Lições do pedágio

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Wladimir Pomar
19/07/2012

 

 

O Estadão publicou notícia de que, desde o início da crise financeira internacional, o governo brasileiro abriu mão de 26 bilhões de reais em impostos para a indústria automotiva. Ao mesmo tempo, esse setor teria criado apenas 27.753 novas vagas de trabalho, cada uma das quais equivaleria a um custo de cerca de 1 milhão de reais em renúncia fiscal.

 

Ainda segundo o Estadão, essas medidas de estímulo à venda de automóveis teriam proporcionado às multinacionais automotivas remeterem para suas matrizes, nos últimos três anos e meio, 14,6 bilhões de dólares, na forma de lucros e dividendos. Portanto, esses lucros e dividendos exportados corresponderiam quase ao montante do valor que as empresas deixaram de pagar em impostos.

 

O Estadão, conhecido defensor das multinacionais, se dá ao luxo de tentar criar cizânia no seio do governo, ao afirmar que vários gabinetes governamentais criticaram a falta de contrapartidas ambientais, de geração de empregos e de investimentos pelas empresas, na adoção daquelas medidas pelo governo. Tais medidas teriam demonstrado a forma atabalhoada com que o governo lida com as montadoras e teriam levado o consumidor brasileiro a pagar um preço salgado para ajudar o setor.

 

Em outras palavras, como havíamos alertado quando o governo decidiu, inicialmente, elevar o IPI dos veículos importados, a ajuda a esse setor oligopolizado não só é inoperante do ponto de vista econômico, como representa um alto custo político. Do ponto de vista econômico, a esse setor só interessa manter seu oligopólio e praticar preços administrados. Tanto que, além de criarem um número irrisório e caro de empregos, as montadoras elevaram imediatamente os preços dos veículos, o que levou a uma queda acentuada na venda de caminhões. Algumas delas já falam em paralisar linhas de montagem e incentivar demissões voluntárias.

 

Do ponto de vista político, o Estadão e as forças conservadoras que ele apoia estão simplesmente cobrando um alto pedágio por uma decisão que esperam não ter retorno. Principalmente por isso, o governo talvez tenha que redobrar seu ímpeto para redirecionar seus esforços na criação de novos postos de trabalho para aqueles setores empresariais médios e pequenos que realmente têm condições de gerar empregos e mantê-los por um longo período, elevando a massa salarial e o poder de consumo da população; 26 bilhões de reais direcionados para empresas desse tipo certamente teriam resultado num aumento muito maior de novos trabalhadores.

 

Além disso, em relação aos setores oligopolizados, a linha mestra do governo precisa se concentrar no aumento da concorrência, ou da competição, e não em isenções fiscais ou em apoio à manutenção do sistema de oligopólio. Neste caso, não se duvide que, mais cedo ou mais tarde, o Estadão e as forças que defendem a ajuda às montadoras façam críticas duras ao governo, por prejudicar um setor considerado estratégico para a indústria do país. Mas além de se confrontarem com os resultados econômicos reais advindos da democratização econômica do setor, não poderão cobrar qualquer tipo de pedágio político.

 

O governo parece haver aprendido essa lição e estar delineando uma nova política para o setor, que obrigue as montadoras estrangeiras localizadas no Brasil, pela própria concorrência do mercado, a baixar seus preços e elevar a qualidade de seus produtos. Elas precisam provar o próprio amargor da competição capitalista, que vivem proclamando, mas substituem pelo monopólio e oligopólio. O que é verdade não só para o setor automobilístico, mas também para vários outros setores que dominam a economia brasileira.

 

Wladimir Pomar é escritor e analista político.

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