Correio da Cidadania

Equívoco perigoso

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A redução da maioridade penal de 18 para 16 anos pode se constituir em equívoco, com sérias consequências. O que resta a fazer é alertar a sociedade, advertindo-a dos desdobramentos negativos que esta decisão pode acarretar.

 

A grande maioria da população está a favor da redução, achando ser necessária para coibir a violência, muitas vezes praticada por adolescentes. Aí identificamos o primeiro equívoco. Pois, na verdade, os adolescentes são muito mais vítimas da violência do que causadores da violência.

 

Achar que o problema se resolve aumentando o rigor da lei é uma ilusão que precisa ser advertida. Além do mais, limitar a ação contra os menores infratores, sem apontar tantos outros fatores do aumento da violência na sociedade e nas famílias, é uma hipocrisia que precisa ser desmascarada.

 

Outro equívoco está no desconhecimento das severas medidas socioeducativas que o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente – já prevê em seus dispositivos. Estas medidas, já propostas pelo ECA, necessitam de um esforço coletivo da sociedade, para serem executadas com o claro objetivo de proporcionar a correção dos infratores, a fim de reinseri-los na sociedade.

 

Nestes dias, escutei o depoimento de um pai, que me impressionou. Conversando sobre a diminuição da idade penal, ele disse prontamente: “Já entendi! O que eles querem é faturar nossas filhas mais cedo”.

 

Perguntei por que ele afirmava isto. Ele não teve receio de falar claramente: “com esta nova lei, se alguém explora uma menina de 16 anos já não precisa temer a cadeia por violentar uma adolescente. Pois a nova lei supõe que uma menina de 16 anos já é adulta e deve saber o que faz!”

 

Outra alegação é que os adolescentes de 16 a 18 anos já não podem ser usados pelos traficantes de drogas, que antes recebiam a cobertura legal, e não podiam ser presos por causa da idade.

 

Acontece que os traficantes passarão a instrumentalizar adolescentes mais jovens, que ainda contam com a cobertura da lei. De tal modo que daqui a pouco a maioridade penal vai incluir os adolescentes de 14 e 15 anos. De modo que os autores desta mudança legal podem guardar o esquema da nova lei, para dentro de pouco tempo usá-lo para baixar a idade penal para 14 anos. Qual seria, então, a proposta certa?

 

Esta pergunta é fácil de fazer, mas a resposta é complicada. Em todo o caso, é bom desmascarar logo a hipocrisia que se esconde atrás desta insistência em diminuir a maioridade penal de 18 para 16 anos.

 

Pretende-se responsabilizar as crianças e adolescentes, enquanto se teima em tolerar na sociedade aquilo que produz a violência, como as injustas desigualdades, a dissolução das famílias, a propagação da droga, o mau exemplo dos adultos em seu comportamento pessoal. O aumento da violência não é causado pelos adolescentes. Eles são mais vítimas do que causadores da violência.

 

Para combater a violência, o leque de providências é muito mais amplo do que simplesmente aumentar o rigor da lei. Quando uma criança, em casa, se revolta, não adianta só aumentar o castigo. Pois pode bem ser que ela age assim porque não recebeu o amor que merecia. A solução mais autêntica é aumentar o amor, não o rigor!

 

 

Leia também:

Redução da maioridade penal: “A lógica do Estado Penal é encarcerar e explorar mão de obra”

 

D. Demetrio Valentini é bispo da diocese de Jales – SP.

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