O caráter individualista e pouco solidário do brasileiro

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Dejalma Cremonese
27/11/2007

 

 

O Informe do Latinobarômetro 2007, estudo realizado em 18 países da América Latina, demonstrou que, entre 2003 e 2007, o desempenho econômico e social dos latino-americanos tem melhorado nos últimos 25 anos. Houve uma redução da pobreza, diminuição do desemprego, melhor distribuição de renda, redução da inflação e um aumento no nível de consumo da população. Por outro lado, os percentuais ligados à dimensão da solidariedade têm piorado. O estudo demonstra que, ao examinar as atitudes individuais efetivamente da região, ela se situa como pouco solidária e individualista (as pessoas têm-se ocupado apenas com seus próprios problemas e não tratam de ajudar os outros). Há uma evidente tensão entre as atitudes coletivas e as atitudes individuais. Entre os mais solidários, encontram-se os venezuelanos e porto-riquenhos. Os chilenos, equatorianos e paraguaios são os mais individualistas. Os brasileiros ocupam a 11ª colocação no quesito solidariedade, ficando abaixo da média dos demais países do continente.

 

Aliás, este caráter pouco solidário do brasileiro não chega a ser novidade. Já nos meados do século passado, Oliveira Vianna havia percebido tal característica. O autor considerou o insolidarismo como o traço mais marcante de nossa gente, razão pela qual defendia o papel coativo e educador do Estado na formação do que ele chamava de um comportamento culturológico, capaz de sobrepor-se ao espírito insolidarista. Vianna escreveu Instituições políticas brasileiras (1955), no qual efetuou, na segunda parte, intitulada Morfologia do Estado, um estudo pertinente sobre o significado sociológico do anti-urbanismo colonial (gênese do espírito insolidarista).

 

Para o autor, o espírito insolidarista tem sua origem nos primórdios da “colonização”. Dessa maneira, criou-se, no Brasil o homo colonialis, tendo como característica fortes traços de individualismo e desconfiança: “um amante da solidão, do deserto, rústico e anti-urbano”. Na questão do trabalho, o homem brasileiro, comparado com outros homens do mundo, caracterizou-se pelo particularismo e individualismo: “O trabalho agrícola, em nosso país – ao contrário do que aconteceu no mundo europeu – sempre foi essencialmente particularista e individualista: centrifugava o homem e o impelia para o isolamento e para o sertão” (p.151). Não houve a formação da solidariedade social, hábitos de cooperação e de colaboração, nem mesmo espírito público. O que houve, na verdade, foi uma solidariedade social negativa. Em relação a outros povos latino-americanos, e também na formação social e econômica, o brasileiro é, segundo Vianna, essencialmente, individualista, não necessita da ajuda comunitária e vive de forma isolada. Estas manifestações têm raiz na tradição cultural. O que existe, no Brasil, é apenas uma solidariedade parental, isto é, desde que se mantenham os interesses fechados entre as famílias dominantes: “Esta solidariedade inter-familiar e clânica é, assim, peculiar e exclusiva à classe senhorial” (p.272).

 

No âmbito do comportamento político-partidário, percebe-se, igualmente, a carência de motivações coletivas. Além disso, são muitas as citações em que Oliveira Vianna queixa-se da inexistência da cooperação do povo do Brasil, da sua pouca participação na vida pública (que se mantém desde o Império até a República) e, por que não dizer, até os nossos dias.

 

Por fim, o pioneirismo dos estudos de Oliveira Vianna, mais os dados do Informe do Latinobarômetro 2007 evidenciam que práticas individualistas e insolidárias persistem nas relações interpessoais dos brasileiros. Sem a dimensão da solidariedade, do civismo e do espírito público, o projeto da construção de um Estado-nação estará sendo novamente adiado, ou, na pior das hipótese, suplantado.

 

 

Dejalma Cremonese é cientista político e professor do Departamento de Ciências Sociais e do

Mestrado em Desenvolvimento da Unijuí (RS)

Site Pessoal: www.capitalsocialsul.com.br
E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

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