Correio da Cidadania

Plínio, o bom combate

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Em tempos de fracasso da seleção brasileira na Copa e de eleições, convém manter vivo o exemplo de Plínio de Arruda Sampaio, de quem fui amigo e discípulo.

 

Ele poderia ter repetido o que disse Antonio Callado em sua última entrevista: “Sempre lutei do lado certo e perdi todas as batalhas”. Seria um exagero, já que Plínio participou da luta contra a ditadura, da criação do Cedec (Centro de Estudos de Cultura Contemporânea), da fundação do PT, da Constituinte de 1988, da direção do jornal Correio da Cidadania e da fundação do PSOL.

 

Porém, transvivenciou sem ver seu maior sonho realizado: a reforma agrária no Brasil. Neste quesito, ele poderia fazer eco a Darcy Ribeiro: “Fracassei em tudo o que tentei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu”.

 

Plínio, como tantos políticos brasileiros, iniciou sua militância na Ação Católica. Era discípulo do padre Lebret, dominicano francês, fundador do movimento Economia e Humanismo.

 

Parlamentar pelo PDC, cassado em 1964 pela ditadura, exilou-se no Chile e nos EUA. Eleito deputado federal, atuou como constituinte petista em 1988, e foi candidato a presidente da República pelo PSOL, em 2010. Primou pela coerência com seus princípios evangélicos e ideológicos. Como dizia, não foi ele quem se afastou dos partidos a que esteve filiado, foram os partidos que se afastaram dele.

 

Sabemos todos que, sem reforma, a política brasileira continuará se destacando como caso de polícia, em decorrência de tanto nepotismo, malversação e corrupção, acrescidos de impunidade e subserviência ao poder econômico. Política no Brasil é como salsicha: melhor não saber como se faz.

 

Plínio, no entanto, sabia. E protestava contra as maracutaias, as alianças espúrias, o toma-lá-dá-cá. Seu fio de prumo não era uma teoria política ou um programa partidário. Era o amor aos pobres. Em se tratando de sem-terra, sem-teto, sem transporte ou moradia, e outros direitos essenciais, ele punha as mãos na massa.

 

Não era político de gabinetes, salões e conchavos regados a bebidas caras. Pedisse a ele participar de uma reunião de adolescentes, fazia-se presente com seu sorriso cândido, a fala mansa, os olhos arregalados ao enfatizar ideias, a gesticulação ponderada e, sobretudo, a lucidez sustentada pelo raciocínio ágil e prodigioso. Aos 82 anos, como se tivesse 28, misturou-se aos jovens manifestantes na Avenida Paulista, em junho de 2013.

 

Sua morte deixa um legado a todos que alimentamos nossas vidas na direção de utopias libertárias. De imediato, prosseguir na luta por reforma agrária. Jamais esquecer o que disse o papa João Paulo II ao presidente Sarney, em julho de 1986: “No Brasil não haverá democracia enquanto não houver reforma agrária”.

 

Plínio esperava participar também da convocação de uma Constituinte Exclusiva para promover a reforma política. Resta-nos homenageá-lo mobilizando a nação a manifestar-se a favor no plebiscito da Semana da Pátria.

 

A ele se aplicam as palavras do apóstolo Paulo em carta a seu companheiro Timóteo: “Chegou o tempo de minha partida. Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. Desde já me está reservada a coroa da justiça, que me dará o Senhor” (2 Tim. 4, 6-8).

 

 

Frei Betto é escritor e assessor de movimentos sociais, autor de “Reinventar a vida” (Vozes), entre outros livros.

Website: http://www.freibetto.org/

Twitter: @freibetto.

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