Correio da Cidadania

‘Cabe indenização do Estado às vítimas de prisão preventiva baseada em provas falsas’

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Os manifestantes presos por ocasião da Copa do Mundo vão sendo soltos e, apesar dos resquícios que a ação do Estado deixará à reflexão posterior, as pautas políticas começam a ser trocadas, especialmente com o aquecimento da campanha eleitoral. O Correio da Cidadania colheu algumas ponderações do jurista Celso Antonio Bandeira de Mello a respeito do atual momento.

 

“Não tinha sentido nem a repressão nem a prisão preventiva. Se não está se fazendo baderna, não tem por que prender. E as provas contra eles eram falsas, o que tampouco me causa estranhamento, pois a polícia juntar provas falsas não é novidade. Agora, cabe a indenização do Estado às pessoas vítimas de falsidades”, analisou o jurista.

 

Ainda nesse sentido, Bandeira de Mello se mostra tranquilo sobre a postura do poder judiciário em meio à efervescência dos manifestos, além de confiança na atuação da OAB, a despeito das críticas recentes de movimentos sociais. Sobre a eleição, volta a atacar a cobertura midiática, mas acredita em uma vitória de Dilma já no primeiro turno.

 

A entrevista completa pode ser lida a seguir.

 

Correio da Cidadania: Qual a sua avaliação do cenário do país pós-Copa do Mundo, com os variados protestos sociais que se espalharam pelas cidades sede, especialmente Rio e São Paulo, e a reação de governos e respectivas polícias às manifestações?

 

Celso Antonio Bandeira de Mello: Manifestação é a coisa mais normal que existe no estado democrático de direito. Mas depredação não é normal. Minha visão é de que alguns manifestantes foram um pouco além. Não quer dizer que todo mundo que foi à rua passou do limite da democracia, mas alguns, sim. Sou contra depredações, mas as manifestações são mais do que normais, não vejo nada de estranho nelas. De modo geral, sempre que os governos se deparam com alguma violência ficam ressabiados e respondem com mais violência ainda. Infelizmente, é a realidade e aconteceu.

 

Correio da Cidadania: As prisões do funcionário da USP Fábio Hideki e também de Rafael Lusvarghi, em manifestação no dia da abertura da Copa, ganharam forte repercussão. Teria algum comentário para o caso específico, que caberia nesse contexto analisado?

 

Celso Antonio Bandeira de Mello: Nunca se sabe se são verdadeiras as notícias que vemos, dado que só sabemos delas através dos jornais. Como não acredito na mídia, não sei se é verdade ou mentira. E pelo que vemos, as provas eram falsas. Não tinha sentido nem uma coisa nem outra, nem a repressão nem a prisão preventiva. Se não se está fazendo baderna, não tem por que prender. E as provas contra eles eram falsas, o que tampouco me causa estranhamento, pois a polícia juntar provas falsas não é novidade. Agora, cabe a indenização do Estado às pessoas vítimas dessas falsidades.

 

Correio da Cidadania: Ou seja, o Estado deve reparação no caso em questão, com prisões preventivas decorrentes de repressão e provas forjadas.

 

Celso Antonio Bandeira de Mello: Sim. Mas tudo depende. Não se pode ter uma opinião única. Se se fazem badernas e se apresenta o perigo de que sejam feitas novamente, compreende-se a prisão preventiva. Se não estavam fazendo nada os manifestantes, não tem obviamente sentido algum a prisão preventiva.

 

Correio da Cidadania: E qual a sua opinião quanto à forma que o poder judiciário, de uma forma geral, tem lidado com esta conjuntura?

 

Celso Antonio Bandeira de Mello: Pela informação aberta ao público, diria que o judiciário tem andado bem, a exemplo da liberação dos ativistas. É uma questão de fatos. Só os fatos podem nos autorizar conclusões.

 

Correio da Cidadania: O que diria da atuação que vem tendo uma instituição como a OAB nestas circunstâncias? Qual deveria ser o seu papel?

Celso Antonio Bandeira de Mello: Eu tenho muito respeito pela atual direção nacional da OAB, de modo que tudo que disserem, em princípio, estou de acordo. O papel da OAB deve ser de fiscalização muito ativa, para evitar duas coisas: violências desnecessárias e repressão excessiva. A atuação da OAB tem de ir nesse sentido, e creio que tem sido assim.

 

Correio da Cidadania: Você diria que as leis e normas de segurança adotadas para garantir a Copa do Mundo e os recentes episódios de repressão de governos e respectivas polícias deixarão um legado de suspensão de direitos civis para a nossa cidadania?

 

Celso Antonio Bandeira de Mello: Não creio, acho improvável. O governo tinha de impedir aqueles que queriam emperrar a Copa do Mundo. As leis que temos não são excessivas, e sim as condutas administrativas.

 

Correio da Cidadania: Em que medida e como esta conjuntura poderá influenciar, a seu ver, o cenário eleitoral? Arrisca algum palpite para estas eleições?

 

Celso Antonio Bandeira de Mello: Creio que está tudo se normalizando. Em minha opinião, a Dilma deve ganhar no primeiro turno. As manifestações estão acalmando, aquele momento passou.

 

As pessoas têm o direito de se manifestar. E eu mesmo era contra a organização da Copa no Brasil. Mas acredito que o país tem feito o possível, e acho que o governo federal faz o possível, milagre ninguém faz. Por isso vejo a Dilma muito bem cotada, e imagino que ela vá, como disse, ganhar no primeiro turno, embora a imprensa faça de tudo para parecer que não, a todo momento tentando desmoralizar o governo.

 

Mas a grande imprensa é isso mesmo: porta-voz dos interesses das classes dominantes e domesticadora do pensamento das classes dominadas.

 

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Gabriel Brito é jornalista; Valéria Nader, jornalista e economista, é editora do Correio da Cidadania.

Comentários   

0 #1 Princípios da Administração PúblicaCandido Volmar 16-08-2014 12:49
Bandeira de Mello separa claramente o que é Lei e o que é Arbitrariedade, pelos princípios constitucionais da Administração Pública. O princípio da LEGALIDADE determina que a polícia não pode fazer nada além do que está previsto pela lei; o princípio da MORALIDADE condiciona as ações da polícia à prisões somente em caso de absoluta necessidade, sem forjar provas; o princípio da RAZOABILIDADE impede que o policial atire para matar, quando é possível agir de outra forma, etc.
Ora, na USP/FFLCH, um atentado completo aos direitos humanos e aos princípios da Administração Pública conta com a cumplicidade absoluta de alunos, professores e “ativistas”, sem motivação e sem justificativa de nenhum desses grupos. A aluna foi desligada de modo arbitrário, sem seguir nenhum artigo do Regimento, contra o princípio da LEGALIDADE; foi banida, quando apresentou denúncias graves, contrariando o princípio da MORALIDADE; as respostas da coordenação foram todas elas absurdas e um amontoado de irracionalidades e incongruências, contrários ao princípio da RAZOABILIDADE; o princípio da PUBLICIDADE das ações foi quebrado de todas as maneiras possíveis: “investigação” extra-oficial, à margem da lei (como no pior momento da Ditadura Militar), Portaria Secreta e até mesmo o SIC recebeu a missão de ignorar (sem justificar!) os pedidos de informação solicitados pela impetrante! A USP DÁ UMA AULA DE DITADURA EM TODOS OS SENTIDOS APONTADOS POR BANDEIRA DE MELLO, MAS AS VÍTIMAS DAS ARBITRARIEDADES DO GOVERNO DO ESTADO SÃO OS ALGOZES ENCARREGADOS DE ENCOBRIR UMA SÉRIE DE CRIMES contra a pessoa e contra a Administração Pública.
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