Correio da Cidadania

Na pandemia ou não, despejos nunca mais!

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Coluna | Pelo despejo zero na pandemia | Brasil de Fato
O advogado Leandro Gaspar Scalabrin, representante do Observatório de Direitos Humanos (ODH) do Poder Judiciário, apresentou aos ministros do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) alguns dados do relatório sobre o Direito à Moradia, produzido pela Entidade em junho de 2020.

Scalabrin explicou: “durante a pandemia (somente até junho de 2020) já ocorreram 79 despejos. Nesses, 9 mil famílias foram colocadas em situação de desabrigo. Atualmente (sempre em junho de 2020), 64 mil famílias estão ameaçadas de despejo no Brasil”.

Diante de novas liminares de despejo coletivo - “reintegração de posse” - nas Ocupações urbanas e nos Acampamentos rurais, a CNBB propôs que o Conselho Nacional de Justiça, “no âmbito de suas competências, recomende providências aos órgãos do Poder Judiciário no sentido de suspender o cumprimento de mandados coletivos de desocupações de imóveis urbanos e/ou rurais até a ocorrência efetiva de imunização social, por meio de vacina e/ou remédio, da população brasileira, especialmente daquelas pessoas mais vulneráveis e atingidas pelas ordens de despejos coletivos”.

Atendendo a proposta da CNBB - apresentada ao Poder Judiciário através do Observatório dos Direitos Humanos (ODH) - o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no dia 23 de fevereiro passado, em sua 325ª Sessão Ordinária, aprovou uma resolução recomendando ao Judiciário que não autorize ações de despejo coletivo durante a pandemia da Covid-19.
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Neste contexto de pandemia - por serem os despejos coletivos de uma perversidade e crueldade diabólicas - a resolução do CNJ representa, sem dúvida, uma grande vitória para todos e todas que lutam pelo direito a terra de trabalho e à moradia digna.

Esperamos que - terminada, se Deus quiser, a pandemia - a CNBB dê mais um passo à frente e declare profeticamente, de maneira clara e inequívoca, que todo despejo coletivo (o que comumente acontece, mas vale também para o despejo de uma só família ou pessoa) é sempre - em qualquer situação - injusto: desumano, antiético e anticristão.

O Evangelho de Jesus de Nazaré não deixa margem para meias verdades, comportamentos diplomáticos e acordos parciais. “Que o sim de vocês seja sim, e o não seja não. O que passa disso vem do Maligno” (Mt 5,37).

“Despejo” - chamado hipócrita e legalmente de “desocupação” ou “reintegração de posse” - é uma palavra que se usa somente para falar de “lixo”. Até quando se fala de objetos - melhor tratados que as pessoas - usa-se sempre a palavra “remoção” ou “descarga” (dependendo do caso) e não “despejo”
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Do ponto de vista da justiça - o ponto de vista humano, ético e cristão - só é permitida a remoção com dignidade de famílias de suas moradias em Ocupações urbanas ou Acampamentos rurais em dois casos: quando a terra ocupada é de utilidade pública ou de preservação ambiental e - mesmo nesses casos - só depois que estiverem prontas outras moradias para receberem as famílias.

A propriedade particular não é um direito absoluto, mas deve ter uma função social e, por motivo de utilidade pública, o governo (municipal, estadual e federal) - se necessário - pode sempre recorrer à desapropriação.

As terras abandonadas para fins de especulação imobiliária (como é comum acontecer nas grandes cidades), as terras de latifúndios improdutivos, as terras com monoculturas que destroem a natureza e visam unicamente à exportação e o lucro e as terras com trabalho escravo, devem ser destinadas pelo governo (municipal, estadual e federal) - avaliando a necessidade ou não da desapropriação - à implantação de projetos de moradia popular (na cidade) ou de reforma agrária popular (no campo).

Terra, Teto (Moradia) e Trabalho (os três T) - lembra-nos o Papa Francisco - são Direitos Humanos fundamentais de todos e de todas.

Frei Marcos Sassatelli é frade dominicano e teólogo.

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