Correio da Cidadania

A coalizão dos “estofadinhos”

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Não é sempre que a candidata Dilma Rousseff, uma tecnocrata travestida de política pelo triunfalismo lulista, comete impropriedades ao falar. Quando opera no seu ramo, recupera o brilho da autenticidade e até que manda bem. Exemplo? Por ocasião do leilão para a monstruosa obra da Usina Belo Monte, quando as grandes empreiteiras se afastaram da disputa, ela acertou na mosca ao caracterizar o jogo de cena: "estão estofadinhas de obras".

 

As grandes empreiteiras, que trabalham quase sempre para os governos, estão fartas de ganhar dinheiro em obras públicas de duvidosa prioridade e orçamentos elásticos. Boa parte de tal fartura, no caso das encomendas do governo federal no setor elétrico, foi negociada e contratada nos gabinetes ministeriais então ocupados pela atual candidata. Falou, portanto, com o conhecimento de causa e pode ter forjado uma expressão emblemática do atual momento brasileiro.

 

"Estofadinhas", as grandes empreiteiras fazem obras de fachada e, como se sabe, fundos de campanha eleitoral. No dia 4 do mês em curso, a "Folha de S. Paulo" estampou, com ares de denúncia, a seguinte notícia: "Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, Carioca Christiani Nielsen e JM Terraplanagens responderam, durante o ano de 2009, por 39% do arrecadado pelo PT, PMDB, PSDB e DEM". Ou seja, os maiores partidos da ordem dominante também estão "estofadinhos".

 

Escândalo? Nem tanto. Apesar do quatro por quatro que lembra quatrilho ou até quadrilha, a notícia é recebida como mais uma manifestação rotineira do padrão brasileiro de financiamento eleitoral. Os números são grandiosos, na escala dos milhões, e o trajeto do dinheiro é sempre semelhante. As grandes máquinas eleitorais, acoitadas nos aparelhos do Estado, operam na facilitação dos grandes negócios que, por sua vez, alimentam o intestino grosso da pequena política.

 

A malha de cumplicidades entre os magnatas supremos da economia e os partidos da ordem dominante está em toda parte. É um guarda chuva permanente na defesa dos múltiplos interesses dos "estofadinhos". Os exemplos são vários. Vale citar alguns, ocorridos no mês em curso.

 

Quando o Banco Central elevou a taxa de juros, uma transferência bestial de recursos para o cofre de banqueiros e especuladores, o aplauso foi geral nos jornais e na televisão. A candidata oficial do sistema, Dilma, aplaudiu a medida e foi acompanhada, para a surpresa de alguns desavisados, pelo candidato oficioso do mesmo sistema, José Serra.

 

Quando o Congresso Nacional, pressionado pela proximidade das eleições e pela presença ativa dos aposentados em suas galerias, aprovou em primeira votação o aumento de 7,7% nas aposentadorias e o fim do fator previdenciário houve uma grita geral. Editoriais em protesto contra a irresponsabilidade. E, mais uma vez, a candidata oficial e o candidato oficioso firmaram posição comum. A expectativa dos "estofadinhos" é o veto presidencial contra a "gastança". Juro mais alto é imperativo categórico, mas a migalha de aumento vai desestabilizar as contas públicas.

 

O cidadão, espantado, observa a emergência de uma conjuntura política inusitada. Nela, a confluência de interesses materiais muito poderosos atua no sentido de moldar a embocadura e a agenda das eleições gerais que se avizinham.

 

A indústria cultural de massas, guardiã do pensamento único, os pontos fortes de uma economia cada vez mais monopolizada e os partidos da ordem, que ocupam o cerne dos executivos e administram a pequena política nos parlamentos, são sócios de um mesmo condomínio.

 

Na disputa presidencial, a embocadura já está delineada. Para a mídia grande só existem dois candidatos. Serão também os latifundiários do tempo na televisão e terão dinheiro sem limites para gastar na campanha. Apresentados como pólos de uma disputa real, Dilma e Serra, a oficial e o oficioso, são na realidade expressão bifronte de um mesmo projeto: a coalizão dos "estofadinhos".

 

Léo Lince é sociólogo.

 

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Comentários   

0 #1 Sinuca de bicoRobson Santos 14-05-2010 08:02
O governo Lula, mesmo após pagar nos seis primeiros anos de mandato - só de juros!!! - cerca de R$ 800 bilhões, não impediu que a tal dívida pública, chamada de “interna” para “descer mais redondo”, alcançasse atualmente mais de R$ 2 trillhões. Apenas no ano de 2008, essa sangria consumiu cerca de R$ 170 bilhões, privilegiando 20 mil rentistas (grande parte estrangeiros). Para o Bolsa-Família (que alcança 30/40 milhões de cidadãos) foram apenas R$ 8,5 bi, para a Saúde - 55 bi, Educação - 40 bi, C&T - 3 bi, Meio Ambiente - 1 bi… Ou seja, se antes já nos saquearam, em outros “ciclos”, o pau-brasil, açúcar, ouro, café, borracha etc., agora nos tomam diretamente o capital (dinheiro), sabotando a capacidade de investimento do Estado brasileiro, tão necessária para sairmos do secular subdesenvolvimento.

Vê-se, então, que o governo do presidente operário – mesmo com todo o argumento de que diminuiu a desigualdade - continuou seguindo uma política econômica conservadora e CONCENTRADORA de renda, agora falsamente dicotomizada entre PT e seus aliados e PSDB et caterva. Atente-se que Lula colocou e mantém no BC um elemento oriundo do sistema financeiro e, pasmem, dos quadros do “rival” PSDB. Serra ou Dilma têm agenda política que contrarie essa lógica perversa? Quem pode nos defender dessa rapinagem? Sarney? FHC? Jobim? Gilmar? Dantas? Aécio? Ciro? Requião? Marina? As Forças Armadas? O Povo em armas? Será que...só Deus!!???
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