PSOL em 2010: candidatura própria ou fim de projeto

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Fernando Silva
11/11/2009

 

Há em caráter público um debate no PSOL e na esquerda socialista e combativa sobre a tática para as eleições de 2010.

 

No PSOL, em particular, surgem o debate e as pressões públicas de uma parcela dos seus dirigentes para que o nosso partido inicie conversações oficiais, através da sua Executiva Nacional, com a pré-candidata do PV, Marina Silva. Este debate não se resume a uma querela de tática.

 

Está em jogo o próprio projeto do PSOL, a razão de ser como um pólo reaglutinador de uma esquerda anticapitalista, combativa, tanto no terreno partidário como no eleitoral e no da disputa dos rumos do movimento de massas e da luta de classes.

 

Está em questão agora se o partido vai manter sua vocação de oposição de esquerda socialista e plural aos dois blocos dominantes da política, tanto o bloco encabeçado pelo tucanato, como o bloco de sustentação do governo Lula, que no poder manteve os pilares da política econômica em vigor no Brasil desde os anos 90 e ainda aceitou de tal forma as regras do jogo institucional da classe dominante que arruinou o próprio PT no balcão dos grandes negócios capitalistas e da corrupção do Estado brasileiro.

 

Contra isso tudo surgiu o PSOL, que não veio para a cena política apenas para encarar conjunturas favoráveis ou "navegar ondas". Surgiu para reapresentar diante das difíceis circunstâncias e da crise na esquerda pós-governo Lula um novo projeto estratégico. Surgiu como ferramenta partidária que, exatamente por ser Partido, tem que vertebrar projeto de poder, para além das flutuações da conjuntura, das vitórias ou derrotas parciais da classe trabalhadora.

 

Pois bem, a tentação de procurar o atalho Marina Silva/PV diante de uma conjuntura que todos reconhecemos como adversa coloca todos esses pressupostos em questão. Marina Silva não é uma ruptura no sentido progressivo da reorganização das forças da esquerda socialista.

 

Senão vejamos: qual será a coerência do nosso partido para explicar que estaria disposto a apoiar uma candidata que defende publicamente 16 anos de diretrizes da política econômica dos mandatos FHC e Lula (em um claro esforço de Marina em dialogar com o bloco do tucanato, onde está, a propósito, boa parte do PV, como no caso dos governos Serra e Kassab em São Paulo)?

 

Qual será a coerência do PSOL para explicar o apoio a uma candidata que se filiou em um partido onde está um dos braços da família Sarney?

 

Qual será a coerência do nosso partido para explicar que apoiaria uma candidatura a presidente que aloja um grupo de capitalistas, grupo este que deverá indicar como vice na chapa o presidente da empresa Natura? Empresa que, por exemplo, abusa da repressão sobre os seus trabalhadores, impedindo-os até de realizar assembléias na porta das suas unidades. A propósito, quem quiser saber um pouco sobre o "compromisso" dos capitalistas "ambientais" da Natura com as condições dos seus trabalhadores pode começar pesquisando o site do Sindicato dos Químicos Unificados de Campinas, Osasco, Vinhedo e regiões (http://www.quimicosunificados.com.br/).

 

Qual será a coerência, por fim, para explicar o apoio a uma candidata que sequer estabeleceu uma ruptura com o bloco político petista que governa o Acre?

 

Os ‘hábeis’ táticos que no partido hoje cogitam ‘apenas’ o apoio formal a Marina, sem a coligação com o PV, esquecem que, aos olhos do povo, nossos mais lúcidos e combativos representantes, incluindo os parlamentares do partido, estariam apoiando na prática e de fato a mesma candidata a presidente que Zequinha Sarney, os parlamentares e os secretários de estado do PV nos governos Serra e Kassab apoiarão.

 

A ruptura de Marina Silva é pontual com o governo Lula, e, com todo o respeito que sua figura pessoal possa merecer, sequer podemos deixar de lado que, nos seus seis anos de participação no governo Lula, compactuou (ou cedeu) com grande parte da política anti-ambiental desse governo.

 

Abrir mão daquilo pelo qual nascemos?

 

Portanto, cogitar o apoio a Marina, em um momento em que o PSOL tem a obrigação e autoridade de aglutinar uma frente autêntica de esquerda e de setores combativos dos movimentos sociais para apresentar a sua visão do balanço da "era Lula", é cogitar abrir mão de ser aquilo para o qual nasceu.

 

A ironia trágica dessa história é que seja a própria presidente do partido, que liderou esse processo de reaglutinação e fundação do PSOL em 2004, a primeira em público a pressionar a direção do partido a comprometer-se com a hipótese Marina.

 

Mas quem pode ter o compromisso de apresentar um programa de defesa das reivindicações da classe trabalhadora, das verdadeiras bandeiras históricas e populares, da defesa coerente da luta pela reforma agrária, do emprego, salário, moradia, da ruptura com a dívida pública e com o sistema financeiro, contra a criminalização dos movimentos sociais e da pobreza, na apresentação de um coerente programa eco-socialista e não limitado a qualquer variante (e ilusão) de "capitalismo ecológico" ou "verde"?

 

Não será Marina Silva e o seu PV que apresentarão tais diretrizes. Se o PSOL abrir mão de cumprir esse papel nas eleições presidenciais, para tentar ser um tipo de "ala esquerda" de uma "onda" de centro-esquerda nestas condições, será do nosso ponto de vista fim de linha para o projeto PSOL, um game over. E, como conseqüência, uma nova dispersão de forças combativas na esquerda socialista nos assombrará já em 2010.

 

O partido tem que se levantar

 

Mas o partido tem reservas, não apenas para apresentar um programa anticapitalista capaz de reaglutinar a frente de esquerda, como tem nomes que podem encabeçar tal jornada, como é o caso da pré-candidatura de Plínio de Arruda Sampaio, cuja amplitude de apoios que vem recebendo na intelectualidade, nos movimentos sociais, setores da Igreja Católica, do sindicalismo combativo e da juventude dá mostras das reservas e possibilidades que o PSOL tem para enfrentar o cenário atual.

 

Outra demonstração das reservas partidárias foi o próprio papel que o PSOL cumpriu, unitariamente, para o êxito do seminário da reorganização sindical e popular e para o fato de que em 2010 teremos a fundação de uma nova Central da classe trabalhadora, com capacidade de ter, além de expressivas parcelas do sindicalismo combativo, a participação de movimentos populares como o MTST.

 

Portanto, a Executiva Nacional do PSOL não pode tomar a equivocada decisão de abrir negociações com Marina Silva.

 

É por acreditarmos que há reservas nas fileiras do partido, nos seus militantes inseridos nas lutas, populares, sindicais, ambientais, estudantis e dos seus mais diversos e ricos setoriais, que o momento é de nos levantarmos em defesa do projeto do PSOL, que no terreno da disputa eleitoral se materializa em uma candidatura presidencial própria com um programa de corte anticapitalista.

 

Ou o PSOL será oposição de esquerda socialista e independente ou não será mais nada que mereça ser lembrado. Impeçamos o desastre!

 

Fernando Silva é jornalista, membro da Executiva Nacional do PSOL e do Conselho Editorial da revista Debate Socialista.

 

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