Estradas assassinas de um progresso vampiro

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Egon Dionísio Heck
06/07/2012

 

O sangue Kaiowá-Guarani continua manchando o chão e o asfalto no Mato Grosso do Sul. Na semana passada foram três atropelamentos, com a morte de Aguinaldo e Wagner, estando Zezinho, liderança do acampamento Laranjeira Nhanderu, município de Rio Brilhante, na UTI em Dourados, em estado gravíssimo.

 

Tudo isso em conseqüência do atropelamento dos direitos desses povos, que por não terem suas terras demarcadas são jogados para a beira das estradas, onde sobrevivem em situações desumanas, submetidos aos constantes riscos de atropelamentos.

 

Damiana do Apyka'i - Plantando cruzes

 

Damiana, guerreira Kaiowá-Guarani do tekohá Apyka'i, município de Dourados-MS é o símbolo desse sofrimento e resistência. Teve seu marido Hilário morto por atropelamento e neste último ano três filhos tiveram a mesma sina, morte por atropelamento.

 

Ir. Elisa, que trabalhou com os Kaiowá-Guarani, na equipe do Cimi Dourados, relatou a tragédia:

 

"Agnaldo Cari de Souza, filho de Damiana, foi atropelado por funcionário da Usina que estava de moto (segundo Damiana) e morreu na estrada, a 100 metros do acampamento. Enterrado ao lado de seu irmão Sidnei que morreu atropelado no ano passado na mesma rodovia. Segundo Damiana este funcionário teria jogado Diesel no barraco de Agnaldo dias antes do atropelamento.

 

Uma semana depois, seu outro filho, Wagner Freitas, é também atropelado e morre na hora. Foi enterrado em 25 de junho, junto ao corpo de Sidnei e Agnaldo.

Veias abertas no Mato Grosso do Sul

 

Historicamente as estradas foram os caminhos das invasões dos territórios indígenas, os caminhos da morte e escravidão. Foram picadas, por entre a mata, que se transformaram em precários caminhos de caminhões que saquearam a madeira, depois se transformaram em estradas asfaltadas e se consolidaram como rodovias que cortam esse país em todas as direções, como veias abertas de vidas sacrificadas por um desenvolvimento que se alimenta de sangue de tantas vidas, num processo de progresso vampiro.

 

No Mato Grosso do Sul essa situação vem se agravando com o avanço célere do grande capital, na plantação de imensos canaviais para a produção de etanol e açúcar.

 

Guerreiro Zezinho, incansável lutador pelos direitos do povo Kaiowá-Guarani, representante dos acampamentos indígenas no Conselho da Aty Guasu, teu povo, tua comunidade de Laranjeira Nhanderu e seus amigos no país e no mundo estão contigo neste momento difícil, de dor e sofrimento. Que Nhandejara te conserve a vida.

 

Zezinho acabara de voltar do Rio de Janeiro, onde juntamente com mais de uma centena de representantes indígenas do Mato Grosso do Sul participou do Acampamento Terra Livre, na Cúpula dos Povos. Denunciaram em vários espaços a dramática situação dos povos indígenas, especialmente os acampados à beira da estrada. Ele acaba sendo mais uma das vítimas das dezenas de mortes por atropelamento que acontecem todo ano no Mato Grosso do Sul. Conforme o Relatório de Violência – Cimi 2011, das 12 mortes por atropelamento registradas, oito ocorreram naquele estado. Só da comunidade de Laranjeira Nhanderu, nesses anos em que estão acampados, três pessoas mortas por atropelamento.

 

Conforme denúncias dos Kaiowá-Guarani, nas Aty Guasu, "os indígenas são mortos nas estradas que nem cachorro, que se mata e fica aí jogado". Isso em função da impunidade total em que ficam os responsáveis por essas mortes. Em geral os causadores fogem sem prestar socorro e nunca sequer são identificados.

 

Zezinho tem acompanhado com muita garra e indignação as lutas de retomada de várias comunidades, como Kurussu Ambá, Ypo'í e Guaiviry, dentre outras. Essas comunidades continuam lutando por suas terras. Elas esperam, como o povo Kaiowá, continuar contando com a presença e apoio do grande líder José de Almeida Barbosa, carinhosamente conhecido como Zezinho.

 

Povo Guarani, Grande Povo!


Egon Heck é assessor do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) no Mato Grosso do Sul.

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