Regenerar a política

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D. Demétrio Valentini
22/06/2007

 

Neste final de semana o Conselho de Leigos da diocese de Jales reúne vereadores, para um encontro de reflexão.

Assuntos não faltam. A região se vê na iminência de se transformar num grande canavial, tal o ímpeto de implantação de novas usinas para a produção de álcool, bafejado pelos ventos favoráveis dos agrocombustíveis. E está na ordem do dia a reforma política, colocada agora em votação na Câmara Federal.

Os vereadores deveriam ser os primeiros interessados nesta reforma, pois a política tem o seu nascedouro nos municípios. Como no plantio da cana é urgente preservar as nascentes e os córregos, protegendo-os com matas ciliares, assim na política. Se queremos que ela retome vitalidade, é preciso começar por suas raízes. Elas se encontram na participação cidadã em torno das políticas públicas municipais. Ao seu redor é possível estruturar, de maneira organizada, a articulação dos eleitores em torno de causas públicas, que são de interesse comum. Aí nasce a verdadeira política, que pode ir ampliando seu campo de ação, até abranger o âmbito dos respectivos estados e a federação.

Desta maneira, o bem público se tornaria o eixo estruturador da aplicação dos recursos estatais, e se tornaria o antídoto contra a permanente tentação da apropriação indébita desses recursos para interesses particulares, que se traduz na corrupção, que possui um incentivo inato para se desenvolver na medida em que, exatamente, definha a articulação consciente e organizada dos cidadãos em torno das causas públicas.

Quanto menor a participação política dos eleitores, tanto maior o espaço de corrupção. Se queremos estancar a corrupção, não basta punir os corruptos. É preciso ocupar os espaços públicos com políticas adequadas de aplicação dos recursos estatais para causas de verdadeiro interesse comum, definido a partir da formulação conjunta de objetivos públicos. Aí tomam sentido os partidos, que se tornariam protagonistas legítimos da articulação política dos cidadãos.

A reforma política ora em discussão tem o seu foco na Câmara Federal. A tentativa é aprovar uma reforma que não precise alterar a Constituição, dada a dificuldade de conseguir o quórum requerido para mudanças constitucionais.

A grande preocupação é definir a maneira de eleger os deputados federais. A proposta mais próxima de um consenso consiste na votação em listas, que os partidos elaborariam, deixando aos eleitores a opção de votarem numa das listas propostas. Se isto conduzir para o fortalecimento dos partidos, valeria a pena. Mas dá arrepio pensar que as “listas fechadas” acabarão fortalecendo o caciquismo partidário, matando a participação popular.

São evidentes as limitações de uma reforma que não tem a disposição de mudanças fundamentais, pelo medo de enfrentar o quórum constitucional. Corre o risco de parecer mero arranjo conjuntural, para contornar o crescente descrédito do legislativo, em decorrência dos freqüentes escândalos de corrupção que vêm à tona.

 

Do Senado às Câmaras municipais, a política se transformou em escola de barganha do dinheiro público. Desta maneira, perde eficácia o Estado, as instituições se corrompem, e quem leva prejuízo é o povo.

Por mais importante que seja a composição das representações políticas, que se traduzem na composição do Senado e da Câmara Federal, das Assembléias Legislativas e das Câmaras de Vereadores, se não crescer a participação direta e permanente dos eleitores, a política continua exposta às múltiplas formas de corrupção que sempre encontram maneiras de se concretizarem.

Com Nicodemos Jesus foi radical. “É preciso nascer de novo”. Está na hora de regenerar por completo a política. Este o verdadeiro objetivo da reforma, que não deveria se limitar a meros arranjos eleitorais.

 

 

D. Demétrio Valentini é bispo da diocese de Jales.

 

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