Turquia em movimento: manifestações em Istambul e o novo-velho primeiro ministro

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Rodrigo Erib, de Istambul para o Correio da Cidadania
08/09/2011

 

No principal ponto da cidade de Istambul, Taksim, não é preciso esperar muito para presenciar manifestações populares. Jovens reivindicam o direito de votar contra o uso da energia nuclear, panfletam pela independência das universidades públicas e contra o pagamento de taxas para as mesmas; trabalhadores demitidos em massa pelo Burger King, por terem se organizado em sindicato, se postam em frente a uma loja da rede.

 

Outro grupo de estudantes clama vigorosamente por direitos iguais para ingressar na universidade, posto que as respostas do exame vazaram previamente e privilegiaram pessoas da classe dominante e filhos de políticos, num jogo de cartas marcadas. Tudo isso, junto de militantes dos partidos AKP (Partido da Justiça e do Desenvolvimento, na situação há dois mandatos) e CHP (Partido Popular Republicano), faz o clima ser de movimentação política intensa na cidade de Istambul.

 

O CHP (na visão da juventude um partido nas vestes de um PT rosado de 2002) foi a escolha entre os jovens estudantes e estudados em Istambul e Ancara, uma vez que o AKP se mostrou reacionário a ponto de sugerir pacotes de internet específicos para sua população e demonstrou a intenção de controlar a universidade. Mesmo assim, o AKP, com a força do crescimento econômico ao seu favor, obteve 50% dos votos e elegeu o primeiro ministro Tayyip Erdoğan pela terceira vez seguida ao cargo, ou seja, desde 2002 no poder (o primeiro mandato foi de cinco anos).  
  
  

 

A estudante de administração Fulya Çentıbudak, 20 anos, estava em Istambul e voltou para casa, em Ancara, para votar. Mesmo sabendo que as chances do CHP não eram muitas, enfrentou as seis horas de ônibus para a capital turca. O voto é obrigatório na Turquia, mas, segundo ela, quem não comparece não enfrenta grandes problemas. Diz que votou para ajudar a deixar mais claro que nem todos estão contentes com a atual situação e os ideais do AKP. O CHP teve 25% dos votos. Outros 12% foram para os nacionalistas conservadores do MHP, e 7% para a soma dos candidatos independentes organizados sob a sigla BGSZ. O restante foi diluído entre outros 12 partidos, nenhum deles com mais de 10% de votos (mínimo para ser eleito e se manter no Parlamento). 
  
 

 
 

15 anos pra trás

 

A República da Turquia foi fundada em 1923 por Mustafá Ataturk, um militar revolucionário, líder da independência turca e também o primeiro presidente. Seu retrato orna cada sala de aula no país. Ataturk modernizou, "ocidentalizou", fez da Turquia o primeiro país a separar as leis do islã das leis da nação. É uma unanimidade. Falecido em 1938 em decorrência de cirrose, talvez não gostasse muito da proposta do AKP de aumento da idade permitida para consumo de bebidas alcoólicas para 24 anos. 
  
   

 

Os capítulos não acabam por aí. Pré-eleições, o líder do partido CHP, Deniz Baykal, se envolveu em um escândalo sexual: um vídeo dele tendo relações com uma amante no seu escritório foi parar na internet, o que certamente diminuiu as chances do partido, mesmo tendo a sigla trocado de candidato, e mesmo que não tenha sido o único: políticos do MHP também se envolveram em escândalo sexual, para apimentar o tempero da salada turca.  
  
  

 

Os jovens turcos não festejam ou esperam muito de seus representantes na oposição pró-laica, mas certamente temem que o governo de raízes islâmicas do AKP tente impor a religião à sociedade. Na opinião do estudante de engenharia Emre Can Ersoy, 20 anos, "a Turquia vai andar 15 anos pra trás a partir de agora", resume, em tom conformado, logo após o resultado do pleito. E não sabia o que era aquele estrondo ouvido ao longe, já na madrugada do dia 13 de junho da varanda do 6º andar de seu prédio, mas ficou como a batida de um martelo.
 
   

 

Também estudante de engenharia na Middle East Technical University, em Ancara, Berkman Kantar, 21 anos, lembra da história da luta idealista no fim da década de 60 liderada pelo revolucionário ativista político Deniz Gemis, que, após ser preso diversas vezes e ter a sentença de morte decretada, se escondeu na universidade da capital. Fundador do Exército de Liberação Popular da Turquia (THKO), esse marxista - como não poderia deixar de ser - simboliza a revolução pelos direitos populares e é um ícone entre os jovens na Turquia. Filho de um amigo próximo do herói Deniz, Berkman se diz tranqüilo, mas passaria a considerar o temor de um estado ditatorial no caso de nova vitória governista nas próximas eleições.

 

Rodrigo Erib é fotojornalista. 

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