perdida há quase uma década.

Diante da impossibilidade imediata de atendimento das exigências dos dois contendores, o mundo continuará a acompanhar a disputa sem vislumbrar encerramento à vista. Por derradeiro, chamativo sinal de que a Ucrânia já não será tratada por cima do ombro pela Rússia é a recente troca de comando: Valeri Gerasimov, chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, substituiu Sergei Surovikin.

A mudança é significativa: no começo da chamada operação militar especial, em fevereiro de 2022, nem sequer havia comandante-chefe único do empreendimento; hoje, o quarto indicado é o oficial mais graduado do exército, de modo que se aguarda a intensificação dos embates.

Virgílio Arraes

Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

Virgílio Arraes
0
0
0
s2sdefault