Paz e guerra na Síria

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Luiz Eça
10/05/2013

 

 

A paz pintou como possível, na Síria. Depois de passar anos rejeitando qualquer acordo na guerra da Síria, sem a renúncia de Assad, os EUA mudaram de posição.

 

John Kerry, o Secretário de Estado, foi a Moscou propor uma ação conjunta EUA/Rússia para acabar com a guerra, através de negociações entre as partes.

 

Os russos, que defendem essa ideia há muito tempo, toparam logo. E os dois países soltaram um comunicado, pedindo a imediata cessação da violência e a formação de um governo de transição, que incluiria elementos do governo Assad e da oposição.

 

Foi uma bomba. França e Reino Unido, que insistem para a comunidade europeia suspender a proibição do fornecimento de armas aos rebeldes, ficaram estarrecidos. Por enquanto, não falaram nada.

 

São escolhas difíceis; tanto recuar, retirando sua insistência bélica, quanto contestar Obama, o farol que costumam seguir.

 

Já os rebeldes não gostaram nem um pouco da marcha à ré norte-americana. Afinal, desde os tempos de Hillary Clinton, os EUA vinham estimulando-os energicamente a não aceitarem menos do que rebelião incondicional dos inimigos, para depor suas armas.

 

Obama cansara-se de afirmar que Assad já era, nem pensar em negociar com ele e sua turma.

 

Ainda recentemente, Kerry havia rejeitado desdenhosamente mais uma tentativa do governo sírio de resolver o conflito numa boa.

 

Impossível, clamou o secretário de Estado, tudo que Assad propõe não passa de enganação.

 

Ainda ouvindo a trovoada de rejeições de Washington, um dos grupos rebeldes, a Coalizão Nacional Síria (CNC), foi diplomático diante da mudança.

 

Declarou que recebia bem a ideia. Só colocou um “mas”, que dizia praticamente o contrário: aceitava, desde que Assad e todo o seu governo renunciassem, unilateralmente.

 

Moaz Al-Khatib, ex-chefe da Coalizão de Oposição Nacional (CON), embora ainda muito influente, também demonstrou ceticismo: “sírios: cuidado para não dilapidarem a revolução em salas de conferências”.

 

Samir Nashar, outro líder da CON, levantou obstáculos: “antes de tomar qualquer decisão, precisamos saber qual será o papel de Assad”.

 

Vai ser parada para os russos e norte-americanos convencerem os rebeldes a se sentarem à mesa com o pessoal de Assad a fim de discutir a divisão do governo de transição entre eles. Mesmo havendo a renúncia do presidente, que Obama exige e a Rússia ainda reluta em engolir.

 

Enquanto procuram por pra frente suas propostas pacíficas, os EUA não deixam de tocar sua “outra guerra síria”.

 

Aqui o inimigo é a Al-Qaeda, firmemente enraizada na rebelião, através de seu associado, o Al-Nusra.

 

Esse movimento tem cerca de 10 mil milicianos enfrentando o governo Assad de armas nas mãos. E com atentados à bomba, inclusive suicidas, tomando como alvo chefes e edifícios das hostes de Assad.

 

Os EUA quiseram abafar logo a expansão desse perigosíssimo pessoal. No ano passado, lançaram seu primeiro míssil contra o al-Nusra, ao condenarem o movimento como terrorista.

 

Não deu certo. Muitas brigadas do exército rebelde defenderam o Al-Nusra, ressaltando sua eficiência e combatividade, em comparação com os norte-americanos, que se limitam a prestar ajuda não-letal, negando as tão desejadas e necessárias armas.

 

Mas os EUA não desistiram: continuaram a agir contra o movimento terrorista, procurando jogar contra ele os rebeldes seculares e islâmicos moderados.

 

Segundo relato de comandante rebelde ao jornalista Phil Sands, oficiais estadunidenses, na Jordânia, mostram-se mais interessados em destruir o Nusra do que o próprio regime Assad.

 

Falaram em usar drones para atacar cidades sírias e em recrutar milicianos para lutar contra os terroristas.

 

O comandante respondeu que as forças oposicionistas deveriam se unir para poder enfrentarem o exército de Assad, mais armado e poderoso, em vez de lutarem entre si.

 

Os oficiais dos EUA não se convenceram e afirmaram que, se os sírios moderados não matassem os terroristas do campo rebelde, eles, norte-americanos, fariam isso.

 

Não será brincadeira, pois os associados da Al-Qaeda estão cada vez mais fortes.

Comandantes da FSA (Exército Sírio Livre) informam que unidades inteiras passaram-se para o Al-Nusra.

 

“Os combatentes sentem-se orgulhosos por terem aderido ao Nusra porque isso significa poder e influência”, explica Abuy Ahmed, um desses comandantes. “Seus milicianos raramente recuam por falta de munições ou de tropas”.

 

Ele conta que o FSA perdeu muitos soldados para o Nusra nas regiões de Alepo, Damasco, Hama, Idib, Dair e Zor.

 

Somente nos últimos meses, nada menos do que 3.000 deles trocaram o FSA pelo movimento terrorista.

 

É duvidoso que os EUA consigam que uma parte substancial dos rebeldes volte suas armas contra os incômodos radicais.

 

Ainda que sírios seculares e islâmicos moderados não gostem nada deles, precisam do Nusra para derrotar o forte exército de Assad.

 

Talvez por ter percebido a caixa de Pandora que ajudou a abrir, Obama tenha resolvido passar de falcão a pomba da paz.

 

Um futuro governo sírio dividido com a facção de Assad seria um mal menor do que a Al-Qaeda e o Al-Nussra participando do poder.

 

Evidentemente, os terroristas são contrários a uma paz negociada com os adversários. Sabem que é através da guerra que suas forças e sua influência na rebelião tendem a ficar cada vez mais fortes.

 

Obama teria de usar todo o seu poder para levar os seculares e islâmicos moderados, que ainda são maioria, a aceitarem um acordo com o os odiados donos do regime.

 

Provavelmente, terá o apoio da Arábia Saudita, Qatar e mesmo do Reino Unido e da França (vão acabar se conformando, satélite é pra isso mesmo).

 

Isolados, os rebeldes poderão talvez acabar topando o paix de braves russo/norte-americano.

 

Acredite se quiser.

 

Luiz Eça é jornalista.

Website: Olhar o Mundo.

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