Correio da Cidadania

Mais uma crise na Petrobras: as víboras no salão

0
0
0
s2sdefault

 

 

 

Sobre Pasadena, SBM Offshore, cláusulas “put option” e Marlin, e assuntos correlatos, muito tem sido dito e concluído, no sentido da manipulação da informação, para que só versões convenientes, verdadeiras ou fictícias, dos fatos sejam divulgadas. Sendo o predador um veículo da grande mídia, o interesse é repassar o que interessa ao capital, havendo pouco interesse social.

 

Adicione-se a isto que este ano é eleitoral e muito poder e riqueza futuros irão depender desta eleição. Junte-se, também, que estamos falando de petróleo, um recurso natural com imenso valor estratégico e incomensurável lucratividade. O resultado é este bombardeio de informações que deixa o cidadão comum perdido. Vejamos o que se consegue recuperar de alternativas mais prováveis do ocorrido.

 

Depois da posse do presidente Lula, em 2003, durante o esquartejamento da administração pública do país para entrega dos cargos a grupos políticos, que nossa cultura obriga, a Diretoria Internacional da Petrobras coube a Nestor Cerveró, que pertencia ao grupo do atual senador Delcídio Amaral, o qual foi, no governo FHC, o Diretor de Gás e Energia da Petrobrás.

 

Duas observações preliminares se fazem necessárias. Em países politicamente desenvolvidos, quando há alternância de partidos políticos no poder, são nomeados, em princípio, políticos para os cargos mais altos da administração e são reservados os cargos secundários para funcionários de carreira, não filiados a partidos. Algo como os nossos ministros e presidentes de estatais serem escolhidos do universo político e os chefes de órgãos da administração direta e os diretores de estatais serem funcionários de carreira.

 

A segunda observação preliminar é, na verdade, uma indagação. Como pode um cidadão servir a dois governos teoricamente antagônicos e, também, ser aceito por ambos? Ou o cidadão mudou de posição ou os governos não eram antagônicos. Então, Nestor Cerveró, que está sendo crucificado agora, sem querer inocentá-lo, era um simples testa-de-ferro de um grupo, que não consigo detectar ao certo todos seus componentes.

 

O planejamento interno da Petrobras recomendou, em 2005, a compra de 50% da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, por US$ 190 milhões (outros US$ 170 milhões foram pagos para comprar a matéria prima existente na refinaria), apesar de a Astra Oil ter comprado 100% da refinaria, sete meses antes, por US$ 42,5 milhões. O preço da transação foi avaliado como correto por consultoria externa, que argumentou que os preços no setor de petróleo estavam aquecidos. Além disso, pelas informações obtidas na mídia, a recomendação do planejamento fazia sentido, porque a Petrobras poderia ter acesso a uma refinaria já pronta, sem ter de esperar pelo período de construção de uma nova, conseguiria entrar no mercado norte-americano de derivados e poderia dar um destino para seu óleo pesado, se alguns investimentos adicionais fossem realizados.

 

Assim, quem acompanhasse a compra sabia, antes de o negócio ser fechado, que investimentos adicionais seriam necessários e o dono dos outros 50% da refinaria teria que concordar com estes novos investimentos.

 

Nesta situação, parece-me uma inocência fechar este contrato pela perspectiva de discussão futura. Podia-se ter trazido para dentro do contrato o compromisso da outra parte de realizar os investimentos adicionais futuros. Para piorar a fragilidade da posição assumida ao se assinar o contrato, existia a cláusula “put option” nele, que aumentava a atratividade, para o outro proprietário, de um embate jurídico futuro, alegando simplesmente não concordar em realizar o novo investimento.

 

Raciocínios permitiam antever tudo isto. Consta que o relator da proposta de compra de 50% da refinaria de Pasadena na reunião do Conselho de Administração da Petrobras, em 2006, foi Nestor Cerveró.

 

Pois bem, a presidente Dilma ter participado da aprovação desta compra, na condição de presidente do Conselho de Administração, não me parece errado. Em primeiro lugar, os membros do Conselho desta empresa têm que tomar, no mínimo, umas 200 decisões de maior porte por ano e é humanamente impossível ler a íntegra dos 200 processos. Por isso, existem os sumários executivos, que, no caso específico, foi preparado pelo relator já citado e tudo leva a crer que a compra não foi bem relatada.

 

No final do imbróglio da refinaria de Pasadena, ocorreu o esperado: a Astra Oil não concordou com os novos investimentos, alegou a cláusula “put option” para a Petrobras comprar a sua parte no negócio e ganhou na Justiça, fazendo a Petrobras desembolsar mais US$ 860 milhões pelos restantes 50%. Foi lamentável ouvir do ex-presidente da estatal, José Sergio Gabrielli, que US$ 860 milhões não eram grande quantia para a empresa. Não sei se, para ela, é desprezível, mas para qualquer trabalhador brasileiro é um valor que não se consegue nem imaginar. Espero que a Polícia Federal, o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União mergulhem no passado e descubram os verdadeiros responsáveis. E, havendo dolo, que estes sejam exemplarmente punidos.

 

Entretanto, querer responsabilizar a presidente Dilma, por ela ter votado favoravelmente à compra de Pasadena no Conselho, é puro interesse eleitoral. Acho até que a presidente Dilma não precisava ter dado explicação alguma, como deu, pois bastava dizer: “votei com o relator, uma vez que concordei com seu sumário executivo”. Se o jogo é recriminar a presidente Dilma, acho melhor se dizer que o critério dela e de seu antecessor para escolha de auxiliares é falho.

 

Chega a ser hilário ver o presidenciável Aécio Neves dizer que quer reestatizar a Petrobras, sentado ao lado de Fernando Henrique, com quem ele sonha dividir a chapa para a eleição e que quis privatizar a Petrobras no seu governo (ver evento Petrobrax). Quanto ao Eduardo Campos, pergunto-me onde ele estava quando a presidente resolveu entregar 60% de Libra para empresas estrangeiras ou quando ela resolveu leiloar blocos para produção de gás de xisto na região do aquífero Guarani. Ele ainda não era candidato e, portanto, não precisava criticar?

 

Neste momento, as oposições querem criar a CPI da Petrobras no Congresso, para averiguar este caso, Paulo Roberto Costa, SBM Offshore e outros. Obviamente, o objetivo verdadeiro é ver “a presidente Dilma sangrar”, como se diz em política. A mídia do capital tudo fará para as candidaturas de Aécio Neves e Eduardo Campos levantarem voo.

 

As empresas petrolíferas internacionais devem estar eufóricas, pois querem abocanhar a Petrobras e já aparecem artigos dizendo que “a solução é privatizar a empresa, uma vez que, assim, vai acabar a roubalheira”. Este ponto merece uma análise.

 

O superlucro advindo do petróleo, quando a concessão é entregue a empresas estrangeiras, vai totalmente para o exterior e este fato não é caracterizado como um roubo, por estar dentro da lei, mas representa uma enorme perda para a sociedade, pois deixa de ativar nossa economia. Não vou me ater à perda da possibilidade de comercializar este petróleo ao adotar a “opção privada” e, assim, deixar de usufruir da importância geopolítica dele.

 

Além do mais, é preciso acabar com esta irrealidade que, no setor privado, não há corrupção. Primeiramente, todos os corruptores de designados para os cargos públicos e de servidores são integrantes do setor privado. Depois, lembrem-se do exemplo bem didático que, quando explodiu a bolha do mercado imobiliário, em 2008, nos Estados Unidos, muitos bancos pediram concordata, mas seus CEOs continuaram muito ricos. Ou seja, eles roubavam os bancos que os empregavam.

 

Tudo isto está em jogo neste momento. Gostaria de saber o que pensam os políticos Randolfe Rodrigues, Mauro Iasi e José Maria de Almeida, que também são candidatos a presidente, ou algum outro que esqueci. Porque a presidente Dilma, apesar de a sua preocupação social ser perfeita, infelizmente fez uma opção preferencial pelo mercado que não me agrada. Fugindo à norma rígida da escrita de artigos, aproveito este para mandar um recado para a presidente: “a senhora ouviu tanto o mercado e, agora, este ingrato está mandando a mídia dele insuflar as candidaturas Aécio e Campos!”.

 

Leia também:

Petrobras – coluna anterior de Paulo Metri

 

Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia e colunista do Correio da Cidadania.

Blog do autor: http://paulometri.blogspot.com.br/


0
0
0
s2sdefault