Correio da Cidadania

Um pouco do mundo Real

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Alguns cronistas consideram incompreensível o anticapitalismo da esquerda. Na vida prática, o seu oposto, o socialismo, teria sido jogado no lixo da história. Um exemplo seria o Brasil, com suas políticas elogiadas pelo FMI, e o governo do PT pagando as dívidas do país. Tudo em virtude do crescimento das exportações, resultantes da prosperidade global.

 

A inflação brasileira teria sido liquidada pelo "estado da arte" do capitalismo, consubstanciado no regime de metas do Banco Central e da política monetária. Com isso, teria sido possível a ampliação das modalidades de crédito, outra criação do capitalismo contemporâneo. Para completar, o mesmo governo Lula estaria ingressando célere na "privatização", renegando o "estatismo incompetente e ultrapassado". Diante disso, como o PT ainda defende o socialismo?

 

Esse é mais um dos problemas dos ideólogos do capitalismo. Seu mundo real é apenas a parte rósea do momento. Afora isso, é incomensurável sua capacidade de confundir meios e fins, conjuntura e estrutura, e concessões e privatizações. Não por acaso, denigrem o Estado de todas as formas, mas são incapazes de viver sem ele.

 

Por um lado, não entendem que os socialistas no governo procurem desenvolver as forças produtivas, utilizando inclusive as formas capitalistas de propriedade. E que isso ocorra tanto em países que fizeram revoluções, mas haviam sido quase destruídos pelo domínio colonial e pela guerra, como o Vietnã, quanto em países em que os socialistas apenas chegaram ao governo, mas também os encontraram quebrados por políticas criminosas de desindustrialização, como o Brasil.

 

Em ambos os casos, os socialistas tomam as empresas estatais como instrumentos para implantar políticas de desenvolvimento industrial e tecnológico, mas também dão espaço para empresas privadas investirem em novas plantas industriais e em obras de infra-estrutura. Não privatizam empresas estatais estratégicas, fundamentais para orientar todo o processo de desenvolvimento, como é o caso da Petrobras, e era o da Vale, no Brasil. Mas podem fazer concessões de estradas, ou realizar parcerias público-privadas, se isso contribuir para o desenvolvimento das forças produtivas e dos próprios ativos públicos.

 

Portanto, confundir concessões de estradas, ou de construção de obras de infra-estrutura, com privatizações, é quase o mesmo que, ao inverso, confundir socialismo com comunismo. Enquanto o mundo real da dualidade capitalista não se esgotar, os capitalistas no poder não podem livrar-se da necessidade de se valer de empresas estatais e do Estado, por mais que os abominem. E os socialistas, no poder ou no governo, também se verão às voltas com a necessidade de operar "políticas capitalistas", ao mesmo tempo em que procuram reforçar as estatais e as políticas sociais que os capitalistas consideram "anticapitalistas".


Wladimir Pomar
é escritor e analista político.

 

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