Correio da Cidadania

Palestinos fazem concessões. E agora, Bibi?

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Depois de muito insistir, parece que John Kerry, o Secretário de Estado dos EUA, conseguiu alguma coisa.

 

Em reunião com ele e o vice-presidente Joe Biden, em Washington, representantes da Liga Árabe modificaram o plano de paz proposto anteriormente.

 

Continua no plano criar um Estado palestino independente, baseado nos limites de 1967, porém, alterados pela troca de algumas áreas de assentamentos por terras de Israel.

 

Os representantes da Liga foram além: afirmaram que os países árabes estabeleceriam relações com Israel quando palestinos e israelenses chegassem a um acordo final.

 

Parecia uma luz começando a tremeluzir no fim do túnel.

 

Por fim, as sonhadas e pouco acreditadas negociações de paz poderiam começar. O negociador palestino, Saed Erekat, apressou-se a aplaudir.

 

O Hamas foi um tanto reticente: “nós do movimento Hamas estamos profundamente preocupados a respeito das recentes propostas da delegação de paz da Liga Árabe, em Washington, sobre o acordo com troca de terras com o regime sionista”.

 

Claro, eles não confiam muito nos israelenses, depois de tantas tentativas de acordos que não foram em frente, devido à falta de interesse dos vários governos de Tel-aviv na independência palestina.

 

De qualquer forma, embora de pé atrás, pedindo pressões para que Israel interrompesse a formação de novos assentamentos, o Hamas não deixou de concordar com a proposta da Liga Árabe.

 

Já os norte-americanos soltaram rojões. Kerry falou em “um passo à frente muito grande”. E clamou, entusiasmado: “Isto é literalmente uma afirmação do mundo árabe de que está preparado para fazer as pazes, desde que os palestinos e israelenses cheguem a um acordo de paz”.

 

A ministra Tzipi Livni, negociadora de Israel, também vibrou: “são boas novas que devem ser bem recebidas”. E completou: “espero que essa mensagem que vem do emir do Catar (representante da Liga Árabe) ajude a começar as negociações logo que possível”.

 

Tinha motivos para isso. Afinal, além de surgir uma esperança de solução para um problema aparentemente insolúvel, a proposta encerrava o eterno conflito com os países árabes. Israel deixaria de ter inimigos cercando suas fronteiras e ganharia mercados altamente promissores para seus produtos.

 

Isso foi sentido pela maioria das forças políticas locais. Yair Lapid, líder do partido Yesh Atid, integrante da base aliada do governo, prometeu que exigiria de Netanyahu a condução de um sério processo de paz com os palestinos.

 

Para o presidente Shimon Peres, “os ministros da Liga Árabe, mais uma vez, expressaram seu apoio à solução dos dois Estados, que também é aceita por nós, e uma ampla estrutura de apoio para ela progredir”.

 

A oposição, do Partido Trabalhista, falou com firmeza, através do deputado Erel Margalit: “este é o avanço que todos procurávamos”.

 

Neste coro de entusiasmadas aprovações, faltou a voz do primeiro-ministro Bibi Netanyahu. Ele não disse nem sim, nem não.

 

Se quiser ser coerente com suas posições anteriores terá de se opor. Repetidas vezes Bibi rejeitou as fronteiras de 1967, dizendo serem perigosas para a segurança de Israel.

 

Além disso, como a troca de terras com os palestinos não evitará que alguns (ou muitos) assentamentos fiquem na Palestina independente, Bibi jurou não aceitar. Na campanha eleitoral, ficou rouco de tanto gritar sua eterna solidariedade aos colonos israelenses.

 

Teria a seu lado a maioria dos partidos que o apoiam. O ultra-direitista Beitenu, do ex-ministro das Relações Exteriores Avigdor Lieberman, nem admite falar em concessões para os árabes palestinos.

 

E ninguém imagina que o Lar Judaico, partido formado para defender os interesses dos assentamentos, esqueça seus objetivos. Ele até aceita um Estado palestino. Desde que, no mínimo, 62% do território da Cisjordânia sejam anexados a Israel.

 

O próprio Likud, partido de Bibi, atualmente dominado por sua ala mais radical, não deve gostar muito da ideia da Liga Árabe.

 

Um dos seus dirigentes, o ministro Silvan Shalom, já a desprezou solenemente, em entrevista a uma rádio de Israel: “não tem nada de novo. Em princípio, apoio renovar o processo de paz. Certamente, não aceito as linhas de 1967”.

 

Se topasse a sugestão árabe, Bibi teria uma briga brava com o Likud e os dois grupos mais fortes da sua base de apoio.

 

Apesar de tudo, há motivos muito práticos para Bibi negar suas posições e enfrentar seus partidários mais chegados.

 

Rejeitar as concessões dos árabes seria uma demonstração de que ele, na verdade, não quer nada com a solução dos dois Estados ou qualquer outra que dê independência à Palestina.

 

O que iria pegar muito mal na comunidade global, especialmente agora que a imagem de Israel está suja pelas repetidas violações das leis internacionais e dos direitos humanos, flagradas por diversas comissões de investigação da ONU e de algumas ONGs.

 

Isso causaria certas adversidades. Poderia animar os palestinos a processarem Israel no Tribunal Penal Internacional, o que seu reconhecimento recente pela ONU, como membro observador, dá direito. Com apoio até dos países ocidentais.

 

Poderia ampliar em muito o boicote mundial dos produtos dos assentamentos e mesmo de Israel.

 

Apesar de todos os seus recentes protestos de amor incondicional, Obama ficaria bastante chateado, capaz até de condenar Bibi publicamente por sua intransigência.

 

Levando tudo isso em conta, é de se crer que o premier israelense não se atreverá a se apresentar como desmancha-prazeres.

 

Provavelmente, vai dar seu OK à proposta da Liga Árabe. Mas só da boca para fora. Deverá qualificar seu aceite como uma concessão a ser obrigatoriamente retribuída pelos palestinos.

 

Teriam de parar de exigir a interrupção da construção de novos assentamentos como pré-condição para as negociações de paz.

 

Afinal, não é o que Obama lhes tinha pedido?

 

Como os palestinos jamais irão concordar, Bibi atribuirá a eles a culpa pelo fracasso de mais uma tentativa de acordo. E tudo continuará como estava.

 

No marco zero, onde Bibi quer que o processo de independência da Palestina permaneça.

 

Luiz Eça é jornalista.

Website: Olhar o Mundo.

Comentários   

0 #1 Nem o papa quer paz na PalestinaCandido Volmar 03-05-2013 13:08
Excelente análise política de Luiz Eça, pois mostra o ponto fraco das pseudo-negociações de um país que se vê protegido em quaisquer violações dos direitos humanos. Torço, porém, para que o jornalista esteja enganado e finalmente o Estado Palestino passe a integrar também a ONU.
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