Correio da Cidadania

Neocolonialismo, Vaticano, Equador e a Mãe Terra – Sinais

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O noticiário internacional do início de 2013, em geral, sinaliza desesperança. Todavia, se bem atentarmos, também há sinais de esperança.

 

Neocolonialismo


Intervenção militar francesa no Mali. Trata-se de país localizado na África saariana, antiga colônia da França, rico em minerais explorados por multinacionais (sobretudo, francesas) e com situação social precária. A pobreza atinge a maior parte de sua população. A chamada “Françáfrica” ainda existe.

 

A ação bélica ocorre de forma “politicamente correta” – cínica. A França atende ao pedido urgente do fraco e ditatorial governo de Bamako (capital do país) e se respalda em ampla coalizão de países africanos e governos europeus. A revolta em Mali pode se expandir para outros países do norte da África (vide o que já ocorreu na Argélia). A respeito da situação no Mali, o New York Times colocou o destaque: “manifesta-se o lado perigoso da Primavera Árabe” (...) “tinha razão o coronel Kadafi, quando previa que, se ele caísse, o pessoal de Bin Laden chegaria por terra e mar para ocupar o Mediterrâneo”.

 

França e coalizão culpam o extremismo, islamismo salafista radical, mas de fato estão a sufocar revolta autêntica decorrente da miséria, da dependência neocolonial e das consequências das alterações geopolíticas que ocorrem na região. A elite dessa sociedade de maioria islâmica também oprime o povo.

 

A situação é esdrúxula: um governo ditatorial de uma ex-colônia francesa que chamou o governo “socialista francês” para realizar uma intervenção armada no país, a fim de expulsar rebeldes supostamente "islâmicos". Os Estados Unidos se mantêm resistentes em aderir com tropas, mas pensam em contribuir com drones (zangões) ou UAV – Unmanned Aerial Vehicle (veículo aéreo não tripulado), ou seja, robôs de sofisticada tecnologia –, pequenas aeronaves sem piloto e letais. Doutrina Obama!

 

O que ocorre no Mali é claro sinal de desesperança.

 

Vaticano

 

O Vaticano está em crise. Verdadeira tormenta. O Papa Bento XVI, de forma inusitada, renunciou. Existe uma profusão de matérias sobre o assunto. Resolvemos aqui destacar alguns aspectos da entrevista do teólogo Leonardo Boff, publicada no Jornal Brasil de Fato (21 a 27 de fevereiro de 2013; págs 14 e 15) e outras publicações.

 

Para Boff, a renúncia ocorre em clima claramente vexaminoso e constrangedor. Pode ter sido o resultado de uma rede de intrigas ocorridas na cúpula da Igreja Católica envolvendo o sistema financeiro e até a máfia italiana. Leonardo Boff esclarece que a cúria romana é palco de feroz disputa pelo poder. O secretário de Estado, cardeal Bertone, teria construído um governo paralelo. Os escândalos de vazamento de documentos secretos da mesa papal e do Banco do Vaticano, usados pelos milionários italianos, alguns da máfia, para lavar dinheiro e mandá-lo para fora, atingiram fortemente o papa. Além disso, várias questões de ordem moral acabaram por estigmatizar o papado de Bento XVI: a pedofilia que já grassava no papado de João Paulo II não foi suficientemente combatida, “os homoafetivos não tiveram reconhecimento e as mulheres foram humilhadas, como nos Estados Unidos, negando o direito de cidadania a uma teologia feita a partir do gênero”.

 

Principalmente para nós da América Latina, o papa renunciante “entrará para a história como aquele que censurou pesadamente a Teologia da Libertação, interpretada à luz de seus detratores, e não à luz das práticas pastorais e libertadoras de bispos, padres, teólogos, religiosos(as) e leigos, que fizeram uma séria opção pelos pobres, contra a pobreza e a favor da vida e da liberdade”.  Ainda “como presidente da Congregação da Doutrina da Fé (ex-Santo Ofício, ex-Inquisição), o cardeal Joseph Ratzinger condenou, silenciou, depôs de cátedra ou transferiu mais de cem teólogos”. Do Brasil foram dois: a teóloga Ivone Gebara e o próprio Leonardo Boff.

 

Frente a essa situação, poderíamos ser tentados a identificar na renúncia um sinal de esperança, mas pode ocorrer o inverso, repetindo-se o papado antigo com nova maquiagem. O papa que sai trabalhou bem em nomear cardeais conservadores. Fazer de conta que muda para nada mudar, de fato.

 

Equador e a Mãe Terra

 

O povo equatoriano reelegeu Rafael Correa por ampla maioria. Ratificou sua política conhecida como “Revolução Cidadã”. As forças reacionárias (mídia inclusive) tentaram de tudo para desestabilizar o seu governo. Houve até tentativa de golpe e de assassinato do presidente em 2010, com mortes entre os responsáveis pela segurança do presidente. Foi um governo voltado para o povo e para o desenvolvimento do país. Teve sucesso e apoio popular.

 

Em seu discurso de vitória, assim se expressou Correa: “Aqui já não mandam os banqueiros, o FMI, os meios de comunicação... Esta revolução nada nem ninguém deterão. Estamos fazendo história. Estamos construindo a pátria pequena e a Pátria Grande, a nossa América Latina... Não queremos nada para nós, somente deixar a nossos filhos e aos filhos dos nossos filhos um país melhor”.

 

Na Bolívia, em 15 de janeiro, o presidente Evo Morales promulgou a lei da Mãe Terra e Desenvolvimento Integral para Bem Viver, inserida na luta contra o latifúndio. Ela tem como finalidade equilibrar a posse da terra e garantir direitos à natureza. Nas palavras de Morales, “temos que trabalhar para viver bem e garantir o que necessitamos. Não mais que isso”. Para ele, o consumo desenfreado capitalista é um dos grandes responsáveis pela destruição do planeta.

 

Fortes sinais de esperança! Algo luminoso ocorre em Nuestra América.

 

Em cinco de março, foi anunciado o falecimento do presidente Hugo Chávez. Líder de enorme importância para os processos libertários que ocorrem na América Latina. Esta morte trás consigo um forte sinal de desesperança para todos os latino-americanos. Oxalá, o povo venezuelano reverta esta expectativa e pegue em suas mãos a bandeira bolivariana de Hugo Chávez.

 

Muchas gracias, presidente Chávez. Hasta la victoria siempre.

 

José Juliano de Carvalho Filho, Elisa Helena Rocha de Carvalho, Marietta Sampaio, Frei João Xerri, Guga Dorea, Plínio de Arruda Sampaio, Silvio Mieli, Thomaz Ferreira Jensen se revezam na confecção de textos do Grupo São Paulo.

Publicado originalmente no Boletim da Rede.

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