O voto ingênuo

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Frei Betto
08/09/2014

 

 

 

Candidato, vocábulo que deriva de cândido, puro, íntegro. Quem dera a maioria correspondesse a essa etimologia... A ingenuidade de muitos candidatos se desfaz quando, convidados a concorrerem às eleições, acreditam que, se eleitos, não serão “como os outros” (quantos não disseram isso no passado; e hoje...) e prestarão excelente serviço à nação.

 

O que poucos candidatos desconfiam é que servem de escada para a vitória eleitoral de políticos que eles criticam. Para se eleger é preciso obter quociente eleitoral – aqui reside o pulo do gato.

 

Cândidos eleitores imaginam que são empossados os candidatos a deputados que recebem mais votos. Ledo engano. João pode ser eleito ainda que receba menos votos do que Maria. Basta o partido de João atingir o quociente eleitoral.

 

É muito difícil um único candidato obter, sozinho, votos suficientes para preencher o quociente eleitoral. Casos como o do palhaço Tiririca, em São Paulo, são raros. A Justiça Eleitoral soma os votos de todos os candidatos do mesmo partido, mais os votos dados apenas ao partido, sem indicação de candidato.

 

Se você pensa em votar em tal candidato, fique de olho. Pode ser que ele sirva de degrau para a ascensão de candidatos cuja prática política você condena, como a falta de ética. Enquanto não houver reforma política, o sistema eleitoral funciona assim: muitos novos candidatos reelegem os mesmos políticos de sempre!

 

Se você é, como eu, apenas eleitor, saiba que escolher o partido é mais importante que escolher o candidato. Votar de olho somente no candidato pode resultar, caso ele não seja eleito, na eleição de outro candidato do partido.

 

Como alerta o sociólogo Pedro Ribeiro de Oliveira, “mais frequente, porém, é a derrota e a frustração de pessoas bem-intencionadas, mas desinformadas. Ao se apresentarem como candidatas, elas mobilizam familiares, amigos e vizinhos para a campanha. Terminadas as eleições, percebem que sua votação só serviu para engordar o quociente eleitoral do partido ou da coligação... Descobrem, tarde demais, que eram apenas ‘candidatos alavancas’”.

 

Convém ter presente que o nosso voto vai, primeiro, para o partido e, depois, para o candidato.

 

Hoje, devido aos vícios de nossa estrutura política, muitos partidos não seguem os programas que adotam, e raros candidatos conhecem as propostas contidas nos documentos dos partidos que lhes dão apoio. E nem todos os candidatos são tão sinceros como um de Goiás que, candidato a deputado estadual, declarou sem o menor constrangimento: “Quero mesmo é melhorar a minha vida pessoal”.

 

São muitos os candidatos que, na verdade, não se importam, uma vez eleitos, em representar os eleitores. Tornam-se representantes das empresas que os elegeram canalizando recursos financeiros à campanha. Diz o ditado que, no Brasil, quem vota é a pessoa física, mas quem elege é a pessoa jurídica...

 

Portanto, vote sem ingenuidade. Vote consciente!

 

 

Frei Betto é escritor, autor de A mosca azul reflexão sobre o poder (Rocco), entre outros livros.

Website: http://www.freibetto.org

Twitter:@freibetto.

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