Correio da Cidadania

‘PSDB fracassou na gestão do transporte sobre trilhos’

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Sinônimo de serviço público bem prestado, o metrô de São Paulo, que transporta 4 milhões de pessoas por dia em seus 66 quilômetros de linhas, vivenciou um inédito acidente, com uma “leve” colisão de trens em direções opostas que feriu mais de 30 pessoas na linha 3 vermelha, que liga as zonas leste e oeste. O acidente do dia 16 de maio causou paralisação de algumas horas nos trens, sendo seguida por uma greve no dia 23, que afetou todas as linhas, exceto a de número 4, amarela, que, por ser privada, não aderiu.

 

“Nunca ocorreu nada parecido nos 38 anos de história do metrô, pois sempre se buscou um sistema de segurança máxima, similar, digamos, ao sistema da aviação, de modo que o choque entre dois trens é uma tragédia”, disse Paulo Pasin, da Federação Nacional dos Metroviários, em entrevista ao Correio da Cidadania.

 

Dessa forma, cabe buscar explicações mais concretas sobre o motivo do acidente e que medidas tomar no sentido de aprimorar a qualidade dos serviços prestados, presumindo-se que a opinião do secretário de Transportes do estado pouco tem a contribuir nesse sentido. “Algumas pessoas só se machucaram porque estavam distraídas”, ‘analisou’ Jurandir Ferreira.

 

“A falta de investimento do governo estadual, que não tem investido corretamente na expansão, modernização das linhas, além dos salários dos servidores, tem levado a um processo de colapso, sentido pela população nos atrasos, acidentes, superlotação, demora de trens... A greve foi conseqüência disso, pois, além de não investir na estrutura do metrô, o governo não investe nos servidores, levando ao sucateamento”, afirmou ao Correio o deputado estadual Carlos Giannazi, do PSOL.

 

Nos dias seguintes, mais uma vez chamaram a atenção as formas de análise dos fatos, tanto em relação ao acidente como à greve. Além de mostrá-la por um viés contrário aos trabalhadores, em geral até ignorando suas demandas e críticas, registrou-se uma série de louvações à única linha privada da Paulicéia, que se manteve operante. De acordo com o metroviário, predomina na mídia corporativa a forte tendência de desqualificar o trabalho humano e exaltar as privatizações e a mecanização do trabalho.

 

Entretanto, tal visão dos fatos é contrariada por ambos os entrevistados. “Houve uma falha de equipamentos e só se evitou uma tragédia maior porque, nesse caso, diferentemente da linha 4, há operadores nos trens, o que permitiu uma reação rápida que diminuiu o impacto do choque e evitou coisas piores. Se acontecesse na linha 4 amarela, a dimensão do acidente seria incalculável”, explicou Pasin. Para Giannazi, “essa linha já matou sete pessoas antes de começar, lá em 2007, quando houve aquele acidente nas obras, além de irregularidades do consórcio, erros de engenharia, pressa pra entregar a obra. Se fosse lá, o acidente seria muito maior, pois não há condutor, ninguém que possa parar, poderíamos ter um acidente de grandes proporções e perdas de muitas vidas. Na linha 3, na estação Carrão, houve interferência humana”, concordou.

 

Sucateamento calculado?

 

Ao se debruçar sobre a atual situação paulista, é possível notar um processo similar ao que acometeu nas mais diversas áreas do interesse público, que ao longo dos anos foram abandonadas para posterior entrega à iniciativa privada e sua propalada superioridade gerencial. Mas vale ressaltar que a greve metroviária teve escala nacional, paralisando, com mais força, o transporte sobre trilhos de outras capitais, como Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Recife.

 

“O governo federal sucateia a CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos), que opera em Recife e BH, além de não investir na Transurb (Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre), outra empresa federal, que opera em Porto Alegre. Desde a década de 50, com JK, inverteu-se totalmente no país a lógica do sistema de transporte. Deu-se privilégio ao transporte individual, uma vez que as montadoras exerceram lobbies enormes que, com o passar do tempo, levaram a políticas que destruíram totalmente a malha ferroviária”, destaca Pasin.

 

Além disso, esconde-se o fato de que o próprio governo não usa os recursos disponíveis de forma adequada, sendo que, no caso da linha 3, a quarta parte de seu orçamento não foi aplicada no último ano. “O metrô sempre foi bem avaliado pela população. Mas nos últimos anos o PSDB vem destruindo-o. O PSDB é especialista em acabar com tudo que funciona bem. Tudo que é público e funciona bem eles terceirizam, privatizam e destroem. É o que tem acontecido nessa expansão do metrô paulista”, critica Giannazi.

 

A crítica à administração tucana ganha corpo conforme se conhece a real capacidade de investimento do estado, dentro de uma cidade cuja imobilidade já se transformou em “case” mundial. “O orçamento de São Paulo mostra que há excesso de arrecadação. No ano passado foram 5 bilhões de reais a mais no caixa. É um momento interessante porque há recursos de sobra pra investir em transporte sobre trilhos. Além disso, o governo federal lançou o PAC da mobilidade e isso pode gerar ainda mais recursos pra investir”, contestou o deputado.

 

“Além de não fazerem o suficiente, o que está previsto como investimento é de viés privado, a exemplo da PPP (Parceria Público-Privada) de São Paulo, o que na verdade é um negócio da China para o capital; 85% do dinheiro é público, o capital só entra com 15%, ainda por cima em boa parte subsidiado pelo BNDES e seus empréstimos. E o retorno é garantido, uma vez que, pelo contrato, ele independe do número de usuários transportados”, endossa Pasin.

 

Assim, ficamos novamente estáticos diante dos processos que correm em nossa ‘democracia’, sem quaisquer discussões públicas acerca dos investimentos a serem feitos com o dinheiro público, e também a qualidade de tais aportes. “Não é à toa que hoje nosso metrô é lotado, atrasado e superfaturado, basta ver as denúncias de cartel na construção da nova linha (número 5). O transporte sobre trilhos está entrando em colapso em São Paulo por conta da falta de investimento do governo”, falou o parlamentar.

 

Por sua vez, Pasin também passa uma parte da fatura para Brasília. “Privatização é capitalismo com risco zero para o capital, porque é o dinheiro público que banca. De forma geral, todas as obras de mobilidade urbana previstas no PAC, em BH, Rio, Recife, estão delineadas sob o modelo de PPP. Infelizmente, o governo Dilma trata a questão do transporte da mesma forma que os tucanos. Tanto que já privatizou aeroportos e tem uma política de privatização das ferrovias”.

 

Que gestão?


Diante do exposto, e inclusive deixando para outra reportagem uma análise mais aprofundada sobre as atuais condições dos trabalhadores dos trilhos, cabem os velhos questionamentos sobre as vantagens que o setor privado teria a oferecer à população, em geral massacrada por discursos decantadores de uma supremacia que parece chegar às raias da mística.

 

“É preciso dizer que a privatização de tais setores significa que a população apenas pagará tarifas caríssimas. A tarifa do Rio é uma das mais caras do mundo (R$3,20) e lá não há transferência gratuita de trem pra metrô, como em São Paulo; por sua vez, em São Paulo esse transporte já é caro e vai ficar mais ainda, já que, para remunerar a linha 4, aumentou-se a tarifa para 3 reais. Pra se ter uma idéia, de acordo com os índices de inflação, e não com o que seria justo ou não, a tarifa não poderia passar de R$ 1,84. O metrô de outros lugares cobra em torno de 1,70. Até na Europa e EUA é um transporte subsidiado, para que os mais pobres possam usar”, enumerou o diretor nacional dos metroviários.

 

“O transporte hoje está caótico porque o governo não planeja, não moderniza. Desde que o PSDB é governo em São Paulo, há 20 anos, têm construído um quilômetro por ano. Um governo desse já deveria ter planejamento estratégico, sabendo que a metrópole cresceria, sabendo do aumento da compra de automóveis. É um governo sem eficiência, competência, planejamento, apesar de vender essa imagem de boa gerência. É exatamente isso que não tem”, reitera Giannazi.

 

Firmes em suas posições, ambos ainda atacam pontos nevrálgicos do atual viés do debate público, pouco esclarecedor dos intrincados jogos de interesse e sempre afinado ao discurso do poder econômico, atacando os mitos criados nos anos neoliberais. “Tentam valorizar demais e vender ideologicamente que a privatização é a melhor coisa que existe, induzindo a população a defendê-la”, resume Pasin. “O metrô era um cartão de visitas na área de transportes, mas tornou-se saturado e sucateado. Assim como em outras, o PSDB fracassou nessa área, fracassou na gestão do transporte sobre trilhos”, arremata Giannazi.

 

Gabriel Brito é jornalista do Correio da Cidadania.

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