Correio da Cidadania

Sobre as descobertas atuais da Petrobrás

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Ibama renova licença da Petrobras para perfuração na bacia Potiguar —  Agência Gov

A margem equatorial tem sido explorada pela mídia que muitas vezes traz a notícia e desinforma ao mesmo tempo. Numa cronologia curta, a primeira descoberta desse play pós-sal, em águas profundas, foi feita em Sergipe e não em Suriname, e não foi desenvolvida em Sergipe, como é em Suriname, por conta da concorrência interna dos projetos daqui, com os do pré-sal. Urge acelerar as descobertas e continuidades das descobertas com pesquisa exploratória e começar a produção de gás cada vez mais adiada.

O que é a margem equatorial em termos de petróleo? Trata-se de nova fronteira exploratória em águas profundas, que os geólogos chamam de rifte (rasgo na litosfera terrestre) novo, de idade geológica Albiana. Diferente dos riftes emersos como os que formam as Bacias Potiguar, Sergipe-Alagoas, Recôncavo-Tucano etc., os riftes novos recebem rochas erodidas dos riftes antigos nas bacias mais profundas, que existem em todo piso oceânico que margeia todo litoral brasileiro.

Toda bacia sedimentar, como os dedos das nossas mãos, tem diferentes digitais em termos arquiteturais, fisiográficas e posicionais dentro das placas tectônicas que o abrigam com as suas consequências em termos de geração de petróleo (temperatura, duto natural etc.).

Para se ter sedimentos da terra no mar é preciso que se observe as passagens dos mesmos, continuidades e descontinuidades da terra para o mar. Isso, dutos, estão expressos pelos rios atuais e os antigos. Mapeá-los é tarefa dos geocientistas que analisam afloramento de rochas em imagens sísmicas contínuas. Como vemos dos aviões todos os aspectos fisiográficos e o relevo atual, com a sísmica visualizamos as imagens de como era no passado.

Exemplificaremos com o relevo atual do majestoso Rio Amazonas. Ele nasce nos Andes e desemboca no Oceano Atlântico após longa trajetória. Suas edificações naturais formam a Ilha de Marajó e penetram mar adentro por cerca de 200 km, pontuando o fundo do mar com sedimentos de canais lodosos ou arenosos. Estes também, no mar, são distribuídos costa afora ao longo das margens, segundo as correntes marítimas dominantes auxiliadas pela Força inercial de Coriolis (centrífuga) que define a direção da corrente, no caso nordeste em direção às Guianas e Suriname. Assim se distribuem os sedimentos (geradores e reservatórios) ao longo da costa. A quantidade de sedimentos no mar e a sua distribuição dependem da potência do rio.

Por que tal longo preâmbulo? Para explicar os diferentes plays petrolíferos ao longo da margem equatorial, que se estende de Pernambuco até a Venezuela. A Petrobrás anunciou recentemente duas descobertas nas costas do Rio Grande do Norte, no início da margem equatorial. Como o Rio Amazonas jamais chegou em RN, é lógico que as deposições e as distribuições decorrentes nada têm a ver com ele. Elas são produtos de rios (dutos naturais) locais em fisiografia absolutamente diferente da foz amazônica, pois em PE e RN há muito vulcanismo novo, que define os compartimentos do piso oceânico.

De positivo, as descobertas no RN foram feitas em reservatórios de idade Albiana, quase desconhecidos com registros em PE e PB, mas já constatados nas bacias RN e AL. Isso é muito bom, mas as descobertas, para serem comerciais em contexto de águas profundas e de capital intensivo (elevado CAPEX – despesa de capital), ainda dependem do volume de hidrocarbonetos descobertos, que, pela elevada compartimentação da Bacia, tem probabilidade de serem menores que em Sergipe e no Suriname-Guiana. Se comerciais, ótimo. Se não, poderão ainda subir de ranking se muitos dos mesmos forem descobertos e posteriormente produzidos como aglomerações (clusters), caso tenham Estudo de Viabilidade Técnica e Econômica favorável. Muito ainda a fazer.

Focando mais ao norte, a Foz do Amazonas e toda a costa lamosa do Amapá e Guiana francesa nada tem a ver com a do Suriname-Guiana. São compartimentos absolutamente diferentes com rios, fisiografias e cargas etc., diferentes. Têm em comum apenas a idade geológica de formação e os desinformados, incautos em geologia e em tudo chamam de mesma coisa e de mesma potencialidade. Não têm!

Isso não significa que não há óleo, mas, por enquanto, são apenas recursos contingentes e é irresponsável tratá-los como novo pré-sal, pois são apenas óleo virtual e recursos contingentes em linguagem formal e adequada.

Alguns poços perfurados na foz não apresentaram bons resultados. Alguns produziram água doce e gás com pressão anomalamente elevada, consequente da carga sedimentar aposta pelo Rio Amazonas no leito da bacia. Perfurar mais a norte como está sendo proposto é salutar, e pode resultar em grandes descobertas como mostrado pelas boas imagens geradas pelos atributos sísmicos e discriminadas pelo aprendizado de máquina (learning machine) e inteligência artificial.

Ressalto, entretanto, que o mesmo fluxo de trabalho foi usado pela Exxon nas adjacências das descobertas de Sergipe resultando na descoberta de água. Como dizem os gringos se entra lixo, sai lixo (garbage in, garbage out) no caso, discriminação errada do fluido.

Também é salutar falar que existem prospectos com plays semelhantes de mesmos potenciais nas costas do PA, MA, CE, AL (nas adjacências profundas do campo de Mero), norte de SE, na BA (bacias Jacuípe, Camamu-Almada e Jequitinhonha com grandes potenciais) com o litoral mais extenso do Brasil, no ES com perfuração em andamento, idem nas águas ultraprofundas de RJ, SP e, muito especialmente, na bacia de Pelotas, onde a Petrobrás adquiriu áreas no último leilão. Esta tem potencial e assinatura geológica semelhantes às das grandes descobertas na Bacia de Orange, Namíbia, em nova e excelente fronteira exploratória.

Muito a fazer e na minha opinião, apesar do planejamento Petrobrás estar bem proposto, faltam mais assinaturas de geocientistas com espírito desbravador tipo Guilherme Estrella, para definir as reais prioridades na busca de maiores números na relação reserva vs. produção.

Certamente as independentes, com os bons potenciais disponíveis nas adjacências das descobertas, pouco investirão nas fronteiras, como ocorreu no passado. Foi melhor comprar o Campo de Bacalhau e outros, vendas deletérias e absolutamente irresponsáveis. Não me conformo até hoje.

Sobre o papel do Ibama, em algumas audiências públicas que ouvi, foi notória a predominância de corrente contra o uso dos combustíveis fósseis. Também ecologista, lembro aos colegas que não existe desenvolvimento sem danos ao meio ambiente desde a revolução agrícola que acabou com a diversidade em nome do combate à fome. Se o dano é inevitável, é fundamental que o mitiguemos com tecnologia, sem argumentações falsas ou não comprovadas cientificamente.

Luciano Seixas Chagas é geólogo e consultor.

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