Política econômica subalterna põe Brasil na ‘linha de tiro’ da crise internacional

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Léo Lince
15/02/2008

 

A crise do capitalismo global deixou de ser um tema restrito ao debate da esquerda. O assunto, agora, está na pauta geral. O que os próprios capitalistas e seus intelectuais orgânicos se ocupam em discutir são as dimensões, o tamanho, a profundidade e duração da crise. Até porque os acontecimentos não deixam margem para dúvidas. Turbulência generalizada, gangorra vertiginosa das bolsas, retração geral nos investimentos, pânico nos mercados. Enfim, um quadro típico.

 

O epicentro da turbulência, ao contrário dos surtos anteriores, desta vez se localiza no cerne do sistema. O império americano, entre Osamas e Obamas, vive dias de Pompéia. A "exuberância irracional" do Greenspan mostra, no colapso imobiliário, a sua contraface tenebrosa. A papelada financeira desaba feito um castelo de cartas. E o desastre da era Bush fornece ilustração perfeita para a tese do professor Immanuel Wallerstein: o declínio americano como foco da crise.

 

George Soros, que sabe tudo no ramo da especulação e ostenta a reputação de analista astuto, compara o poder de destruição do quadro atual ao dos abalos produzidos pela crise mundial de 1929. Muita coisa, além dos papagaios financeiros, já rolou por água abaixo. Uma delas é o mito ultraliberal de que o capital é capaz de se auto-regular. Balela. Fora do controle social (público e democrático), o poder privado funciona com a lógica das máfias. Desregulada, a supremacia absoluta do capital financeiro libera o ímpeto destrutivo que sempre habitou a natureza cíclica do capitalismo.

 

O mundo do trabalho que se acautele, pois as receitas de saída da crise serão as mesmas de sempre. Os poderosos, que na prosperidade se serviram do aparato do Estado para privatizar lucros, agora se valerão dele para socializar prejuízos. Basta ver a quantia bestial de dinheiro que os bancos centrais do primeiro mundo já injetaram na roleta do cassino. A crise abre um período de luta política onde, além dos financeiros, estarão em jogo os valores do processo civilizatório.

 

A economia brasileira não está "descolada" da crise. Pelo contrário, a subalternidade do modelo vigente aos esquemas da globalização financeira nos coloca na linha de tiro. Há os que, por dever de ofício, buscam dourar a pílula e há também aqueles que, com os fundilhos presos nas tábuas do circo, gritam: "senta que o leão é manso". O Banco Central já inverteu a tendência de queda nos juros. Os brasileiros desencantados que foram "fazer a América" estão voltando de mãos abanando. Investimentos menores, PIB menor, corte nos gastos sociais, congelamento de salários, infelizmente, são os anúncios para o ano novo. A crise chega das formas mais variadas e em ondas cada vez mais fortes.

 

Quando o verbo crackar começa a ser conjugado nos países centrais, os que vivem do trabalho e os países da periferia do capitalismo precisam ter cautela redobrada. Barbas de molho, vale lembrar Oswald de Andrade. Ao abrir falência com a crise de 1929, ele retrucou com versos: "eu empobreço de repente/tu enriqueces por minha causa/ ele azula para o sertão/ nós entramos em concordata...". E lamentou, alertando aos pósteros, só ter sabido na crise o quanto era irregular a conjugação do verbo crackar.

 

Léo Lince é sociólogo.

 

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