Correio da Cidadania

Plínio e a ética na política

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Alguns guerreiros estão nos deixando: Dom Tomás Balduino, Dom Waldyr Calheiros, Rubem Alves e agora Plínio de Arruda Sampaio. Para todos estes – e para um punhado de outros – a bandeira da ética na política estava na ordem do dia. Sequer lhes precisava manifestar abertamente a temática. Ela vinha implícita em seus gestos, palavras, posturas e obras. Impregnava-lhes a vida pública como uma espécie de segunda natureza. Boa parte do século XX e início do século XXI foram palco privilegiado de sua ação pela justiça, pelo direito e pela paz.

 

Mas o último deles – Plínio de Arruda Sampaio – fez dessa bandeira um verdadeiro sacerdócio de toda a sua vida. Homem político por longas décadas, extremamente preocupado com a rex publica, combateu como poucos em favor uma via alternativa ao destino do Brasil. Crítico vivo e ativo de uma política econômica subordinada aos interesses do capital financeiro nacional e internacional, do latifúndio vazio e improdutivo e do agronegócio a serviço do lucro de algumas empresas, bem como dos conglomerados transnacionais, o velho Plínio deixou sua marca de cidadão empenhativo e engajado.

 

Com veemente teimosia profética, lutou por uma maior regulação dos fluxos de capital virtual, os quais, entrando e deixando o país com a velocidade de um toque na tecla do computador, costumam deixar atrás de si um rastro devastador de danos à nação e ao povo. Transformou-se em arauto defensor da reforma agrária e agrícola, mas seu projeto não encontrou boa aceitação naqueles que então detinham as rédeas do poder. Com uma persistência intrépida e indomável, fez de seu tempo e de sua clarividência científica instrumentos de conscientização de grupos, organizações de base, entidades, pastorais, Igrejas, movimentos sociais...

 

De uma forma impressionante, Plínio soube combinar uma postura firme e radicalmente transformadora com um trânsito bastante livre e frequente entre as mais diversas posições políticas. Intransigente naquilo que é inegociável e, ao mesmo tempo, aberto ao diálogo e à colaboração nos pontos de convergência. Incisivo nos argumentos, sem necessidade de ser autoritário; flexível no debate, sem jamais abandonar seus princípios básicos; duro e implacável com os fortes e poderosos, terno e compreensivo com os pobres, indefesos e excluídos.

 

A marca registrada do cientista, professor e político Plínio, entretanto, centra-se na ética quanto ao manejo das questões públicas. Seguir e exprimir publicamente os princípios de retidão e integridade fazia parte de seu DNA. Semelhante comportamento, como é notório, granjeou-lhe aprovação e não poucos amigos e companheiros, é verdade, mas também acarretou-lhe hostilidade e outros tantos opositores. Sua voz, porém, sempre mansa, calma, mas penetrante como faca afiada, jamais silenciou diante das adversidades e perseguições.

 

O velho guerreiro Plínio de Arruda Sampaio, juntamente com seus similares em grandeza ética e envergadura política, partiu como um fruto maduro em experiência e sabedoria. Mas nos legou uma estátua – não em bronze, erguida ostensivamente no meio da praça central, como relíquia de museu para toda a cidade – mas na memória viva de todos os lutadores que buscam um mundo justo, solidário e sustentável. Na lembrança daqueles que, como o apóstolo Paulo, sem orgulho nem falsa modéstia, ao final da vida podem erguer a cabeça e dizer: “combati o bom combate, terminei minha carreira, guardei a fé; só me resta esperar a coroa da justiça que me está destinada” (2Tm 4, 7-8).

 

Padre Alfredinho é formado em teologia e filosofia e colabora com a Pastoral do Migrante da CNBB.


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