Correio da Cidadania

ONU: ocupação militar e discriminações causam violência na Palestina

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Foto: Pixabay

Relatório de comissão de alto nível do Conselho de Direitos Humanos da ONU diz que a situação de violência infinita na Palestina é causada por Israel. Mais especificamente pela ocupação militar da Cisjordânia e pela discriminação contra os palestinos.

Para a comissão, os fatos demonstram que Israel não pretende terminar com a  ocupação e a discriminação dos palestinos, pois estas posturas são eficientes para garantir a maioria de israelenses judaicos no país e, consequentemente, o caráter sionista do regime.

Para cumprir esse objetivo, a expansão de assentamentos judaicos na Cisjordânia é peça das mais importantes. O governo oferece condições favoráveis aos assentados, enquanto estimula a redução do número de palestinos pela criação de um ambiente repressivo a eles e suas famílias (Middle East Eye, 13/06/2022).”

Os líderes israelenses apressaram-se em tentar desmoralizar as conclusões da comissão, indigestas para um país que se diz uma democracia quase perfeita.

Os EUA, grande protetor de Israel, logo os apoiaram, acusando o Conselho de Direitos Humanos da ONU de adotarem um enfoque parcial e enviesado contra o Estado judeu. E não ficaram nisso: apresentaram uma declaração, condenando a seriedade da investigação (YNet, 13/06/20220.

Aparentemente, Washington tem razão, Israel é mesmo o líder destacado em matéria de infrações, conforme o Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Na verdade, não se trata de perseguição, mas de realidade.

A desconfortável liderança israelense é perfeitamente proporcional à notável variedade e quantidade de condutas e leis desumanas que Israel promove habitualmente. Algumas até crimes de guerra, de acordo com o Direito Internacional.

Noto também que Israel é a única nação que ocupa militarmente, e durante muitos anos, o território de outra nação, em flagrante desrespeito às leis internacionais. Afinal, não estamos mais na Idade Média e, desde o século 20, o direito de conquista não é reconhecido pelas nações civilizadas.

Difícil contestar a honestidade e competência dos membros da comissão. O Jurista sul-africano, Navi Pillay, foi chefe do setor de Direitos Humanos da ONU; o indiano Miloon Khotari é o primeiro relator especial da ONU sobre habitações e o australiano Chris Sidoti é especialista em leis humanitárias internacionais.

Relatório do Human Rights Watch posiciona Israel como culpado em, pelo menos, cinco das principais categorias dos direitos humanos internacionais: execuções ilegais, deslocamentos forçados de palestinos, detenções abusivas, bloqueio de Gaza, desenvolvimento de assentamentos e políticas que discriminam os palestinos entre outras restrições desse nível (The Guardian, 12/06/2017). Acrescento a política de demolições de casas de palestinos.

Fatos a seguir demonstram o enquadramento de Israel na prática de todas as discriminações e ilegalidades citadas.

Em 2015,durante o governo Obama, relatório do Departamento de Estado dos EUA criticou o excesso de força do exército de Israel contra os palestinos nos territórios ocupados. Metade dos palestinos mortos sob acusação de ataques a militares ou civis israelenses, na verdade, não haviam atacado ninguém.

Conforme o relatório americano, apenas 77 foram autores de atos criminosos entre as 149 vítimas das balas israelenses. Todos as demais tombaram assassinados em manifestações ou “operações de rotina”. O Departamento de Estado denunciou ainda a existência de uma política israelense de prisões arbitrárias, seguidas de torturas e violências, frequentemente impunes.

Em 7 de outubro de 2017, o Military Court Watch, grupo de advogados e ativistas que monitoram o tratamento das crianças nas detenções por militares,  acusou Israel da prática de maus tratos contra menores de idade. Cerca de 70 deles, encarcerados em 2017, relataram ter sofrido, por parte de soldados, violências e abusos físicos como: tapas, chutes, beliscões e golpes com diversos objetos, tendo ainda sido forçados a sentar em posições dolorosas durante muito tempo. Tudo consta do relatório , publicado em outubro de 2017 (Haaretz, 21-12-2017).

Com 30 anos de luta contra as torturas, o Public Committee Against Tortures (PCAT) chegou à conclusão de que “Israel não pensa em acabar com as torturas.” A citada organização procedeu a uma investigação rigorosa das reclamações de 1.300 palestinos submetidos a essa hedionda prática. Depois de analisar os resultados, o PCAT processou os responsáveis, com base em “inequívocas evidências de sérias violações da lei”. Nem um só dos acusados foi sequer indiciado. Apenas dois casos mereceram uma investigação policial, que não deu em nada.

Comentando a questão, o PCAT declarou: “A lei de Israel apoia a cultura das mentiras e seu encobrimento persiste no sistema de segurança (Middle East Eye, 10/06/2022).”

Alguns outros países também costumam torturar suspeitos, mas somente Israel tem um programa de assentamentos de judeus em terras que não lhe pertence.

Os assentamentos representam um conjunto de diversas malazartes: violações do direito internacional, das leis humanitárias, de decisões da ONU, da Convenção de Genebra e dos direitos de propriedade de palestinos.

Hoje, os assentamentos são habitados por cerca de 700 mil judeus israelenses, que foram instalados na Cisjordânia em desrespeito ao disposto na Quarta Convenção de Genebra, que proíbe explicitamente os Estados ocupantes de transferirem seus civis para os territórios ocupados.

Os assentamentos são criados por Israel em terras de palestinos, forçados a aceitar sua perda, sem tugir nem mugir.

São considerados pelas grandes democracias mundiais um formidável obstáculo à teoria dos dois Estados independentes para resolver os conflitos entre os dois povos que vivem na Palestina. Por isso mesmo todos os países civilizados, incluindo os EUA, desde 1978, condenam os assentamentos (a não ser no governo Trump que retirou Tio Sam dessa lista).

Apesar do Conselho de Segurança da ONU ter ordenado, em 2017, que cessasse imediatamente a expansão dos assentamentos, os governos do regime sionista não se tocam: continuam criando assentamentos. Inclusive, o premier Bennett, que está executando um plano de construção de 3.000 moradias.

Infelizmente, boa parte dos assentados merecem nota zero em comportamento. Já faz alguns anos que repetem-se casos de agressões, destruição de pomares e plantações de cereais de agricultores palestinos, por seus vizinhos moradores dos assentamentos, sob os olhos complacentes de soldados que estão ali para garantir a paz.

Outra ocupação ilegal é a de Jerusalém, tomada por força militares israelenses em 1967, violando decisões da ONU.

Instalados no poder pela força das armas, representantes do governo sionista negam-se a reconhecer os direitos de cidadania dos palestinos da cidade. Em troca, essas pessoas receberam um cartão de residente em Jerusalém, que pode ser revogado, caso não provem ser Jerusalém ou Israel o “centro de suas vidas.”

Talvez uma das mais cruéis discriminações do governo de Telaviv é as demolições forçadas de casas de palestinos, em geral realizadas pelos próprios moradores.

As demolições são mais uma violação da lei internacional e um crime de guerra. Pelo art. 53 da Quarta Convenção de Genebra a destruição de propriedades pelo Estado ocupante é proibida, “exceto quando absolutamente necessária por operações militares”, o que quase nunca é o caso.

Como contratar a demolição por outrem tem um preço exageradamente alto, os palestinos atingidos acabam por demolir eles próprios as casas onde viviam com suas famílias.

Conseguir licença para construir é praticamente impossível. Em Jerusalém, o governo tem negado pelo menos 93% das permissões pedidas.

A maioria dos palestinos nem tenta pedir porque o preço da licença - 43.600 dólares - está muito acima das possibilidades de uma população com 59% sobrevivendo na pobreza.

Para tornar ainda mais pesada a discriminação dos palestinos, existem duas leis na Cisjordânia ocupada. Para os judeus israelenses, é a mesma lei de Israel, que segue os padrões internacionais. Já os palestinos são julgados por tribunais militares, de acordo com leis militares, duras e rígidas, inclusive nas punições. Daí a razão de soldados denunciados pela prática de crimes, inclusive de morte, vitimando palestinos quase nunca são condenados. Segundo estatísticas de 2014, do grupo de direitos humanos Yesh Din, apenas 3,5% de 229 soldados suspeitos de crimes contra civis palestinos na Cisjordânia ocupada e em Jerusalém foram sequer indiciados.

As leis militares, vigentes há 53 anos na Cisjordânia ocupada, negam liberdades normais aos palestinos, como agitar bandeiras, protestar pacificamente contra a ocupação, aderir a grupos pró-independência e publicar material político, o que dá carta branca aos militares para processar quem organizar manifestações políticas, discursar ou publicar notícias que desagradem ao Exército (The Guardian, 17/12/2019).

As leis na Cisjordânia permitem que os militares proíbam reuniões de mais de 10 pessoas, nas quais haja discursos sobre questões políticas a menos que um comandante israelense dê permissão.

Por fim, vamos falar de Gaza.

Seus habitantes não têm acesso à saúde, nem água potável. Eletricidade apenas algumas horas por dia (os sistemas desses serviços públicos foram arrasados pela aviação de Israel). Com desemprego passando dos 50%, 80% dependem de ajuda externa para poderem se alimentar. 40% das famílias  sobrevivem na pobreza absoluta. O desemprego já passou de 47% e 4 entre 5 crianças de Gaza sofrem de depressão, tristeza e medo contínuo (Middle East Eye, 3/6/2022).

“Tanto em termos de saúde, de desemprego, de energia, de acesso a água, em tudo isto há um declínio cada vez mais rápido”, diz relatório da ONU, de 2012, pois a população cresce, mas não os recursos necessários a ela.

Por trás destas destes números devastadores está o bloqueio de Gaza, com o qual Israel impede a entrada de produtos essenciais.

Para o relatório do Conselho de Direitos Humanos da ONU somente com o fim da ocupação militar será possível acabar com injustiças históricas e o persistente ciclo de violências na Palestina e caminhar para a auto-determinação do seu povo.

O problema é que não existe um governo de Israel que ouse chamar seus soldados para casa. Há dezenas de anos, os políticos e a maioria dos jornais e emissoras de Rádio e de TV vendem ao povo israelense a Ideia de que os palestinos são verdadeiros animais ferozes, que juraram destruir Israel. Mantê-los presos na jaula da ocupação seria necessário para impedir que esses bárbaros massacrem o povo judeu.

Veja o que diz sobre isso o famoso jornalista israelense Gideon Levy: “A morte de palestinos é aceita em Israel mais ligeiramente do que a morte de mosquitos.”

Evidentemente, os movimentos palestinos colaboraram, vitimando civis inocentes, em atentados. O Hamas e o Fatá já perceberam renunciaram formalmente a tais práticas.

Mas, insistem em marcar presença, lançando balões e foguetes primitivos nos territórios de Israel, com efeito nulo, no máximo, irritam a população da fronteira, obrigada a largar tudo e procurar um abrigo, quando se ouve sirenes denunciando um ataque. Isso só alimenta os ódios e enfraquece a imagem internacional dos lutadores pela independência palestina, mantendo a ocupação militar prestigiada pelos eleitores e os políticos que atacam os palestinos para ganhar votos.

Não sei o que se deve fazer para convencer os cidadãos de Israel das vantagens de acabar a ocupação militar e aceitar mudanças nas leis discriminatórias.

Certamente é importante buscar apoio internacional, destacando as violências e ilegalidades cometidas contra os palestinos e seu direito à independência. A comunidade americana deveria ser o alvo principal, por sua imensa influência sobre Israel.

Acho que isso só acontecerá quando a ala progressista do Partido Democrata liderar o partido e conseguir eleger um presidente lúcido, corajoso e imparcial. Nada a ver com Biden.

 

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Luiz Eça

Começou sua vida profissional como jornalista e redator de propaganda. Escreve sobre política internacional.

Luiz Eça
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