Hiroshima e Nagasaki: por que?

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Luiz Eça
10/06/2016

 

 

 

 

Na visita de Obama a Hiroshima, em 27 de maio, os jornais norte-americanos especulavam que ele poderia pedir perdão aos japoneses.

 

O presidente preferiu falar sobre o terror das bombas nucleares e expressar sua esperança num mundo sem elas.

 

Isso satisfez os moradores, inclusive alguns sobreviventes, que não estavam mesmo fazendo questão de pedidos de perdão. O que lhes interessava é que o presidente norte-americano prometesse dar o máximo do seu imenso poder para acabar com a arma que tanta dor levara a Hiroshima.

 

Keiji Tsuchyia, que sobreviveu à bomba, expressou a confiança geral: “sinto que (Obama) renovará seu compromisso com a busca de um mundo sem armas nucleares ao ver as consequências trágicas aqui”.

 

Bem, talvez não confiasse tanto se soubesse que Obama foi o presidente norte-americano pós-Guerra Fria que menos reduziu o estoque nuclear do país (New York Times, 26/5).

 

A bomba atômica foi lançada em Hiroshima sob os auspícios do governo Truman, em 6 de agosto de 1945.

 

Nesse dia, 70 mil habitantes da cidade foram mortos e nos dois meses seguintes novas vítimas foram acrescentadas, atingindo o total de 145 mil.

 

Três dias depois chegou a vez de Nagasaki, onde 75 mil japoneses foram mortos pela bomba atômica durante dois meses, sendo que 40 mil morreram no seu lançamento.

 

Nos dois casos, os EUA cometeram crimes de guerra por terem usado força excessiva e, principalmente, por ataques atingirem preferencialmente civis.

 

Nas duas cidades, não havia objetivos militares importantes. Os homens válidos tinham sido convocados para a guerra, ficando apenas velhos, mulheres e crianças.

 

É verdade que em Hiroshima havia uma base militar nos arredores da cidade. Mas não foi ela o alvo selecionado pelos estrategistas da aviação estadunidense. A bomba foi lançada sobre o centro da cidade, onde havia a maior concentração de pessoas.

 

Por isso mesmo, a grande maioria das vítimas eram civis: velhos, mulheres e crianças.

 

O governo Truman alegou, e seus sucessores jamais negaram, que o sacrifício de 145 mil pessoas em Hiroshima provocou a rendição do Japão, salvando um milhão de soldados norte-americanos de morrerem caso a guerra continuasse.

 

Essa solução faz lembrar os sacrifícios humanos praticados por certas tribos selvagens para agradar seus deuses e assim conseguir o fim de longas secas que estavam matando de fome a população.

 

Ao repetir esse precedente, o presidente Truman, numa erupção de entusiasmo patriótico, chamou o lançamento da bomba atômica sobre Hiroshima: “o maior acontecimento da história”.

 

Com o que certamente não concordariam as vítimas inocentes de Hiroshima e Nagasaki, especialmente porque seu sacrifício foi em vão.

 

Há fortes indicações de que apelar para esse recurso fatal foi desnecessário, pois os japoneses estavam prontos para se renderem.

 

Seis dos oito oficiais de cinco estrelas existentes em 1945 – os generais Dwight Eisenhower, Douglas MacArthur e Henry Arnold e os almirantes Willian Lehay – qualificaram o bombardeio atômico das cidades japonesas como militarmente desnecessário ou moralmente condenável. Ou ambos.

 

Leahy, que foi o chefe do gabinete militar de Truman, escreveu em suas memórias que “os japoneses já estavam derrotados e prontos para se renderem... O uso dessas bárbaras arma em Hiroshima e Nagasaki não foi de ajuda material na nossa guerra contra o Japão”.

 

Em maio, três meses antes do bombardeio nuclear, MacArthur, por muitos tido como um “falcão”, disse ao ex-presidente Hoover que se os EUA garantissem aos japoneses que poderiam manter o imperador, eles se renderiam alegremente.

 

Apesar de Truman ter ignorado esta concessão, depois da rendição e ocupação do Japão, o governo militar norte-americano permitiu que o imperador continuasse desempenhando suas funções como antes da derrota.

 

O general Eisenhower, que posteriormente presidiu os EUA, opôs-se à decisão mortífera de Truman.

 

Dezoito anos depois, declarou à revistas Newsweek: “não era necessário atacá-los (os japoneses) com aquela coisa aterradora”.

 

O General Henry Arnold, comandante da força aérea na 2ª Grande Guerra, escreveu: “sempre nos pareceu que, com ou sem bomba atômica, os japoneses já estavam na beira do colapso”.

 

O ataque nuclear a Hiroshima teria ainda outra motivação, segundo estudiosos do assunto como Gar Alperowitz: evitar que os russos invadissem e se instalassem no Japão.

 

Eles já estavam chegando perto, tendo acabado de tomar a Manchúria, que estava sob domínio das tropas do Sol Nascente.

 

Já de olho numa próxima disputa com a então União Soviética pela hegemonia mundial, os EUA queriam que o Japão se rendesse a eles, passando para o controle das mãos de Tio Sam.

 

De qualquer maneira, o correto, como dizem comandantes norte-americanos, seria aceitar a rendição, sem tirar o imperador do seu trono como o governo de Tóquio pedia (o que acabaram topando depois que a guerra acabou).

 

Isso pouparia as vidas de centenas de milhares de pessoas em Hiroshima e Nagasaki, pois a bomba atômica não precisaria ser usada.

 

Embora haja argumentos (discutíveis) em favor do ataque a Hiroshima, não houve justificação alguma para o que se fez em Nagasaki.

 

As fúrias do inferno caíram nesta cidade no fim da manhã de 9 de agosto; 40 mil mortos de imediato e mais 75 mil até se completarem dois meses, totalizando 115 mil vítimas, foi o saldo dessa operação, fora os muitos feridos que anos afora sofreram as consequências mortais da operação.

 

A pergunta que não quer calar é: POR QUÊ?

 

Por que Nagasaki, depois dos horrores de Hiroshima deixarem os japoneses, já apavorados, não verem a hora de hastear a bandeira branca?

 

Foi um crime sem causa, desses que surgem por vezes na crônica policial, praticados por sociopatas ou psicopatas, que matam por matar

 

Os líderes japoneses só foram informados do massacre de Hiroshima no fim da tarde do dia 6.

 

Imediatamente, ordenaram a reunião do Conselho Supremo para discutir a rendição que todos queriam.

 

No dia 9, eles já estavam reunidos especificamente para discutir a rendição, quando as explosões ocorreram em Nagasaki.

 

Os EUA estavam ansiosos, não podiam esperar nem mais um dia. Resolveu-se lançar uma nova bomba para apressar os japoneses a hastearem a bandeira branca.

 

Em entrevista à revista Harper’s, em 27 de maio deste ano, o expert Gar Alperowitz diz outra coisa: “a explicação era que foi uma decisão automática. A decisão tinha sido de usar (a bomba em Nagasaki) quando estivessem prontos. Penso que os cientistas e também os militares queriam testar a segunda bomba”.

 

Portanto, tratava-se de um teste. E os japoneses de Nagasaki foram usados como cobaias.

 

Usar judeus em testes de experiências médicas, em vez de ratinhos, foi o que tornou repulsivamente famoso o dr. Mengele.

 

E pelas muitas mortes e sofrimentos bárbaros que causou, o chamado “Anjo da Morte” foi considerado um dos maiores criminosos nazistas de guerra.

 

Mas como numa guerra os vencedores nunca são condenados, a tragédia de Hiroshima e Nagasaki e o bombardeio inglês com bombas de fósforo que matou 60 mil civis alemães em Dresden, cidade sem alvos militares, passaram em banco.

 

Assim caminha a humanidade.

 

 

Luiz Eça é jornalista.

Website: Olhar o Mundo.

 

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