A insensatez continua – a marcha da economia brasileira em 2013

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Paulo Passarinho
20/12/2013

 

 

 

Sob o ponto de vista do governo Dilma, o ano de 2013 se encerra com mais uma frustração em relação ao crescimento econômico desejado. Desde meados de 2011, a equipe econômica declara a sua intenção de reativar o ritmo da atividade econômica. Foi em setembro daquele ano que o Banco Central, depois de ter elevado a taxa Selic a 12,5% ao ano, deu início a uma redução desta taxa básica, justamente para atender ao objetivo explicitado pelo governo.

 

De fato, entre setembro de 2011 e outubro do ano passado, a taxa Selic sofreu sucessivas reduções até chegar a 7,25%. Contudo, estas medidas – juntamente com um amplo programa de isenções e reduções fiscais para as empresas, incluindo a desoneração da folha de pagamentos - se mostraram insuficientes para uma resposta positiva às expectativas do governo. O crescimento econômico em 2012 (1%) acabou sendo ainda menor do que o pífio resultado da economia em 2011 (2,7%).

 

2013, portanto, teve início com o fantasma do baixíssimo crescimento econômico de 2012 atormentando o comando econômico do governo. É importante assinalar, entretanto, que a redução da taxa Selic se deu de forma simultânea à redução da participação relativa dos títulos públicos remunerados por esta taxa, em relação ao estoque de títulos da dívida pública negociados com o mercado financeiro. Prova disso é que o custo médio de administração da dívida pública, neste período de “redução da Selic”, não se alterou substantivamente, mantendo-se sempre entre 11 e 12% ao ano. Este dado mostra, a rigor, o poder - sempre presente e dominante - dos interesses do setor financeiro sobre o próprio governo.

 

O que o governo não contava, no início do ano, foi com a disparada dos preços, especialmente dos alimentos e dos serviços em geral. Além disso, o desejável processo de desvalorização do câmbio, buscando maior competitividade às exportações, também colocava obstáculos ao que Guido Mantega, o ministro da Fazenda, então denominava de uma “nova matriz econômica”.

 

A “nova matriz econômica” seria a chave para a recuperação de um crescimento econômico perdido em 2012. Significaria a combinação de juros baixos com câmbio desvalorizado, mantendo-se a vigilância sobre a inflação. Mas, como fazê-lo, frente ao temor da volta da carestia? Afinal, com o grau de abertura da economia e com o longo processo de valorização do real – desde os anos 1990! – as cadeias produtivas, sob forte controle de multinacionais, substituíram largamente insumos, peças e componentes produzidos anteriormente aqui mesmo no país, por produção importada. A desvalorização cambial em um contexto dessa natureza exige planejamento e coordenação, pois o impacto sobre os custos de produção é inevitável.

 

A resposta não tardou a aparecer. Além da protelação no reajuste de preços e tarifas de serviços públicos, coordenada pelo governo federal, inclusive junto a prefeituras das grandes cidades, a “voz do mercado” voltou a aparecer com força e, em abril, o Banco Central deu início a uma nova escalada de elevação da taxa Selic, até agora não concluída. O resultado foi a elevação da taxa básica de juros de 7,25%, que estava em vigor desde outubro de 2012, para os atuais 10%, definidos na última reunião do Copom, em novembro último. Com essas medidas, e apesar das promessas do ministro da Fazenda, voltamos a liderar, com folga, o topo da lista dos países com as maiores taxas de juros reais do mundo.

 

Mas, os problemas acumulados ao longo do ano são mais complexos, ainda. O estrutural problema das contas externas voltou a apresentar sintomas negativos. Até o mês de novembro, por exemplo, a balança comercial mantém-se com resultado negativo, agravando o déficit das transações correntes (comércio e serviços) do país. Até novembro, de acordo com os dados disponíveis, o déficit em conta corrente chega a mais de US$ 72 bilhões, com o Banco Central estimando um resultado negativo para esse ano de US$ 79 bilhões.

 

Em relação ao endividamento público, com a elevação da taxa de juros, o montante da dívida mobiliária em poder dos credores se aproxima dos R$ 2 trilhões, mantendo as despesas financeiras do Tesouro como principal problema fiscal a ser enfrentado, apesar da total omissão do governo e da oposição de direita em relação a essa questão. A consequência imediata dessa situação é que quase a metade do Orçamento Geral da União se encontra comprometida com o pagamento de juros e amortizações dessa dívida, impondo o subfinanciamento do gasto das áreas sociais e a incapacidade do Estado enfrentar os problemas da infraestrutura logística.

 

É dentro deste contexto que o governo Dilma deixou cair a sua máscara antiprivatista, sustentada no embate eleitoral, especialmente contra os tucanos. Frente ao baixo crescimento econômico, ao endividamento provocado pela elevada taxa de juros e o consequente comprometimento orçamentário com as dívidas financeiras o governo lançou mão, de forma despudorada, das anteriormente combatidas privatizações.

 

Um amplo programa de concessões à iniciativa privada – sempre com o decisivo e generoso financiamento do BNDES – foi deflagrado, envolvendo portos, aeroportos, ferrovias, rodovias e campos de petróleo e gás. O objetivo seria elevar a taxa de investimento na economia, atrair mais recursos externos – inclusive para ajudar a fechar o déficit de nossas contas externas – e criar melhores condições para a degradada infraestrutura do país.

 

Em relação à área energética, além da retomada com toda ênfase dos leilões de petróleo e gás, tivemos igualmente a aprovação de uma Medida Provisória que, a pretexto de se reduzir as elevadíssimas tarifas de energia elétrica, impôs sérios prejuízos às empresas do sistema Eletrobrás, especialmente Furnas e Chesf. Empresas estratégicas para o país, já sofrendo os efeitos negativos das privatizações da era FHC, a situação agora é agravada, com o comprometimento da situação financeira das mesmas, necessidade de redução dos seus quadros técnicos e a perda ainda mais acentuada do poder de planejamento e intervenção estatal nesta área.

 

Por tudo isso, 2013 consolidou ainda mais a estratégia do subdesenvolvimento, como norte para a economia brasileira. O que nos espera, cada vez mais, é a dependência do país às ondas – expansivas ou de contração – da economia mundial, o aprofundamento do nosso papel de fornecedor mundial de produtos agrícolas e minerais, a contínua necessidade de atração dos capitais externos e o consequente processo de desnacionalização produtiva, regressão industrial e fragilidade do Estado, frente às mais sentidas necessidades do povo.

 

Podemos resumir que a marcha da insensatez econômica continua. Entretanto, frente ao escancarado divórcio entre as exigências de uma população maltratada em seus direitos elementares e os rumos que o Brasil assume, somente da tensão que vai sendo gerada poderemos apostar que surgirá a força política necessária, para as mudanças que o Brasil, como um país independente, mereceria.

 

Paulo Passarinho é economista e apresentador do programa de rádio Faixa Livre.

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