Correio da Cidadania

O Brasil dos cansados

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O movimento “Cansei”, iniciativa de parte da chamada “elite branca”, vem fazendo todo um estardalhaço, pronunciamentos e manifestações na fronteira do ridículo. E o Brasil, perplexo, querendo saber o motivo de tanto cansaço destes pretensos representantes de uma faixa de ricos empresários, mauricinhos e patricinhas com plumagem tucana, de um país onde 10% da população segue concentrando riquezas e ficando com cerca de 80% da renda nacional. Mas o cansaço do “Cansei” nos chama atenção para um outro cansaço, o do petismo.

Não foi a toa que o presidente Lula da Silva se mostrou revoltado declarando que não entendia este tipo de rejeição na medida em que, de acordo com suas próprias palavras, eles deviam era estar aplaudindo, pois nunca enriqueceram tanto.

E vejam que todos nós somos testemunhas de que Lula da Silva tem feito um grande esforço para esta turma não reclamar. Além da política econômica e das reformas neoliberalizantes que tem promovido, garante ainda o espaço nas esferas estatais de poder de grande parte dos representantes políticos desta riqueza que está nos partidos aliados e simbioticamente sustentando a sua “governabilidade”, como o PMDB, PP, PR, PTB e cia.

Este pessoal é mesmo muito perverso, pois Lula também tem se desdobrado em compromissos públicos sistemáticos com a permanência eterna desta desigualdade social e com a sobrevivência perpétua desta faustosa elite. Por exemplo, quando declarou, em discurso de abertura do 20º Congresso Brasileiro de Siderurgia, diante de 400 empresários que "nós queremos deixar o Brasil preparado no final do mandato para que vocês [grandes empresários] nunca mais tenham medo de eleição, porque ela pode mudar o homem que dirige o país, mas ela não muda as regras que foram consolidadas pela sociedade" (28 de maio de 2007).

 

As próprias declarações de Lula da Silva nos fazem pensar sobre seus significados mais profundos, sobre como expressa o sentimento de um outro importantíssimo grupo de cansados do Brasil pós 2003. Se a tradicional elite continua enriquecendo deste jeito - e fazendo manifestações tão fraquinhas e pouco representativas deles mesmos -, se a oposição política dos representantes burgueses não consegue apresentar um alternativa político-programática efetivamente de oposição (ou seja, realmente divergente do governo), é porque a prática concreta deste governo e do seu principal partido, o PT, também é a dos cansados.

Se esta elite, em pouco mais de um mandato petista, já está cansada da situação de oposição, a elite petista também se cansou logo que se acomodou nas poltronas governamentais.

Assim, sob o lema “deixa o homem trabalhar”, o PT já entrou bastante cansado no seu segundo mandato presidencial. Cansado de socialismo, cansado de lutar contra o capitalismo, cansado de combater o imperialismo, cansado de enfrentar o neoliberalismo, cansado de agitação, cansado de greve, cansado de ocupações, cansado de reforma agrária, cansado...

É neste quadro que também que será realizado o III Congresso do PT, que deverá reforçar ainda mais o velho e cansado Campo Majoritário do partido, seja qual for o nome que passe a usar, e deixar numa situação ainda mais isolada o que restou da antiga esquerda partidária - que ainda se declara esquerda, mas cada dia está mais complacente e resignada com o cansaço estratégico geral do seu partido.

 

 

Jorge Almeida é professor de Ciência Política e doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas (UFBA). Autor de "Como vota o brasileiro" e de "Marketing político, hegemonia e contra-hegemonia".

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