Correio da Cidadania

Trump cada vez mais encrencado

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Dia após dia, surgem fatos novos que tornam cada vez mais justificado o impeachment do presidente Donald Trump.

A denúncia anônima de oficial de inteligência, acusando The Donald de ter num telefonema pressionado o presidente da Ucrânia a investigar supostas maracutaias de Joe Biden, seu provável adversário nas eleições presidenciais, chocou a nação. Ficou óbvio o objetivo de prejudicar eleitoralmente o democrata.

Até mesmo o Partido Republicano sentiu o golpe. De imediato, três senadores, um governador e diversos representantes republicanos demonstraram preocupação e alguns até repulsa ao mau comportamento presidencial.

Por seu lado, Trump menosprezou a denúncia. Ridicularizou o denunciante, chamando-o de “quase um espião”. “Vocês sabem o que nós costumávamos fazer nos velhos tempos, quando éramos espertos?”, perguntou o presidente. “Nós costumávamos tratá-lo de um modo diferente do que se faz hoje”.

Não especificou qual o tratamento aplicado nos “velhos tempos”. Durante a guerra mundial, era a forca. Já os “espertos” da máfia preferiam prender os pés dos espiões em blocos de cimento e atirá-los no rio Hudson.

Indiferente a essas reflexões históricas, os parlamentares democratas e a imprensa exigiram a publicação do texto da conversa telefônica denunciada.

Forçada por esse ruído que já contaminava a opinião pública, Trump entregou à comissão de inquérito da Casa dos Representantes, não uma transcrição fiel das palavras dele e do seu interlocutor. Apenas um resumo elaborado pelo pessoal da Casa Branca.

Não dá para acreditar que funcionários do presidente tivessem mantido os trechos mais desconfortáveis do diálogo com Zelensky, o mandatário ucraniano. No entanto, os fatos contidos no resumo já eram suficientes para caracterizar infrações graves.

Ficava claro que The Donald solicitara a Zelensky que investigasse a influência de Biden, em 2014 (quando vice de Obama), na demissão do procurador-chefe ucraniano, um duro crítico da empresa Burisma, na qual um filho do ex-vice-presidente integrava a diretoria.

O problema é que as eventuais maracutaias de Biden na Ucrânia não eram da conta dos EUA, eram questões particulares do país onde teriam sido cometidas.

A ingerência de Donald Trump foi, assim, um desrespeito à soberania de uma nação estrangeira. Muito chato para os EUA, que já foram presididos por figuras como George Washington, Abraham Lincoln e Franklin Roosevelt.

Esclareça-se que há razões para supor que Biden agira corretamente, embora também existam alguns fatos incômodos, que ainda precisam ser explicados.

Mesmo que jamais o sejam, nada têm a ver com as diabruras de Donald Trump. Para o direito norte-americano é inaceitável que um presidente use seu cargo para forçar o presidente de um país amigo a agir em benefício da vontade do morador da Casa Branca de prejudicar um possível adversário na próxima eleição.

Tem mais

The Donald esqueceu seu América, first por um Trump, first. A denúncia original contém mais alguns fatos graves não mencionados pelo resumo made in Casa Branca.

Ela fora entregue ao chefe do denunciante que levou a seu superior, o diretor nacional de inteligência, Joseph Maguire. Depondo no Congresso, Maguire disse que bloqueou seu envio ao Congresso, como seria o estabelecido por lei, e o arquivou no mais inacessível sistema, somente uado para os casos particularmente sensíveis à segurança nacional. Justificou-se: “era absolutamente sem precedentes”.

Não deixava de ser, como a denúncia fartou-se de comprovar. Uma semana antes do telefonema fatal, Trump mandou suspender uma doação de 400 milhões de dólares em armas para o exército ucraniano.

Preocupado com esta decisão, Zelensky deve ter percebido que Trump falava sério ao pedir (oito vezes, segundo o Wall Street Journal) que o ucraniano o ajudasse a colocar o adversário Biden numa fria.

Parece que ele deve ter sido efusivo ao aceitar as pretensões do colega estadunidense. Alguns tempo depois da conversa, o governo de Washington mandou liberar os 400 milhões retidos.

Trump explicou a razão da suspensão inicial, através de várias versões diferentes:

– ficou na dúvida se a ajuda seria vantajosa para os EUA;
– denúncias adicionais de corrupção na Ucrânia o levaram a achar que o novo governo talvez não merecesse a doação;
– foi uma reação de irritação devido à escassa contribuição alemã à Ucrânia.

Essa desorientação sugere que nada disso é verdade, o verdadeiro propósito da decisão deve ter sido outro.

Narramos a seguir fatos que poderiam deslindar o mistério. Segundo o denunciante, The Donald disse para Zelensky reunir-se com seu advogado pessoal, Rudy Giuliani, e o procurador geral dos EUA, Willian Barr, para levantarem pecados de Biden.

Satisfeito com a pronta adesão do ucraniano, Trump lhe informou: “Vou mandar o sr. Giuliani lhe telefonar e também teremos na reunião o procurador geral Barr e assim iremos até o fim nesta questão (o affair Biden)”.

Talvez diante da boa vontade de Zelensky, o presidente norte-americano lhe assegurou auspiciosas retribuições: “a sua economia vai ficar cada vez melhor, eu predigo”. Os 400 milhões de dólares em breve estariam nas mãos ucranianas para ninguém em Kiev continuar com uma pulga atrás da orelha.

Note-se que neste episódio aconteceu mais uma infração: o presidente republicano pôs seu procurador-geral (pago pelos contribuintes) para prestar serviço num assunto do interesse não dos EUA, mas somente dele.

Mais uma vez o ideológico, America, first foi substituído pelo egocêntrico Trump, first.

A trama

Essa constatação foi reforçada decisivamente pelas revelações de Kurt Volker, enviado especial do governo dos EUA à Ucrânia.

Volker demitiu-se pouco depois da publicação da denúncia anônima. Em depoimento à comissão de inquérito da Casa dos Representantes, ele entregou dezenas de mensagens de texto altamente inconvenientes para Trump.

Por ordem do presidente, ele se unira a dois outros diplomatas: Gordon Sondland, embaixador em Kiev, credenciado por vastas doações à campanha presidencial, e William Taylor, representante dos EUA na União Europeia - da qual, aliás, a Ucrânia não faz parte.

Este grupo recebeu ordens do chefe para auxiliar seu advogado Rudy Giulliani, escalado para conseguir provas da suposta corrupção do ex-vice de Barack Obama.

Estava planejada uma visita do presidente ucraniano à Casa Branca, com o objetivo de apresentar ao governo norte-americano uma série de importantes reivindicações do seu país.

De acordo com as trocas de mensagens entre os três diplomatas, eles deixaram claro a Yermak, representante de Zelensky, que a viagem do presidente só teria êxito se ele investigasse possíveis sujeiras do pré-candidato democrata em benefício da Burisma, empresa que contratara o filho, Hunter, para fazer lobby nos EUA.

Em 4 de outubro, The Donald contribuiu para piorar sua situação no processo do impeachment, ao solicitar à China, publicamente, que também investigasse as ações de Biden e filho.

Sequelas

Diante de uma corrente, que ameaça tornar-se avalanche, The Donald vem reagindo de forma, digamos, tosca.

Garante que o telefonema fora “perfeito”. Que os democratas estavam promovendo uma “caça às bruxas”. Que eles queriam um golpe de Estado.
Que tirar Tump do governo poderia dividir a nação como na Guerra Civil (de 1860-1864). Que as alegações contra ele não passavam de “merda”. Que o democrata Adam Shift, presidente de um dos comitês de investigação, devia, ora ser expulso da Casa dos Representantes, ora ser preso.

Nada que justificasse seus atos altamente discutíveis, que podem levar ao impeachment.

E o que é pior, ele parece desesperado, recentemente afirmou que não queria pressionar Zelensky, mas Perry, seu secretário de Energia, insistiu e ele acabou cedendo. Aí, deu no que deu.

Perry não engoliu, apressou-se a declarar que aconselhara o presidente a apenas discutir questões energéticas com Zelensky, jamais disse que o ucraniano deveria ser apertado contra a parede.

A coisa fica feia quando o chefão joga as culpas das suas falhas para cima dos subordinados.

Como informa o The Hill de 8 de outubro, o Partido Republicano sente-se acuado.

Alguns dos seus membros ainda defendem seu chefe, outros deploram quando não criticam seu procedimento pouco aceitável.

A maioria está em silêncio, teme pelo pior, por novas surpresas assustadoras.

Esta visão negativa é ratificada pelas pesquisas sobre a posição do povo. Em 27 de setembro, o NPR-PBS News Hour-Marist apontava a vitória da aprovação do impeachment por 49 versus 46.

Em 1 de outubro, a Monmouth University apurou que 53% dos norte-americanos desaprovavam a performance do presidente, enquanto apenas 41% a consideravam ok.

E, numa prova de que o sentimento pró-impeachment vem crescendo rápido, pesquisa USA Today/Ipsos revelava que a diferença entre aqueles que aprovam e os que desaprovavam evoluíra para 8%.

E deve acelerar ainda mais, pois Andrew Bakaj, advogado do denunciante anônimo, tuitou em 7 de outubro que seu cliente irá depor em breve. E foi além: afirmou que representava diversos oficiais de inteligência dispostos a contar o que sabiam sobre o caso.

Como é sabido, o impeachment deve passar na Casa dos Representantes, onde a oposição democrata tem maioria. Para ser promulgado é necessário também o voto favorável do Senado, dominado pelos republicanos. Normalmente, eles deverão dar o contra. E o feliz esposo da maravilhosa Melanie poderia continuar bravateando na Casa Branca.

Há quem admita o contrário. Argumenta-se que, havendo uma enorme massa de estadunidenses radicalmente a favor do castigo ao presidente, seus adeptos irão roer a corda, deixar o chefe na mão. Dar uma banana para o clamor popular é perigoso e eles precisam pensar nas suas carreiras políticas.

Possível, mas improvável. Mesmo escapando do impeachment, The Donald poderá sair irreparavelmente manchado e se tornar um outsider nas próximas eleições presidenciais.

A investigação do impeachment está andando com uma velocidade fora do comum.

A discussão final deverá começar ainda antes do fim do ano. No começo da estação fria que, para o presidente, poderá marcar o inverno de sua desesperança.

Luiz Eça

Começou sua vida profissional como jornalista e redator de propaganda. Escreve sobre política internacional.

Luiz Eça
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