Correio da Cidadania

Os longos ciclos das matérias-primas

0
0
0
s2sdefault

 

Duas notícias recentes, que alguns diriam não estar relacionadas, na verdade refletem o mesmo problema. Dias atrás, se festejou que a Bloomberg colocou um país sul-americano, o Peru, no terceiro lugar das economias emergentes mais promissoras.

 

Recebeu menos atenção que dias antes, dois economistas, Bilge Erten, das Nações Unidas, e Jose Antonio Ocampo, que dirigiu a CEPAL e agora é professor universitário em Nova York, publicaram um estudo impactante sobre os ciclos dos preços das matérias-primas desde fins do século 19 (Super-ciclos nos preços das matérias-primas desde meados do século 19). É fundamental compreender essas tendências com as matérias-primas, já que os êxitos econômicos de vários países sul-americanos, incluindo o Brasil, que entusiasmam a Bloomberg e outros analistas, se devem em boa medida aos altos preços das matérias-primas.

 

Erten y Ocampo abordam as altas e quedas dos preços das matérias-primas, como minerais, hidrocarbonetos e agroalimentos. Observam-se longos ciclos, com períodos em que os preços começam a subir, alcançam um pico e depois caem. Encontram-se quatro longos ciclos, com picos nos preços em 1917, 1951, 1973; atualmente está em marcha o quarto ciclo (e está para se conferir quais serão seus preços máximos).

 

Durante os períodos de altos preços nas matérias-primas, tiveram lugar impulsos desenvolvimentistas nos países da América do Sul. Os efeitos da bonança, em meados da década de 1910, ou aqueles posteriores à segunda guerra mundial, explicam os saltos de desenvolvimento de vários países do continente. Hoje em dia, o bom desempenho em vários países está diretamente vinculado a esse fenômeno. Para aproveitar o boom, a exportação de matérias-primas é defendida com toda a energia, seja em Brasília, seja em Quito.

 

Uma primeira advertência no estudo de Erten y Ocampo é que para os produtos que não são hidrocarbonetos, como minerais e agroalimentos, os preços médios de cada ciclo são menores que os da fase anterior. Ainda que o atual ciclo de alguns metais possa escapar a essa tendência, de toda forma essas identificações nos fazem regressar ao problema da queda dos termos de intercâmbio. As matérias-primas, proporcionalmente, valem cada vez menos. É a velha advertência de Raul Prebisch.

 

Com efeito, nos últimos cem anos se acumulou uma queda de 47% nos preços das matérias-primas – fora os hidrocarbonetos. Por essa tendência histórica, o aumento recente de 8% no valor dos minerais não compensa o colapso. Colocando neste contexto o entusiasmo minerador que mostram vários governos, se escancara que na verdade estão apelando a itens que agonizam.

 

Também deve se destacar que as piores quedas nos preços foram nos agroalimentos tropicais. No caso dos países tropicais, é outro alarme. Seguir apostando na especialização em banana ou café só agrava os problemas incubados pela vocação mineradora.

 

Em compensação, o preço dos hidrocarbonetos mostra uma tendência constante de aumento. Isso faz que para os países petroleiros a situação imediata seja diferente. Mas, simultaneamente, é um alerta a todas as nações, já que estamos numa rota em que seguirá subindo o custo energético de qualquer tipo de produção, desde tratores no campo à manutenção do funcionamento de uma oficina de tornearia.

 

A segunda advertência neste estudo de Erten y Ocampo é dirigia aos países que são muito dependentes da exportação de minerais: devem aproveitar esses momentos de bons preços, já que persiste a tendência descendente. Essa bonança vai terminar. É necessário aproveitar os recursos financeiros que estão sendo gerados para se investir de maneira criteriosa em setores que permitam superar as futuras limitações. A urgência não está mais na mineração, mas em diversificar a produção, promovendo especialmente a industrialização. Outra vez Prebisch tinha razão.

 

Eduardo Gudynas é analista de informação no D3E (Desenvolvimento, Economia, Ecologia e Eqüidade), centro de investigações dos assuntos latino-americanos sediado em Montevidéu.

 

Traduzido por Gabriel Brito, jornalista do Correio da Cidadania.

Comentários   

0 #1 Forças produtivasRodrigo Choinski 05-03-2012 13:49
O problema que não se discute é que estamos intervindo na natureza de tal forma que logo a tecnologia não será capaz de estancar a regressão das forças produtivas representadas pela escassez de recursos naturais.
Não é só uma questão de dinheiro (custos mais altos) mas de trabalho, vai ser preciso cada vez mais trabalho para produzir a mesma coisa. Logo não será apenas a questão do capitalismo chegar ao ponto de segurar o desenvolvimento das forças produtivas, mas o de uma regressão de tais forças devido ao enorme desperdício de recursos.
Citar
0
0
0
s2sdefault