Correio da Cidadania

Até quando os EUA vão engolir a submissão a Israel?

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Fome e sede assolam população na Faixa de Gaza; 18.800 | Internacional
Em 1946, 700 mil palestinos fugiram para Estados vizinhos, como resultado da guerra de independência de Israel.

Eles foram expulsos pelo exército israelense ou abandonaram suas propriedades em mais de 400 vilas árabes, temendo violências como o massacre de Deir Yassin, onde 254 palestinos (dado da Cruz Vermelha), inclusive crianças, morreram assassinados pelas forças de Israel.

A UNRWA (Agência da ONU de Assistência aos Refugiados da Palestina) foi criada pela Assembleia Geral da ONU em 1949 para fornecer aos refugiados palestinos serviços de saúde, educação, assistência social, desenvolvimento humano e ajuda de emergência, inclusive alimentação.

A UNRWA é financiada por recursos doados voluntariamente por um grupo de Estados, dos quais os EUA são os maiores contribuintes, seguindo-se Alemanha, União Europeia, Suécia, Noruega e o Japão, entre outros.

Atualmente, 6 milhões de palestinos (incluindo, seus descendentes), dos quais 82% vivem em situação de extrema pobreza, são atendidos pela UNRWA instalada no estreito de Gaza, Cisjordânia, Síria, Líbano e Jordânia.

Dados do massacre

No Estreito de Gaza, 1.476.000 refugiados palestinos foram registrados na UNRWA local, a partir de 7 de outubro. Devido à destruição em massa das residências pelas bombas de Israel, afluem constantemente a Gaza e Rafah massas de palestinos desalojados. Muitos procuram os abrigos da UNRWA, pois têm em geral opções mínimas de alojamento, o que cria superlotação. Recentemente, bomba lançada por avião israelense atingiu um desses abrigos superlotados, matando 31 refugiados.

A UNRWA tem sido essencial para os palestinos refugiados e/ou sem teto (hoje são 85% da população), representando a salvação para quem sobrevive no estreito, sob risco de vida e/ou de bombardeio de sua casa.

O World Food Programe recentemente informou que 80% das pessoas mais pobres do mundo vivem em Gaza. (Truth Out, 4/2/2023). Dos 30 mil funcionários da UNRWA, 13 mil trabalham em Gaza. A UNRWA é a principal agência humanitária da região e a segunda maior empregadora.

Basta dizer que 1 milhão de palestinos, metade da população do Estreito, depende da UNRWA para receber água, alimentos, cuidados de saúde e suplementos de higiene.
Pode parecer absurdo, mas não surpreende a decisão israelense de acabar com a UNRWA.

Há já muito tempo, os governos do regime sionista vêm espalhando rumores de que essa instituição é aliada do Hamas, e trabalha para destruir Israel. Segundo afirma o premiê Netanyahu, “Gaza é uma organização que perpetua o problema dos refugiados palestinos e a narrativa do direito de retorno com o objetivo de eliminar o Estado de Israel e, portanto, a UNRWA deve ser removida do mundo”.

Bibi foi muito claro. A volta dos refugiados, mesmo através de um acordo que apenas os ajudassem a se instalar em sua antiga terra, é inaceitável para o regime sionista, já que considera necessário reduzir substancialmente o número de palestinos em Israel e na Cisjordânia (que pretende anexar) para evitar a descaracterização de Israel como país sionista.

Em reunião recente, representantes israelenses informaram à UNRWA que doze dos seus funcionários eram ligados ou membros ativos do Hamas.

Não apresentaram nem provas documentais, nem evidências. Apenas a palavra do Shin Bet, serviço de inteligência do exército israelense, pouco digno de crédito depois das várias mentiras que tem assacado contra o Hamas e os palestinos, sendo que a lenda dos “ 40 bebês degolados” foi a cereja do bolo.

Temerosos de que a denúncia de infiltração terrorista fosse uma sequência da implacável campanha de Telavive contra a UNRWA, os dirigentes da organização imediatamente demitiram os 12 acusados e ordenaram uma investigação rigorosa.

Poderiam se limitar a essa última iniciativa, talvez apenas suspendendo os acusados, deixando para demitir ou não de acordo com as conclusões da investigação. Pegaria bem, pois goza do apoio da comunidade internacional que valorizaria as providências tomadas pela organização.

Mas não conhecia a extensão do apoio norte-americano a Israel, nem do apoio dos países doadores aos EUA. Assim que Israel lhe apresentou suas acusações à UNRWA, Biden não esperou nem um dia para suspender as doações, abrindo um largo sorriso no fechado semblante do premiê israelense. Talvez tenha até comemorando a pressa do sempre fidelis Biden, abrindo um champagne daqueles ganhos na calada da noite, que o procurador geral usa como uma das provas que tornaram Netanyahu réu de processo criminal.

Logo em seguida, um grupo de 17 países vassalos de Washington seguiram seu líder, também suspendendo suas contribuições. A maioria deles sequer recebeu qualquer explicação das “evidências” que justificariam os cortes de verbas e não perdeu tempo discutindo as decisões do morador da Casa Branca (não mais abrilhantada pela beleza de mrs. Trump, por contingências eleitorais), cortando o equivalente à metade do orçamento da URNWA.

Curiosamente, o número 2 da política externa estadunidense, o secretário Blinken, declarou a jornalistas que as chamadas “evidências” israelenses seriam altamente críveis, para, a seguir, informar que o seu governo não as verificara.

Blinken teve um raro assomo de sinceridade, ao confessar a vergonhosa omissão do governo Biden pois acusações não verificadas não têm valor probatório. Portanto, o governo Biden aprovou sérias acusações contra a respeitável instituição que é a UNRWA simplesmente confiando na palavra do premiê do governo de Telavive.

Responda: você compraria um carro usado de Netanyahu?

As ditas “evidências israelenses” foram apresentadas em dossiê, no qual os representantes do governo sionistas acusavam os 12 funcionários da UNRWA (hoje restam 9, pois 2 já morreram e o terceiro ninguém sabe, ninguém viu) de serem ligados ao Hamas ou membros efetivos da milícia. Sem provas. Nada disso valia um shekel.

A comunicação do insuspeito jornal Financial Times foi definitiva. Tendo examinado análise da inteligência, informamos que Israel não oferece uma prova das acusações, incluindo a denúncia de que um dos membros do staff teria raptado uma mulher”.

Como na justiça de qualquer país civilizado, provas ou evidências são essenciais, sua ausência no fantasioso dossiê anti-UNRWA o invalida totalmente. Ficou claro que, para Joe Biden, a amizade incondicional a Israel implica na aceitação de tudo que Israel disser ou fizer, seja verdade ou mentira, justo ou injusto. É a impunidade absoluta!

Os presidentes norte-americanos anteriores também trataram Israel de forma especial, como se viu nos 80 vetos de Washington a condenações pela ONU de ações israelenses. Mas Biden foi longe demais.

Trump o igualou, mas nunca se preocupou em reafirmar a política de submissão a Israel, nunca se atreveu a qualificar a atuação do feroz Netanyahu na guerra de Gaza como “acima do nível mais alto”. Nem repetiu verdadeiras declarações de amor e de amizade eterna à figura raivosa que assola a Palestina.

Depois de tantas considerações negativas, aqui vai uma notícia boa: quase todos os países doadores, inclusive a Europa Unida, a Inglaterra, a Alemanha e a França dizem que poderão voltar a enviar seus recursos ao UNRWA, de acordo com os resultados das investigações da ONU.

Mas não é muito. Possivelmente será tarde demais, pois tais investigações demoram usualmente meses. A esperança é que por pressão interna, os países do rebanho yankee encontrem um jeito de se livrar da armadilha que eles mesmos criaram contra sua imagem. Enquanto isso, Gaza terá entrado em colapso.

Sem os recursos externos ora suspensos, a UNRWA terá de encerrar suas operações e 1 milhão de palestinos em Gaza ficarão sem comida, água limpa, remédios, assistência médica e abrigo.

Dis Juliette Touma, diretora de Comunicação da UNRWA: “apelo a todas estas nações que suspenderam seus recursos porque da sua decisão depende as vidas de milhões de pessoas, não apenas em Gaza, mas em toda a região que depende dessa assistência e dos recursos enviados”.

Segundo Chris Gunness, ex-porta-voz da UNRWA, nenhuma organização humanitária que atua em Gaza pode atender aos serviços que ela oferece (Middle East Eye, 8/2/2014).

Mesmo com a UNRWA atuando, já havia grande preocupação com o aumento da fome, da sede e das doenças provocadas pela falta de alimentação. Sendo ela fechada, Gaza ficaria à beira de uma fome generalizada, do nível daquela que assolou a Irlanda no século passado e forçou a emigração em massa de camponeses do país aos EUA.

Cortando suas contribuições à UNRWA, os países doadores estarão negando o acesso humanitário aos cidadãos de Gaza, desobedecendo assim a decisão da Corte Internacional de Justiça (ICJ) que ordena a garantia desse acesso às pessoas ora habitando o Estreito.

Como as decisões do ICJ são vinculantes, espera-se que os doadores respeitem as normas do direito internacional, como compete a nações civilizadas.

As hesitações de Biden

Nas últimas semanas, parece que Biden lembrou-se de que costuma proclamar-se defensor irrestrito dos direitos humanos, pois passou a lamentar os sofrimentos do povo de Gaza e a apelar a Netanyahu para que adotasse métodos para matar menos palestinos.

Comentando essas manifestações do presidente, disse Joseph Borrell, chefe da política externa da União Europeia : “Bem, se você acredita que pessoas demais estão sendo assassinadas, talvez você deveria providenciar menos armas (a Israel) a fim de evitar que tantas pessoas sejam assassinadas (Middle East Eye, 13/1/2024)”.

Em lugar de agir, Biden prefere falar. Enquanto embarca diariamente a Israel bombas de 1 e 2 toneladas, ele está fazendo aprovar no Senado o envio de um suprimento de mais 14 bilhões de dólares em armas para Israel poder matar mais palestinos, num prazo mais curto.

Apesar disso, ele se atreveu a usar palavras duras, chamando os ataques israelenses, primeiro de “indiscriminados”, mais tarde de “exagerados”. Mas aí não, Biden, exagerada é a paixão dos russos pela vodka e dos norte-americanos pela Coca-Cola: os ataques das forças de Israel em Gaza são selvagens. Como o plano cruel de atacar Rafah.

Para esta pequena cidade no extremo sul de Gaza, junto à fronteira com o Egito, acorreram mais de l milhão de palestinos, fugindo desesperadamente dos implacáveis bombardeios israelenses.

Com isso, a população de Rafah quintuplicou, a maioria vive em tendas improvisadas, amontoadas numa área pequena demais para tanta gente.

O UNRWA oferece aos 1.400.000 palestinos refugiados em Rafah comida, água limpa e cuidados médicos. Se esta instituição fechar, eles vão literalmente morrer de fome e de sede, porque os mantimentos trazidos pelos caminhões são insuficientes, sendo que Israel ainda age para retardar sua chegada.

Como narrou Philipe Lazarini, diretor da UNRWA, na sexta-feira, dia 9: “um comboio de alimentos doados pela Turquia ficou parado durante semanas no porto de Ashdod (Israel), pois o responsável recebeu um telefonema de autoridades israelenses, ordenando que ele não deixasse seguir quaisquer bens da UNRWA”.

A última fronteira

Apesar dos protestos de muitos países, o premiê israelense insiste em atacar Rafah, o que o tornará um criminoso de guerra, conforme a lei humanitária internacional que proíbe o bombardeio de áreas densamente habitadas.

Os EUA estão entre as nações que mais têm urgido Netanyahu a ter piedade dos palestinos, que encontraram em Rafah sua última chance de permanecer vivos.

Notem que Biden também disse que rejeitava a bélica decisão do “grande, grande amigo”, mas estaria tudo bem se ele efetuasse um plano para permitir a saída segura de Rafah.

Pode ser que o “grande, grande amigo” o atenda. Aliás, faça de conta. O israelense já está anunciando que tem muito espaço livre acima de Rafah onde os palestinos poderão se instalar.

E serem massacrados pelos cruéis bombardeios de Israel. Como já aconteceu, quando o comando militar israelense ordenou que a população saísse do norte de Gaza, dirigindo-se para o sul da cidade, onde estaria segura...

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Luiz Eça

Começou sua vida profissional como jornalista e redator de propaganda. Escreve sobre política internacional.

Luiz Eça
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