O auxílio-alimentação dos juízes do Rio

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Frei Marcos
22/11/2012

 

Que pena! Os juízes do Rio (e, quem sabe, de outros estados também) estão passando fome. Precisam de auxílio-alimentação. Que tal cadastrá-los numa instituição beneficente para receber, no início de cada mês, uma cesta básica ou incluí-los no programa Bolsa-Família do governo federal?

 

Ironias à parte, o descaramento dos juízes é tão despudorado, que - parece - perderam o senso do ridículo. Eles deveriam pelo menos ter o cuidado de não usar as palavras auxílio-alimentação. É uma afronta aos trabalhadores(as) que ganham o salário mínimo e, sobretudo, a todos aqueles(as) que – empobrecidos, marginalizados e excluídos de nossa sociedade hipócrita – passam fome no Brasil, na América Latina e no mundo.

 

Reparem: “O salário médio de um desembargador no Rio, incluindo benefícios, é de R$ 42,8 mil” (Folha de S. Paulo, 05/11/12, p. A8). Que salário de fome!

 

Apesar disso, “o Tribunal de Justiça do Rio pagará, até julho de 2013, cerca de R$ 51 milhões a seus 848 magistrados a título de auxílio-alimentação. Cada um deles receberá R$ 60 mil, em 12 parcelas. O valor representa o pagamento retroativo do auxílio, desde 2004. A primeira parcela do benefício foi paga em julho. A decisão foi tomada pelo presidente do TJ, o desembargador Manoel Alberto Rebelo” (Ib.).

 

O desembargador Cláudio Dell’Orto, da Associação dos Magistrados do Estado do Rio, diz “que o pagamento retroativo deveria ser feito desde 1993, e não de 2004” (Ib.). O auxílio-alimentação beneficiou primeiro os juízes federais e, depois, foi estendido aos judiciários estaduais.

 

As associações de classe defendem o pagamento do auxílio-alimentação. Nelson Calandra, presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), afirma: “Estamos sem aumento há sete anos, o que representa uma perda salarial para a magistratura da ordem de 30%. Se tivéssemos essa reposição, até poderíamos abrir mão desses benefícios” (Ib.). Coitados dos Magistrados! Dá até dó!

 

Pessoalmente, não quero nem saber se o auxílio-alimentação dos juízes é legal ou não. Se existem leis (ou normas) que permitem tamanha falcatrua, elas são injustas. A questão, antes de ser jurídica, é humana e ética. A corrupção pública – mesmo (e, diria, sobretudo) quando institucionalizada – continua sendo corrupção.

 

Como podem esses juízes, que só pensam em seus interesses, julgar os outros e promover a justiça? Não têm nenhuma moral para fazer isso.

 

Vejam o que o desembargador Cláudio Dell’Orto diz a respeito do auxílio-alimentação: “É uma medida administrativa que funciona como política de pessoal, de estímulo à carreira de juiz. Ajuda a termos uma magistratura mais qualificada” (Ib.). Será que o dinheiro qualifica as pessoas? Não dá para entender como, em pleno século XXI, exista tanta maracutaia e tanto atraso cultural?

 

Apareceu, por fim, uma pequena luz, que é motivo de esperança. “O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estende aos magistrados vantagens funcionais pagas aos integrantes do Ministério Público Federal, entre elas o auxílio-alimentação” (http://oglobo.globo.com/pais/oab-questiona-no-stf-auxilio-alimentacao-magistrados-5597927).

 

Diante da realidade apresentada, não podemos ficar calados. Seria um pecado de omissão. Precisamos nos unir, nos organizar e lutar para mudar essa situação de injustiça estrutural (legalizada), que é um “sistema econômico iníquo” (Documento de Aparecida - DA, 385) e clama diante de Deus. Um ouro mundo é possível e necessário!

 

Frei Marcos Sassatelli, frade dominicano, é doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP). E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

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