Dorothy Stang, o governo e o agronegócio

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Rodolfo Salm
22/04/2009

 

Foi uma grata surpresa o artigo recente de Frei Betto, no Correio da Cidadania (Dorothy Stang), lembrando os quatro anos da morte da irmã Dorothy, em Anapu (PA). Vejo-a como um mártir da Floresta Amazônica tão importante quanto Chico Mendes, a equivalente paraense do líder seringueiro acreano assassinado. Faz algum tempo que acho que deveria escrever sobre a irmã Dorothy, pois as circunstâncias e implicações de seu assassinato são muito pouco conhecidas do público em geral. Mas o tema da ameaça da construção da hidrelétrica de Belo Monte, um crime de outra natureza, mas igualmente bárbaro e assassino, nesta mesma região, e que ainda pode ser evitado, tomou completamente a minha atenção.

 

Porém, permitam-me fazer uma pequena correção ao texto do colega colunista: no presente momento o Taradão está solto. Realmente, ele foi preso às vésperas do reveillon. Mas ele já foi libertado pela justiça. Além das inquestionáveis críticas de Frei Betto à impunidade e aos projetos da ditadura militar, com suas consequências variadas e desastrosas, a edição do Correio destacou, em sua chamada da capa: "O resultado do júri demonstra a importância de se federalizar casos emblemáticos de violação dos direitos humanos". Concordo com a sugestão.

 

Mas gostaria de adicionar que o governo federal desde o começo teve amplas oportunidades de punir rápida e definitivamente todo o consórcio de fazendeiros responsáveis pelo assassinato da freira. Mas não pôde fazê-lo porque desde o começo teve um vínculo carnal com o agronegócio devastador. Com este casamento com o agronegócio, o governo traiu, também desde o começo, as propostas originais do PT, organizadas pela equipe da então senadora Marina Silva, para a área ambiental. Da mesma forma que a senadora traiu os princípios de Chico Mendes ao criar um instituto com o seu nome para facilitar o trâmite de licitações ambientais.

 

Digo que as circunstâncias e implicações do assassinato da irmã Dorothy são muito pouco conhecidas do público geral, pois pouca gente sabe que no momento em que ela foi morta, em 12 de fevereiro de 2005, a ministra Marina Silva estava a poucos quilômetros de Anapu, na cidade de Porto de Moz, para "resgatar a herança de Chico Mendes" através da implementação da Reserva Extrativista Verde de Sempre. A irmã Dorothy Stang era amiga pessoal de Lula. Então este crime, que parece que foi realmente encomendado por um consórcio de fazendeiros, pode ser entendido como um claro recado ao governo federal de que não interferissem em seus negócios, como a irmã Dorothy heroicamente fazia. Assim sendo, se lhe restasse alguma dignidade, este governo deveria puni-los exemplarmente.

 

Bastava que cumprissem à risca as promessas de campanha originais, fizessem valer a legislação ambiental conforme manda a Constituição, ao invés de manter o IBAMA aqui desequipado e desamparado. Todos os responsáveis pelo crime têm as suas atividades econômicas diretamente ligadas a outros crimes, neste caso de desmatamento, enquadrando-se em vários artigos da Lei de Crimes Ambientais. E teriam suas vidas devastadas ao ver todas as suas terras confiscadas para fins de reforma agrária e reflorestamento. Ao governo, bastava que tivessem levado desde o começo o projeto "Fome Zero" a sério, pois ele, se voltado a uma perspectiva temporal mais ampla, inevitavelmente exigiria a suspensão total e imediata dos desmatamentos atuais, que causarão fome, seca e miséria nas próximas décadas.

 

Rodolfo Salm, PhD em Ciências Ambientais pela Universidade de East Anglia, é professor da Universidade Federal do Pará.

 

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