Correio da Cidadania

A esculhambação da República tupiniquim

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Waldemar Rossi

25/06/2009

Nem o mais pessimista dos brasileiros poderia esperar que nosso país chegasse a tal ponto no "fundo do poço" da esculhambação nacional. Porque não se trata de alguns setores da vida pública que estão degenerados. Trata-se dos Poderes da República. E a opinião pública vai ficando estarrecida, embora passiva, diante de tanta bandalheira, de tanta corrupção, de tamanho cinismo dos "homens públicos" deste país. Já são tantas as denúncias e comprovações de pilhagem do dinheiro público e das picaretagens praticadas por parte de parlamentares, ministros, do próprio presidente e de magistrados que vai se tornando rotina e passando a ser considerado - por muita gente - como coisa natural da política.

Felizmente há ainda parcela da população que a cada dia fica mais indignada, gente que vai se revoltando com as sacanagens com o caradurismo dos "representantes do povo". Porém, essa indignação ainda não se transformou em protesto público. E não se transformou em protesto porque parcela do movimento social organizado está "mamando nas tetas do governo federal", fazendo vistas grossas às suas falcatruas, e seus representantes nos escalões do governo se beneficiando da situação.

Se não bastassem as denúncias e comprovação dos crimes do "mensalão", isto é, da compra de votos dos parlamentares pelo governo federal através dos seus porta-vozes; se não bastassem as denúncias da "operação sanguessuga" que envolveu centenas de parlamentares e outros cidadãos em falcatrua com o a compra e doação de ambulâncias e com o dinheiro da saúde pública; se não bastassem as denúncias de envolvimento da quase totalidade dos políticos eleitos com dinheiro sujo das grandes empresas – muitas delas envolvidas em grossos escândalos de corrupção em contratos de obras públicas e fornecimento de material às instâncias governamentais -, ainda temos que ver o uso do nosso dinheiro (também chamado de "dinheiro público") para apadrinhamento de parentes e amigos de parlamentares e ministros, com altíssimos salários e sem prestação de serviços. E tudo feito de modo secreto! "Na calada da noite", como se diz vulgarmente. Tem ainda a vergonha das horas extras pagas para funcionários do Congresso Nacional, também de forma secreta, em pleno recesso, sem os devidos trabalhos extraordinários prestados.

E ainda somos forçados a ouvir do presidente da República que tudo isso é denuncismo, querendo jogar a culpa em cima do Ministério Público, em cima de cidadãos investidos em obrigação constitucional de vasculhar, de fiscalizar a prática dos "homens públicos", que têm a responsabilidade também ética de acompanhar a ação administrativa dos governantes, e defender o respeito à ética e aos direitos dos cidadãos. Causou espanto, portanto, que Lula, no mesmo dia em que o presidente do Senado, José Sarney, publicamente reconheceu que cometeu irregularidades graves – mas afirmando que não estava sozinho nesta prática –, venha a defendê-lo pela imprensa internacional, tentando fazer-nos crer que tudo é invencionice, coisa de gente irresponsável. Tenta com isto livrar sua própria responsabilidade em todo esse imbróglio, porque Sarney foi escolhido por ele, Lula, como homem de sua confiança no Senado.

Lula foi além ao dizer que a "mídia prefere desgraça". Não defendo a mídia, quase toda voltada para os interesses do capital predador. Porém, quero perguntar: o que é desgraça para o Lula? O fato de as denúncias chegarem ao conhecimento do povo que o elegeu, mostrando toda a podridão que assola os Três Poderes, e com isto denegrir os "homens públicos", incluindo-o? Ou a desgraça é o povo saber que toda essa bandalheira é feita com dinheiro que deveria ser aplicado em saúde pública ao alcance de todos, em educação com qualidade para todos, em moradias populares decentes, em sistema de transporte ferroviário nacional, em defesa do meio ambiente e na tão prometida, embora sempre sonegada, reforma agrária?

Por falar em reforma agrária e meio ambiente, ainda tivemos que ouvir outra pérola do presidente: quem derruba árvores (no desmatamento da Amazônia) não é bandido! Deveríamos então fazer mais uma pergunta ao nosso presidente: Se tudo isso que vem acontecendo você defende e afirma que não é crime, então o que é banditismo para você? De que lado você está?

A esculhambação da República brasileira chegou a tal ponto que deveria mexer com a consciência de todos que se dizem cidadãos conscientes e defensores da ética na política, defensores das igualdades sociais, defensores da justiça social. Caso contrário, os que continuarem calados estarão sendo coniventes, corresponsáveis pela baderna que aqui vigora, corresponsáveis pelo crescimento das injustiças que nos levam para a barbárie.

Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.

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