Aumenta o perigo de intervenção imperialista na Líbia

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Sara Flounders
22/03/2011

 

A pior coisa que poderia acontecer ao povo da Líbia seria uma intervenção dos EUA. A pior coisa que poderia acontecer ao levante revolucionário que sacode o mundo árabe seria uma intervenção dos EUA na Líbia.

 

A Casa Branca se reuniu com seus aliados imperialistas europeus da OTAN e impôs uma zona de exclusão aérea (no-fly zone) sobre a Líbia, a interferência eletrônica de todas as comunicações do presidente Muammar Kadafi dentro da Líbia e o estabelecimento de corredores militares dentro da Líbia a partir do Egito e da Tunísia, supostamente para "assistir refugiados" (New York Times, 27/02/2011).

 

Isto significa posicionar tropas dos EUA/OTAN no Egito e na Tunísia junto aos dois mais ricos campos petrolíferos da OTAN, tanto a Leste como a Oeste. Significa o Pentágono coordenar manobras com militares egípcios e tunisianos. O que é que poderia ser mais perigoso para as revoluções egípcia e tunisina?

 

A Itália, outrora a colonizadora da Líbia, suspendeu um tratado de 2008 com os líbios que incluía uma cláusula de não agressão, movimento que poderia permitir que fizesse parte de futuras operações de "manutenção da paz" ali e permitir a utilização das suas bases militares em qualquer intervenção possível. Várias bases dos EUA e da OTAN na Itália, incluindo a base da Sexta Frota dos EUA em Nápoles, poderiam ser áreas de preparação para ações contra a Líbia.

 

O presidente Barack Obama anunciou que "o conjunto completo de opções" está a ser considerado. Esta é a linguagem de Washington para operações militares.

 

A secretária de Estado Hillary Clinton encontrou-se em Genebra, a 28 de fevereiro, com ministros de Negócios Estrangeiros no Conselho da ONU de Direitos Humanos para discutir possíveis ações multilaterais.

 

Enquanto isso, a somar-se aos tambores de guerra pela intervenção militar, está a divulgação de uma carta pública do Foreign Policy Initiative, um think tank de extrema-direita considerado como o sucessor do Project for the New American Century, a apelar para que os EUA e OTAN preparem "imediatamente" ação militar para ajudar a deitar abaixo o regime Kadafi.

 

Dentre os signatários do apelo público incluem-se William Kristol, Richard Perle, Paul Wolfowitz, Elliott Abrams, Douglas Feith e mais de uma dúzia de antigos altos responsáveis da administração Bush, mais vários democratas liberais eminentes tais como Neil Hicks do Human Rights First e John Shattuck, chefe dos "direitos humanos" de Bill Clinton.

 

A carta apela a sanções econômicas e ações militares: posicionamento de aviões de guerra e de uma frota naval da OTAN para impor zonas de interdição de voo e para ter capacidade de neutralizar embarcações navais líbias.

 

Os senadores John McCain e Joseph Lieberman, quando em Tel Aviv em 25 de fevereiro, apelaram a Washington para o fornecimento de armas aos rebeldes líbios e ao estabelecimento de uma zona de interdição de voo sobre o país.

 

Não se pode ignorar os apelos a contingentes da ONU de trabalhadores médicos e humanitários, monitores de direitos humanos e investigadores do Tribunal Penal Internacional a serem enviados à Líbia com uma "escolta armada".

 

Proporcionar ajuda humanitária não tem de incluir militares. A Turquia evacuou 7000 dos seus cidadãos em balsas e vôos charter. Uns 29 mil trabalhadores chineses deixaram o país via balsas, vôos charter e transportes terrestres.

 

Contudo, o modo pelo qual as potências européias estão evacuando seus cidadãos da Líbia durante esta crise envolve uma ameaça militar e faz parte da manobra imperialista para obter posições futuras na Líbia.

 

A Alemanha enviou três navios de guerra, com 600 soldados e dois aviões militares para retirar 200 empregados alemães da empresa de exploração de petróleo Wintershall de um campo no deserto a 965 km a sudeste de Trípoli. Os britânicos enviaram o navio de guerra HMS Cumberland para evacuar 200 cidadãos seus e anunciaram que o destróier York estava a caminho a partir de Gibraltar.

 

Os EUA anunciaram a 28 de fevereiro que estavam enviando o enorme porta-aviões USS Enterprise e o navio anfíbio de assalto USS Kearsarge do Mar Vermelho para as águas ao largo da Líbia, onde se juntarão ao USS Mount Whitney e outros navios de guerra da Sexta Frota. Oficiais estadunidenses chamam isto um "pré-posicionamento de ações militares".

 

ONU vota sanções

 

O Conselho de Segurança da ONU – sob a pressão dos EUA – em 26 de fevereiro votou pela imposição de sanções à Líbia. Segundo estudos de agências da própria ONU, mais de um milhão de crianças iraquianas morreram em conseqüência de sanções impostas pelos EUA/ONU àquele país, que aplanaram o caminho para uma invasão real dos EUA. Sanções são crimes e confirmam que esta intervenção não se deve a preocupações humanitárias.

 

A absoluta hipocrisia da resolução sobre a Líbia exprimindo preocupação pelos "direitos humanos" é difícil de superar. Apenas quatro dias antes da votação, os EUA utilizaram o seu direito de veto para impedir uma resolução redigida em linguagem moderada que criticava colonatos israelenses em terra palestina na Cisjordânia.

 

O governo dos EUA impediu o Conselho de Segurança de adotar qualquer ação durante o massacre israelense de Gaza em 2008, o qual resultou na morte de mais de 1500 palestinos. Estes corpos internacionais, bem como o Tribunal Penal Internacional, têm estado silenciosos sobre massacres israelenses, sobre ataques de aviões sem pilotos dos EUA a civis indefesos no Paquistão e sobre as criminosas invasões e ocupações do Iraque e do Afeganistão.

 

O fato de a China ter anuído à votação das sanções é um exemplo infeliz de como o governo de Pequim permite que o seu interesse no comércio e nos embarques continuados de petróleo prevaleçam sobre a sua passada oposição a sanções que prejudicam claramente populações civis.

 

Quem dirige a oposição?

 

É importante olhar o movimento de oposição, especialmente aqueles que estão a ser amplamente citados em toda a mídia internacional. Devemos assumir que pessoas que sofreram injustiças reais dele participam. Mas quem realmente dirige o movimento?

 

Um artigo de primeira página no New York Times, de 25 de fevereiro, descrevia quão diferente é a Líbia em relação às outras lutas que estalam por todo o mundo árabe. "Ao contrário das rebeliões juvenis possibilitadas pelo Facebook, aqui a insurreição foi conduzida por pessoas que são mais maduras e que têm se oposto ativamente ao regime durante algum tempo". O artigo descreve como foram contrabandeadas armas através da fronteira com o Egito ao longo de semanas, permitindo à rebelião "escalar rápida e violentamente em pouco mais de uma semana".

 

O grupo de oposição mais amplamente citado é a Frente Nacional para a Salvação da Líbia. A FNSL, fundada em 1981, é conhecida por ser uma organização financiada pela CIA, com escritórios em Washington. Ela tem mantido no Egito, junto à fronteira, uma força militar chamada Exército Nacional Líbio. Se se procurar no Google "National Front for the Salvation of Libya" e "CIA" rapidamente descobrem-se centenas de referências (Nota da Redação: 16.900 resultados).

 

Também é muito citada a National Conference for the Libyan Opposition. Isto é uma coligação constituída pela FNSL que também inclui a Libyan Constitutional Union, dirigida por Muhammad el-Senussi, um aspirante ao trono líbio. O sítio web da LCU apela a que o povo líbio reitere um juramento de lealdade ao rei Idris El-Senussi como seu líder histórico. A bandeira utilizada pela coligação é a do antigo reino da Líbia.

 

É claro que estas forças financiadas pela CIA e antigos monárquicos são política e socialmente diferentes da juventude e trabalhadores privados de direitos que marcharam aos milhões contra ditadores apoiados pelos EUA no Egito e na Tunísia e hoje se manifestam no Bahrain, Iêmen e Omã.

 

Segundo o artigo do Times, a ala militar da FNSL, utilizando armas contrabandeadas, rapidamente tomou postos policiais e militares na cidade portuária de Benghazi e áreas vizinhas que estão a norte dos mais ricos campos de petróleo da Líbia e onde se localiza a maior parte dos oleodutos, gasodutos, refinarias e terminal portuário de gás natural liquefeito. O Times e outros veículos de comunicação ocidentais afirmam que esta área, agora sob "controle da oposição", inclui 80% das instalações petrolíferas da Líbia.

 

A oposição líbia, ao contrário de movimentos alhures no mundo árabe, desde o princípio apelou à assistência internacional. E os imperialistas responderam rapidamente.

 

Exemplo: Mohammed Ali Abdallah, vice secretário-geral da FNSL, emitiu um apelo desesperado: "Estamos à espera de um massacre". "Estamos enviando um SOS à comunidade internacional para intervir". Sem esforços externos para conter Kadafi, "haverá um banho de sangue na Líbia nas próximas 48 horas".

 

O Wall Street Journal, a voz do big business, num editorial em 23 de fevereiro dizia que "Os EUA e a Europa deveriam ajudar os líbios a derrubar o regime Kadafi".

 

Interesse dos EUA: petróleo

 

Por que Washington e as potências européias estão desejosos e ansiosos em atuar na Líbia?

 

Quando acontece algo novo é importante rever o que sabemos do passado e perguntar sempre quais são os interesses das corporações estadunidenses na região.

 

A Líbia é um país rico petróleo – um dos 10 mais ricos do mundo. A Líbia tem as maiores reservas provadas da África, pelo menos 44 bilhões de barris. Ela tem produzido 1,8 milhão de barris de petróleo por dia – um óleo bruto leve que é considerado da melhor qualidade e precisa de menos tratamento do que a maior parte do petróleo mundo afora. A Líbia também tem grandes depósitos de gás natural, que é fácil canalizar diretamente para mercados europeus. É um país grande em área com uma pequena população de 6,4 milhões de pessoas.

 

É assim que as poderosas corporações petrolíferas e militares dos EUA, bancos e instituições financeiras que dominam os mercados globais encaram a Líbia.

 

Petróleo e gás são hoje as commodities mais valiosas e a maior fonte de lucros no mundo. Ganhar o controle de campos petrolíferos, oleodutos, gasodutos, refinarias e mercados orienta grande parte da política imperialista dos EUA.

 

Durante as duas décadas de sanções dos EUA sobre a Líbia, com que Washington pretendia deitar abaixo o regime, interesses corporativos europeus investiram pesadamente no desenvolvimento de pipelines e infra-estruturas ali. Cerca de 85% das exportações da Líbia vão para a Europa.

 

Transnacionais européias – em particular a BP, Royal Dutch Shell, Total, ENI, BASF, Statoil e Repsol – dominaram o mercado do petróleo da Líbia. As corporações gigantes dos EUA foram deixadas fora destes negócios lucrativos. A China tem comprado uma quantidade crescente do óleo produzido pela National Oil Corp. da Líbia e construiu um pequeno oleoduto no país.

 

Os enormes lucros que poderiam ser feitos com o controle do petróleo e gás natural da Líbia são o que está por trás do apelo trombeteado pela mídia corporativa dos EUA, em nome da "intervenção humanitária para salvar vidas".

 

Manlio Dinucci, jornalista italiano que escreve para Il Manifesto, explicou em 25 de fevereiro que "se Kadafi for derrubado, os EUA seriam capazes de fazer ruir toda a estrutura das relações econômicas com a Líbia, abrindo o caminho para multinacionais com base nos EUA, até agora quase totalmente excluídas da exploração das reservas de energia na Líbia. Os Estados Unidos poderiam então controlar a torneira de fontes de energia de que a Europa depende amplamente e que também abastecem a China".

 

Antecedentes

 

A Líbia foi uma colônia italiana de 1911 até a derrota da Itália na II Guerra Mundial. As potências imperialistas ocidentais após a guerra estabeleceram por toda a região regimes que eram chamados Estados independentes, mas eram encabeçados por monarcas nomeados sem o voto democrático do povo. A Líbia tornou-se um país nominalmente soberano, mas estava firmemente amarrado aos EUA e Grã-Bretanha sob um novo monarca – o rei Idris.

 

Em 1969, quando uma onda de lutas anti-coloniais varreu o mundo colonizado, oficiais militares de baixa patente moldados pelo revolucionário nacionalismo pan-árabe derrubaram Idris, que estava em férias na Europa. O líder do golpe era Muammar Kadafi, com 27 anos.

 

A Líbia mudou o seu nome de Reino da Líbia para República Árabe Líbia e posteriormente para Grande Jamahiriya Árabe Líbia do Povo Socialista.

 

Os jovens oficiais ordenaram o fechamento das bases dos EUA e Grã-Bretanha no território nacional, incluindo a grande Base Aérea Wheelus do Pentágono. Nacionalizaram a indústria petrolífera e muitos interesses comerciais que estavam sob o controle imperialista estadunidense e britânico.

 

Estes oficiais não chegaram ao poder num levante revolucionário das massas. Não foi uma revolução socialista. Ainda era uma sociedade de classe. Mas a Líbia já não estava sob domínio estrangeiro.

 

Foram efetuadas muitas mudanças progressistas. A nova Líbia obteve muitos ganhos econômicos e sociais. As condições de vida para as massas melhoraram radicalmente. A maior parte das necessidades básicas – alimentação, habitação, combustível, cuidados de saúde e educação – foram fortemente subsidiadas ou tornaram-se inteiramente gratuitas. Os subsídios foram utilizados como o melhor meio de redistribuir a riqueza nacional.

 

As condições para as mulheres mudaram radicalmente. Em 20 anos a Líbia alcançou a mais alta classificação no Índice de Desenvolvimento Humano da África – uma medida da ONU de expectativa de vida, realização educacional e rendimento real corrigido. Ao longo das décadas de 1970 e 1980 a Líbia tornou-se conhecida internacionalmente por adotar fortes posições antiimperialistas e apoiar outras lutas revolucionárias, desde o Congresso Nacional Africano na África do Sul até a Organização de Libertação da Palestina e o Exército Republicano Irlandês.

 

Os EUA executaram numerosas tentativas de assassínio e tentativas de golpe contra o regime Kadafi e financiaram grupos armados de oposição, tais como a FNSL. Alguns ataques foram flagrantes e abertos. Exemplo: sem aviso prévio, 66 jatos dos EUA bombardearam Trípoli, a capital líbia, e a sua segunda maior cidade, Benghazi, em 15 de abril de 1986. A casa da Kadafi foi bombardeada e sua filha criança morta no ataque, juntamente com centenas de outros.

 

Ao longo das décadas de 1980 e 1990 os EUA tiveram êxito em isolar a Líbia através de severas sanções econômicas. Foram feitos todos os esforços para sabotar a economia e desestabilizar o governo.

 

Demonização de Kadafi

 

Cabe ao povo da Líbia, da África e do mundo árabe avaliar o papel contraditório de Kadafi, o presidente do Conselho do Comando Revolucionário da Líbia. O povo daqui (EUA), no centro de um império construído sobre a exploração global, não deveria aderir às caracterizações racistas, ridicularizações e demonizações de Kadafi que saturam a mídia corporativa.

 

Mesmo que Kadafi fosse tão sereno e austero quanto um monge e tão cuidadoso quanto um diplomata, como presidente de país africano rico em petróleo anteriormente subdesenvolvido ele ainda teria sido odiado, ridicularizado e demonizado pelo imperialismo dos EUA se houvesse resistido ao domínio corporativo estadunidense. Esse foi o seu crime real pelo qual nunca foi esquecido.

 

É importante assinalar que termos degradantes e racistas nunca são utilizados contra peões ou ditadores confiáveis dos EUA, não importa quão corruptos ou brutais possam ser para o seu próprio povo.

 

Ameaças dos EUA obrigam a concessões

 

Foi após o crime de guerra dos EUA denominado "pavor e choque", com o maciço bombardeio aéreo do Iraque seguido de uma invasão terrestre e ocupação, que a Líbia finalmente sucumbiu às exigências estadunidenses. Após décadas de solidariedade militante e antiimperialista, a Líbia mudou de curso drasticamente. Kadafi ofereceu ajuda aos EUA na sua "guerra ao terror".

 

As exigências de Washington foram onerosas e humilhantes. A Líbia foi forçada a aceitar a plena responsabilidade pelo derrube do avião de Lockerbie e a pagar US$2,7 bilhões em indenizações. Isso foi só o princípio. A fim de as sanções dos EUA serem suspensas, a Líbia teve de abrir seus mercados e "reestruturar" a sua economia. Tudo isso fez parte do pacote.

 

Apesar das muitas concessões de Kadafi e das subseqüentes grandes recepções em sua homenagem por parte de chefes de Estado europeus, o imperialismo estadunidense planejava a humilhação completa e sua queda. Think tanks dos EUA empenhavam-se em numerosos estudos sobre como minar e enfraquecer o apoio popular de Kadafi.

 

Estrategas do FMI aterraram na Líbia com programas. Os novos conselheiros econômicos prescreveram as mesmas medidas que impõem a todo país em desenvolvimento. Mas a Líbia não tinha uma dívida externa; tinha uma balança comercial positiva de US$27 bilhões por ano. A única razão para o FMI exigir que se acabasse com os subsídios das necessidades básicas era minar a base social de apoio ao regime.

 

A "liberalização do mercado" da Líbia significou um corte de US$5 bilhões no valor dos subsídios anuais. Durante décadas o Estado estivera subsidiou 93% do valor de várias commodities básicas, nomeadamente combustível. Depois de aceitar o programa do FMI, o governo duplicou o preço da eletricidade para os consumidores. Houve uma alta súbita de 30% nos preços dos combustíveis. Isto desencadeou aumentos de preços em muitos outros bens e serviços.

 

Disseram à Líbia para privatizar 360 empresas estatais, incluindo siderurgia, cimenteiras, empresas de engenharia, fábricas de alimentos, linhas de montagem de caminhões e carros e unidades agrícolas estatais. Isto resultou em milhares de trabalhadores desempregados.

 

A Líbia teve de vender uma fatia de 60% da companhia petrolífera estatal Tamoil Group e privatizar a sua Companhia Geral Nacional de Farinhas e Forragens.

 

O Carnegie Endowment Fund controlava o impacto das reformas econômicas. Um relatório de 2005 intitulado "Reformas econômicas irritam cidadãos líbios" ("Economic Reforms Anger Libyan Citizens"), de Eman Wahby, dizia que "outro aspecto da reforma estrutural foi o fim das restrições a importações. Foram garantidas licenças a companhias estrangeiras para exportar para a Líbia através de agentes locais. Em conseqüência, produtos de todo o mundo inundaram o mercado líbio anteriormente isolado". Isto foi um desastre para os trabalhadores nas fábricas da Líbia, as quais não estavam preparadas para enfrentar a competição.

 

Mais de US$4 bilhões entraram na Líbia, a qual se tornou o principal receptor africano de investimento estrangeiro. Como os banqueiros e os seus think tanks bem sabem, isto não beneficiou as massas líbias, empobreceu-as.

 

Mas não importava o que Kadafi fizesse, nunca era o suficiente para o poder corporativo dos EUA. Os banqueiros e financistas queriam mais. Não havia confiança. Kadafi havia se oposto aos EUA durante décadas e ainda era considerado altamente "inconfiável".

Em maio de 2005 a revista US Banker publicou um artigo intitulado "Mercados emergentes: será a Líbia a próxima fronteira para bancos dos EUA?" ("Emerging Markets: Is Libya the Next Frontier for U.S. Banks?"). Ali se dizia que "quando o país atravessa reforma, os lucros acenam. Mas o caos abunda". A revista entrevistou Robert Armao, presidente do Conselho Econômico e Comercial EUA-Líbia com sede em Nova York: "Todos os grandes bancos ocidentais agora exploram oportunidades ali", disse Armao. "A situação política com Kadafi ainda é muito suspeita". O potencial "parece maravilhoso para bancos. A Líbia é um país intacto e uma terra de oportunidade. Ela acontecerá, mas isso pode levar algum tempo".

 

A Líbia nunca foi um país socialista. Sempre houve ali vasta riqueza herdada e velhos privilégios. É uma sociedade de classe com milhões de trabalhadores, muitos deles imigrantes.

 

Reestruturar a economia a fim de maximizar lucros para banqueiros ocidentais desestabilizou relações, mesmo nos círculos dirigentes. Quem obtém negócios de privatização de indústrias chave, que famílias, que tribos? Quem é deixado de fora? Velhas rivalidades e competições vieram à superfície.

 

Quão cuidadosamente o governo dos EUA estava monitorando tais mudanças impostas pode ser visto nos telegramas da Embaixada dos EUA em Trípoli divulgados recentemente pelo WikiLeaks, publicado no jornal britânico Telegraph de 31 de janeiro. Um telegrama intitulado "inflação sobe na Líbia", enviado em 4 de janeiro de 2009, descrevia o impacto de "um programa radical de privatização e reestruturação do governo".

 

"Aumentos significativos foram vistos", dizia o telegrama, "nos preços alimentares – o preço de bens anteriormente subsidiados, tais como açúcar, arroz e farinha, aumentaram 85% em dois anos desde que os subsídios foram suspensos. Materiais de construção também aumentaram significativamente: preços para cimento, madeira aglomerada e tijolos aumentaram 65% no ano passado. O cimento passou de 5 dinares líbios por um saco de 50 kg para 17 dinares em um ano; o preço da barra de aço aumentou numa escala de dez.

 

"O fim (pelo governo líbio) dos subsídios e controles de preços como parte de um programa mais vasto de reforma econômica e privatização certamente contribuiu para pressões inflacionárias e provocou alguns resmungos. A combinação de alta inflação e diminuição de subsídios e controles de preços é preocupante para um público líbio habituado a uma maior proteção do governo em relação às forças do mercado".

 

Estes telegramas da Embaixada dos EUA confirmam que enquanto continuavam a manter e financiar grupos da oposição líbia no Egito, Washington e Londres também estavam constantemente medindo a temperatura do descontentamento em massa provocado pelas suas políticas.

 

Hoje milhões de pessoas nos EUA e por todo o mundo estão profundamente inspiradas pelas ações de milhões de jovens nas ruas do Egito, Tunísia, Bahrein, Iêmen e agora Omã. O impacto é sentido mesmo na ocupação de Wisconsin.

 

É vital ao movimento político com consciência de classe dos EUA resistir às enormes pressões de uma campanha orquestrada para a intervenção militar na Líbia. Uma nova aventura imperialista deve ser desafiada. Solidariedade com os movimentos dos povos! Fora EUA e suas mãos!

 

O original encontra-se em Workers.org

Fonte e tradução: http://www.resistir.info/

Sara Flounders é militante do Workers World Party (WWP) norte-americano, além de dirigente do International Action Center. Costuma escrever na imprensa operária de seu país, especialmente no Workers World newspaper.

 

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