Asneiras brasileiras

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Yakuy Tupinambá
28/08/2008

 

Alguém em sã consciência pode nos ajudar a encontrar um adjetivo que possa qualificar os despautérios que temos a infelicidade de ler, ou ouvir, através da imprensa escrita ou falada, que são protagonizados ultimamente pelos políticos, juristas, fazendeiros, alguns militares das forças armadas e anti-indígenas quando falam da questão em relação à reserva Raposa Serra do Sol, que concomitantemente atinge todas às reservas indígenas?

 

Continuam demonstrando, além da ignorância que lhes é peculiar, um comportamento etnocida, xenofóbico e egocentrista. Faz-nos pensar - atitude inexistente na vida deles - assim como acreditamos que também pensam os integrantes do Instituto Social Ambiental, o Conselho Indigenista Missionário, a COIAB, THYDÊWÁ, a Associação Brasileira de Antropologia, e muitos outros organismos que defendem os povos indígenas: será que ainda existe a possibilidade do homem tornar-se algo puro, sem males?

 

Insistem em nos ver como "índios", ou seja, nada parecido com algo humano, ainda continuam nos vendo como a igreja católica nos viu e declarou que não existia alma em nossos corpos, portanto "bichos", deixando subentendido que podiam eliminar a todos, que não estariam cometendo "pecado". Foi dito há séculos e ainda continuamos estigmatizados por uma corja de malfeitores assassinos, que servem unicamente para destruir a dignidade humana.

 

Falam de unificar o Brasil, falam de soberania nacional, falam de economia, de produção de alimentos. Perguntamos que unificação se pretende, se hostilizam os nordestinos, os negros e os pobres? Alguém nos responda, como se chama o comportamento expressado pelos paulistanos em relação aos nordestinos, ou dos gaúchos em relação aos paraenses, o tratamento desigual em relação aos indígenas. Mas, indígenas não são nem gente para a sociedade e até mesmo para os pobres brancos. No Brasil nunca existiu o apartheid ou é cultura brasileira?

 

E qual economia, e produção de alimentos estão falando, se este é o país da miséria, do assistencialismo, se o que se produz aqui é para abastecer os silos internacionais? O nacionalismo é o refúgio último dos desinformados. Para ser contra os indígenas, o Brasil é um só, tem de se uniformizar. Engraçado, não é esse o discurso que se escuta de São Paulo em relação ao Nordeste, ou do Rio Grande do Sul em relação ao Pará; de repente, tem que unificar a pátria das chuteiras - porque o nacionalismo brasileiro é a pátria das chuteiras, é o Brasil na Copa, é o futebol. Mas, peraí, futebol é inglês e carnaval é veneziano, logo, se futebol é da Inglaterra e carnaval é de Veneza, que diabos é cultura brasileira afinal?!

 

O Brasil é um país que não conseguiu encontrar a si mesmo, nega suas raízes sem ao menos conhecê-las, as pessoas insistem em permanecer com os olhos voltados para Europa. Comem farinha, feijão, milho, amendoim; bebem tacacá e usam perfume da Natura; as cidades chamam Camaçari, Coaraçi, Camacã e as pessoas têm nomes como Maíra, Iara, Jacira.

 

O que nos deixa estupefatos é perceber que boa parte dos jornalistas brasileiros são completamente analfabetos no que diz respeito à questão indígena no Brasil, não conhecem a legislação, não conhecem história, e muito menos a cultura que está presente no dia-a-dia deles.

 

Ainda somos obrigados a ler declarações como essa citada em página de um jornal bastante conhecido: "Índio vai virar guarda-mato sem salário se vencer no STF", diz o chefe dos arrozeiros, entre tantas outras tolices, como comparar a quantidade de indígenas em uma reserva pela quantidade de votos.

 

Diante do quadro que vivemos, só nos resta esperar que a guerra estabelecida contra nós indígenas desde o dia em que aqui chegaram invadindo nosso solo sagrado, tomando tudo que era nosso e nos matando, seja de fato declarada, pois assim acabam consumando o extermínio de uma única vez. Já que suas leis não são cumpridas, nossas vidas não são valorizadas, o que ainda estão aguardando?

 

Yakuy Tupinambá (Irmã do Mundo).

 

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Publicado originalmente em Índios Online.

 

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