Trabalho infantil condiciona o futuro

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Osvaldo Russo
01/06/2015

 

 

Tem havido um esforço global no combate ao trabalho infantil, em especial de suas piores formas, que compromete o desenvolvimento da criança e do adolescente. Há um protagonismo não só dos governos, mas também da sociedade civil como, no Brasil, o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil. Segundo relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT), existem, no planeta 168 milhões de crianças e adolescentes, entre 5 e 17 anos, trabalhando (11% da população infantil mundial), das quais 85 milhões envolvidos em trabalhos perigosos.

 

No período de 2000 a 2012, o ritmo de redução foi significativo: 78 milhões de crianças a menos (redução de um terço); 40% a menos de meninas e 25% a menos de meninos. Segundo a OIT, mantendo-se a atual tendência, o objetivo de eliminar as piores de formas de trabalho infantil até 2016 não será atingido. A agricultura é o setor de maior concentração de crianças e adolescentes em situação de trabalho.

 

No Brasil, houve uma significativa redução do trabalho infantil entre os anos de 1992 e 2011. Segundo os dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD), do IBGE, no início da década de 1990, o trabalho infantil atingia 8.312.391 crianças e, em 2011, este número caiu para 3.518.000, uma redução de 56%. Entre 2012 e 2013, o Brasil registrou queda de 12,3% no número de trabalhadores entre 5 e 17 anos, mas ainda há 3,1 milhões nesta faixa etária, a maioria do sexo masculino.

 

O índice da ocupação das pessoas de 5 a 17 anos de idade no Brasil foi 7,4% em 2013, ante 8,4% em 2012. A maioria dos casos de trabalho infantil foi encontrada nas regiões Norte e Nordeste, chegando a 24,9% e 21,4% da força de trabalho. A média de horas trabalhadas era 27,1 horas por semana. Em Brasília, segundo a PNAD/2012, não se constata trabalho entre crianças de 5 a 9 anos e, entre as de 10 a 14 anos de idade, a incidência é insignificante (0,4%), a menor taxa entre as capitais brasileiras.

 

A agricultura é a atividade em que as pessoas começam a trabalhar mais cedo. Na faixa de 5 a 13 anos, 60% dos que trabalham estão na agricultura. Quanto mais a idade avança, menor a porcentagem de trabalho infantil nessas atividades. Em relação à PNAD 2011, 1,3 milhão de crianças e adolescentes trabalhavam na agricultura, o que correspondia a 35,5% do trabalho infantil. Em 2012, esse percentual caiu para 30,1%, totalizando um milhão de crianças trabalhando no setor.

 

Vários fatores têm contribuído para a redução do trabalho infantil: universalização do Ensino Fundamental, consolidação do modelo de proteção social, com a implantação do Sistema Único de Assistência Social (Suas), política massiva de transferência de renda condicionada à frequência escolar, com a implantação do Programa Bolsa Família e do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), aumento do nível de escolarização dos pais ou responsáveis, crescimento dos empregos formais para as pessoas adultas, acesso à qualificação profissional, com o Pronatec, e política de valorização do salário mínimo constituem razões determinantes para o alcance desse bom resultado.

 

Segundo estudo realizado, em 2013, pela Codeplan (Companhia de Planejamento do Distrito Federal), no qual o trabalho infantil no DF foi investigado junto com a situação de estudo da criança, foram selecionadas algumas variáveis para compor o modelo explicativo deste fenômeno: idade e sexo da criança, renda per capita, presença do cônjuge do responsável, situação do domicílio, condição de ocupação e escolaridade do responsável e recebimento ou não do Bolsa Família e/ou do Peti por alguém da família.

 

As variáveis que apresentaram maior impacto foram escolaridade do responsável e o recebimento dos benefícios sociais. Quanto maior a escolaridade do responsável, maior a probabilidade de que a criança apenas estude; essa probabilidade também é maior para aqueles que são beneficiários de um dos programas de transferência de renda mencionados. O sexo e a idade da criança também foram muito relevantes: crianças e adolescentes do sexo masculino têm maior probabilidade de trabalhar, enquanto as meninas têm maior chance de não trabalhar nem estudar; ademais, quanto menor a idade da criança, menor a probabilidade de que ela trabalhe e/ou abandone os estudos.

 

Crianças que vivem em área rural também têm menor probabilidade de apenas estudar; em relação às que vivem na área urbana, elas têm mais chance de apenas trabalhar, trabalhar e estudar ou não trabalhar nem estudar.  A presença do cônjuge do responsável é uma variável com impacto positivo: quando ele está presente, a probabilidade de a criança só estudar aumenta consideravelmente. Já a variável renda per capita apresentou um efeito muito pequeno, talvez pelo fato de que esta é uma variável que está diretamente relacionada à escolaridade do responsável e ao recebimento do benefício. Outras pesquisas também indicam que a criança que permanece estudando tem maior probabilidade de, no futuro, quando adulta, garantir emprego com melhor remuneração.

 

Com o Plano Brasil Sem Miséria, pode-se melhorar o nível de escolaridade da população e superar a extrema pobreza. Na faixa de 15 a 17 anos, a escola não atrativa, a baixa renda familiar e a expectativa de consumo nessa idade empurram precocemente o jovem para a busca de trabalho e renda. Deve haver, também, maior preocupação com a educação do campo e a melhoria das condições da agricultura camponesa e familiar.

 

É preciso fortalecer os vínculos familiares e comunitários, consolidar o sistema de proteção social e investir na formação em escolas de qualidade, de tempo integral e com metodologia atrativa principalmente nos Ensinos Médio e Profissional. É preciso, sobretudo, garantir direitos iguais a todas as crianças e adolescentes e romper com a cultura predominante de que “trabalho faz bem” à formação e ao futuro da criança.

 

Osvaldo Russo, estatístico, foi diretor de Estudos e Políticas Sociais da Codeplan e secretário de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda do Distrito Federal.

 

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