Correio da Cidadania

Estados Unidos: percalço com a Rússia na Ucrânia

0
0
0
s2sdefault


Foto: Mapa da região da Crimeia. Ilustração: Peteri / Shutterstock (adaptado) Retirado de Infoescola

No século passado, Washington ingressou em confrontos de variada intensidade. Conquanto tenha superado seus maiores adversários, Alemanha e depois União Soviética (URSS), a Casa Branca enredou-se com adversários de menor porte, como o Vietnã nos anos setenta ou mais remotamente com Pancho Villa, nem sequer representante oficial do México, na década de dez por atacar cidadãos norte-americanos em duas ocasiões: em solo mexicano e estadunidense.

A incessante, porém malograda, busca de meses por Villa em terras mexicanas, após o assassínio de dezenas de pessoas, serviu de referência política para a ação de capturar de início Osama bin Laden no Paquistão por fuzileiros navais em 2011. Todavia, o terrorista seria morto no correr da operação, lançada a partir do Afeganistão, com organização da Agência Central de Espionagem (CIA).

No mesmo século, os republicanos associaram com sucesso os democratas à tibieza no tocante à política externa, embora tenham sido estes os autorizadores da entrada do país nas duas grandes guerras mundiais (Woodrow Wilson e Franklin Roosevelt) e, durante o período bipolar, nas da Coreia (Harry Truman) e do Vietnã (Lyndon Johnson). Coube a eles naquela época uma exceção: a de Granada, fase final da rivalidade amero-soviética, no desdobrar da gestão de Ronald Reagan.

Na presente centúria, dirigentes republicanos começaram dois confrontos: o do Afeganistão e de novo o do Golfo, em pouco intervalo de tempo (entre 2001 e 2003). Não tiveram os democratas a habilidade de encerrar de maneira cabal a participação do país nas duas citadas disputas. Recolheram-se do território afegão de modo envergonhado, quase fugidio, por exemplo, ao entregar o governo na prática a seus ferrenhos inimigos ao longo de duas décadas: os talibãs, responsáveis pelo ataque perpetrado em setembro de 2001 a Nova York e Washington.

Humilhada a Casa Branca, resta-lhe reagir de forma incisiva diante de novo desafio: na Guerra Fria, a redenção com o Vietnã viria com a invasão da diminuta Granada, então próxima de Cuba, motivo de exasperação norte-americana desde a derrocada de Fulgencio Batista; nos dias correntes, o repto tem maior envergadura: Rússia, desejosa de recompor-se territorialmente, desde a fragmentação ocorrida durante a controvertida administração de Boris Yeltsin (1991-1999). O Kremlin mira parte da Ucrânia, associada hoje com o Ocidente, onde há expressiva população russófila.

A retórica ameaçadora de Joe Biden a Vladimir Putin ao assegurar a Volodymyr Zelensky a oportunidade de retaliação em caso de ataque russo soa com credibilidade moderada tal qual a de Trump, quando criticava os inimigos do país como a Coreia do Norte, ou a do atual mandatário ao referir-se aos fundamentalistas em território afegão responsáveis por assassinar mais de uma dezena de pessoas em agosto de 2021.

Estima-se que haja cerca de cem mil efetivos na fronteira comum entre Rússia e Ucrânia. Caso ocorra o assalto moscovita, a reação do Ocidente provavelmente a ser desencadeada será a de revidar com sanções econômicas em primeiro lugar.

De fato, o Kremlin deseja interromper a expansão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) rumo a seus vizinhos. Destarte, o objetivo seria o de impedir a filiação da Ucrânia à instituição castrense – vários países da antiga Cortina de Ferro compõem-na como Albânia, Romênia Hungria, Eslovênia entre outros.  

E aprovar o gasoduto Nord Stream 2, cujo funcionamento lhe permitirá robustecer sua economia e, ao mesmo tempo, ampliar a dependência energética de parte da Europa ocidental. Diante do impasse diplomático, Moscou pode aguardar mais que Washington, cujo horizonte perpassa o aspecto militar, haja vista o processo eleitoral interno desse ano no qual Biden se posiciona com índice de aprovação pouco expressivo – em torno de quarenta por cento segundo o Gallup.

Virgílio Arraes

Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

Virgílio Arraes
0
0
0
s2sdefault