Eleições presidenciais nos Estados Unidos: desafio aos democratas

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Virgílio Arraes
02/07/2008

 

Caso haja o retorno dos democratas à Casa Branca, especula-se sobre quais medidas seriam tomadas com relação ao legado da administração George Bush. Uma delas seria a revisão do monitoramento eletrônico de cidadãos, justificado sob a rubrica de combate ao terrorismo, o que, por sua vez, caracteriza o estado de guerra. No dia-a-dia, a autorização deriva da pena do ministro da justiça ou do Diretor de Espionagem Nacional, não do Poder Judiciário, como determinava a Lei de Vigilância de Espionagem Externa, de 1978. A Agência Nacional de Segurança não poderia, em tese, efetivar escutas, escorada apenas no âmbito do Executivo.

 

Contudo, em agosto de 2007, os dois partidos aprovaram na Câmara o texto da Lei de Proteção da América, que ampliou o poder do Executivo na área de espionagem, ao mencionar, entre outros, a possibilidade de supervisionar estrangeiros em contato com os cidadãos norte-americanos, desde que houvesse indícios significativos de ameaça à segurança nacional. De modo geral, ela é uma emenda ao texto legal de 1978, estruturada originalmente em decorrência do conturbado mandato do Presidente Richard Nixon.

 

Isto faz com que haja a possibilidade, por exemplo, de que um jornalista norte-americano seja interceptado em suas trocas de mensagens, se estiver investigando tópicos conectados com as duas guerras em andamento, portanto, assuntos delicados sob a ótica do interesse nacional. Assim, pode-se inviabilizar-se, em alguns casos, a garantia de sigilo de fonte.

 

Ademais, a legislação restringe questionamentos por eventual violação de privacidade, ao dificultar processos judiciais contra provedores de rede por facultar o acesso a informações de maneira administrativa tão-somente. Assim, indaga-se o motivo por que os democratas, com maioria no Congresso, aprovaram um projeto tão ao estilo republicano – quase 300 votos favoráveis, com mais de 100 deles de congressistas não republicanos. Falta ainda a apreciação do Senado, porém não se espera objeção maior com relação ao seu andamento.

 

Uma possível motivação do Partido Democrata seria o receio de aparentar aos norte-americanos, em ano pré-eleitoral, falta de firmeza na condução da guerra ao terror, o que caracterizaria, portanto, uma transigência desmedida, ainda mais em virtude do desgaste político da gestão Bush. Os republicanos buscam explorar constantemente esta eventual fraqueza de seus opositores políticos.

 

Transição no Iraque?

 

Paralelamente ao monitoramento de seus próprios cidadãos, o governo estadunidense reflete sobre a viabilidade de executar um projeto – o Fênix – aplicado, em sua primeira versão, na Guerra do Vietnã onde houve inúmeros maus-tratos a cidadãos do lado sul, por suspeita de colaboração com os do norte, de inclinação comunista.

 

A proposta é depurá-lo, a fim de empregá-lo cotidianamente nas atuais confrontações externas. Nesse sentido, as fragilidades físicas e psíquicas dos presos seriam levadas ao extremo, mas, enfatizam seus defensores, sem causar danos permanentes ao interrogado.

 

O projeto seria parte de um encaminhamento maior, por meio do qual as tropas retornariam aos poucos para os Estados Unidos. Presentes em solo iraquiano, apenas os efetivos de elite com o encargo de combater terroristas e de treinar forças locais. A idéia em si não é nova, mas pode ser útil para os republicanos se protegerem da ruína da administração Bush.

 

Em sendo ano eleitoral, ela representaria perante a população uma alteração tática, não um possível abandono da estratégia anti-terror. Ao mesmo tempo, os custos materiais e humanos se reduziriam e o interesse em acompanhar a guerra por parte dos meios de comunicação também.

 

Repassar o controle da segurança ao próprio governo iraquiano significaria estabelecer uma transição em que o devido sistema legal poderia demorar para ser de fato implementado, o que facilitaria a repressão a grupos insurgentes.

 

Atualmente, as forças armadas norte-americanas não dispõem de estrutura adequada para processar e julgar os detidos, tanto no Afeganistão como no Iraque. Além do mais, a manutenção de um sistema carcerário, ainda que precário, é bem oneroso.

 

Outrossim, não há contingente disponível para deslocar de frentes de batalha. Assim, recrutam-se cidadãos locais, em muitos casos, sem o treinamento suficiente. Há poucos dias, mais de mil pessoas fugiram de uma prisão no Afeganistão. Desta maneira, uma eventual aplicação do projeto Fênix garantiria, na visão republicana, fôlego para refletir sobre a permanência dos Estados Unidos na região médio-oriental.

 

Virgílio Arraes é professor de Relações Internacionais da UNB.

 

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