A queda do muro do Moinho

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Raphael Sanz, da Redação
17/08/2013

 

 

Entre uma infinidade de muros que precisam ser derrubados, cujas demolições foram colocadas em pauta pelo povo que toma as ruas do país inteiro desde o dia 6 de junho, um deles acabou de cair, no último dia 4, um domingo. Trata-se do muro da favela do Moinho, no centro de São Paulo, que separava o território atual da comunidade de sua antiga outra metade, hoje desalojada e aterrada pela prefeitura.

 

Esmagada entre linhas de trem e viadutos, a última favela do centro de São Paulo ainda briga para existir. A comunidade fica localizada em um ponto chave do projeto de remodelagem urbana do ex-prefeito Gilberto Kassab, que visava a demolição do elevado Costa e Silva (vulgo Minhocão) e a construção de um parque linear entre o Brás e a Lapa, onde hoje correm as linhas de trem.

 

Naquele domingo ensolarado, a associação de moradores convocou – amparada por uma liminar judicial e um laudo dos bombeiros que afirma que o muro poderia representar um perigo para os moradores em caso de novo incêndio, já que forma uma espécie de beco sem saída – uma manifestação na rua principal da comunidade, à qual foram chamados, além da própria comunidade, diversos movimentos que historicamente têm apoiado as pautas dos moradores.

 

O laudo dos bombeiros saiu no dia 16 de julho, após diálogo entre a associação de moradores da favela e a prefeitura, realizado quatro dias antes. Mas nenhum prazo havia sido dado para uma providência oficial em relação à derrubada do muro. Assim, a comunidade se organizou e, em meio a um domingo de sol e muita música no pé do muro, moradores se revezavam com marretas e britadeiras para pôr abaixo aquele muro que tanto incomodava suas vidas e ameaçava sua integridade física.

 

Durante o início das atividades do ato, houve alguns incidentes. O primeiro envolvendo a Mídia Ninja, que foi ao local para fazer a cobertura do evento e acabou expulsa por moradores. Organizadores afirmaram que a expulsão ocorreu por conta da organização Fora do Eixo (que mantém a Mídia Ninja), a qual, segundo eles, havia ganhado uma licitação para promover atividades culturais na comunidade, que deveriam começar no último mês de maio e que nunca foram realizadas (o Fora do Eixo já se pronunciou sobre o episodio, alegando que sua marca foi inserida na divulgação das atividades sem seu prévio conhecimento).

 

Por volta das 15h30, a Guarda Civil Metropolitana entrou na comunidade a fim de impedir a derrubada do muro, mas moradores, ativistas de fora de comunidade, comunicadores e advogados acompanharam a GCM até o lado de fora da favela, mostraram a liminar e o laudo e assim foi resolvido o imbróglio, com a GCM se retirando do local.

 

O ato acabou por volta das 20h, com um belo pedaço do muro destruído e muita música na comunidade, promovida por grupos de rap, funk e uma fanfarra carnavelesca ligada a movimentos sociais, a Fanfarra do MAL.

 

Histórico

 

Segundo Alessandra, 29 anos e moradora há 18 da comunidade, o terreno outrora foi usado como um cemitério clandestino da PM. Em meados de 95, quando ela chegou ao local junto a diversos ex-moradores de baixa renda do centro da cidade, que eram sistematicamente despejados das suas casas, o terreno era um grande matagal com um prédio enorme abandonado na área que o falecido muro isolara, desde o ano passado. A ocupação começou pelo prédio e se estendeu às outras áreas da comunidade.

 

Em 2011, houve um incêndio que atingiu o prédio, considerado criminoso pelos moradores, que acabou sendo usado como pretexto para a implosão da estrutura no primeiro dia de 2012,ao custo de 3,5 milhões de reais, deixando mais de cinco mil pessoas desabrigadas em pleno réveillon. Uma pessoa morreu e mais de 100 barracos foram destruídos. Depois deste, outros focos de incêndio com menos gravidade foram registrados e, meses depois, o muro construído. Após estes incêndios, houve uma pressão pela extinção da favela, visto que a população foi reduzida à metade.

 

Houve enfrentamentos entre moradores e a GCM, enquanto o ex-prefeito Kassab tentava retirar as famílias do local, oferecendo a famigerada bolsa-aluguel. Aproximadamente 810 famílias foram registradas no programa, mas muitas acabaram voltando ao Moinho, afirmando que os 400 reais da bolsa-aluguel não eram suficientes para financiar suas moradias.

 

Hoje, a comunidade estuda junto a um escritório de arquitetura um projeto de urbanização da favela que não exclua e desabrigue os moradores, pelo contrário. Entre os debates, está sendo pautada a questão do saneamento básico – água, esgoto e luz – prioritariamente.

 

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Veja abaixo vídeo da implosão do prédio em 1 de janeiro de 2012

 

 

Raphael Sanz é jornalista.

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