Correio da Cidadania

Perspectivas para a Economia em 2012

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Abordagens das tendências da produção, do emprego, da inflação, do comércio exterior etc. costumam encabeçar os artigos prospectivos da mídia especializada.

 

Farei esta análise de outra perspectiva, qual seja, a das prováveis causas do desempenho esperado para 2012, que, à primeira vista, parece um ano atípico.

 

Analisando-se a economia brasileira para o futuro próximo (2012), parece-nos relevante atentar para três vetores chave, no sentido de produção e repartição do excedente econômico: 1) o contexto atual e esperado de inserção externa e da produção de “commodities” da economia brasileira; 2) o nível e o perfil do investimento público programado; 3) o papel da política social de Estado, simultaneamente como vetor de demanda efetiva e de melhoria distributiva.

 

Outra abordagem conjuntural, a exemplo da já clássica disputa entre o Banco Central (meta de inflação de 4,5% e estimativa de crescimento do PIB de 3,5%) e o Ministério da Fazenda, cuja meta de crescimento fica torno de 5% ao ano, terá que considerar necessariamente o arranjo de economia política (produção e repartição do excedente econômico), que ora pretendo destacar para a conjuntura econômica de 2012.

 

Situação externa

 

O ciclo de expansão da economia mundial puxado pelos asiáticos, que já dura mais de uma década, no qual o Brasil se inseriu explicitamente como provedor de “commodities” somente depois da grave crise cambial de 1999, dá sinais de esgotamento. Conquanto se discutam ainda as origens e causas dos fatores provocativos da situação de crise global (zona do Euro, a economia norte-americana ou a própria economia chinesa), o certo é que, para o ano que vem, não se deve esperar o mesmo desempenho exportador em “commodities”. Este desempenho, que o país teve na última década e também em 2011, tem sido, em última instância, a fonte de solvência financeira externa (ingresso de capitais).

 

Por sua vez, retraindo-se a expansão externa dos primários, pelas mesmas razões causais também se retrairá o ingresso de capitais externos. E como a situação da “Conta Corrente com o Exterior” pioraria nessas circunstâncias, a solvência do seu déficit, persistente desde 2008, possivelmente se daria com a utilização de reservas cambiais.

 

Em síntese, do ponto de vista externo, o saldo comercial e o investimento externo provavelmente não irão acudir a já histórica situação deficitária da “Conta de Serviços”, que em grande medida reflete a remuneração corrente do capital estrangeiro na economia brasileira. E tampouco se pode descartar a hipótese de saídas líquidas de capital em situações de crise externa.

 

Investimento público e financiamento da Política Social

 

Os compromissos em curso com a agenda do PAC-2012, concentrados num determinado perfil de infra-estrutura (energia elétrica, petróleo, obras urbanas de infra-estrutura para a Copa do Mundo), refletirão a maior parcela do investimento público, à qual possivelmente se adicionarão demandas de reequipamento do setor militar, sucessivamente adiado nos últimos 20 anos.

 

Como todos esses setores apresentam defasagens acumuladas, o perfil do investimento público, que depende de financiamentos do Orçamento da União (a menor parte), ou aquele financiado pelo Orçamento das empresas estatais e das parcerias público-privadas, sofrerá o ônus da desaceleração externa, pelo efeito do encurtamento do investimento direto estrangeiro.

 

A política social de Estado (Previdência, Saúde, Assistência e Educação principalmente) é um terceiro componente ultra-relevante da política macroeconômica no contexto de crise da demanda efetiva (retração das exportações, do investimento externo e do investimento público), porque permite proteger ramos importantes da produção de bens-salário na economia.

 

Concentrada como está nos benefícios monetários vinculados ao salário mínimo, ou nas remunerações de um a três salários mínimos (Regime Geral de Previdência Social), o fluxo de pagamentos de benefícios da seguridade social desempenha simultaneamente funções de demanda efetiva e de melhoria no perfil distributivo da renda.

 

Infelizmente, tanto os investimentos em infra-estrutura quanto as chamadas despesas de custeio corrente da política social correm riscos de redução, postergação, adiamento etc., se prevalecerem os receituários ortodoxos de contenção dos gastos públicos. Mas felizmente não parece ser esta a orientação do Ministério da Fazenda, que, ao que tudo indica, usaria em 2012 a mesma política fiscal utilizada em final de 2008 e no ano de 2009 para defender-se da contaminação da crise externa.

 

Por outro lado, se a crise externa se caracterizar como estrutural, profunda e duradoura, o receituário de curto prazo de proteção da demanda efetiva revelar-se-á insuficiente. Isso porque uma crise estrutural do sistema capitalista global provoca mudanças estruturais na produção e na demanda mundiais, nova divisão nas especializações regionais e uma grave tendência dos mercados à depressão econômica.

 

Precisamos estar atentos para esta hipótese, não por apego ao catastrofismo, mas antes pelo contrário. Um plano B para enfrentar a crise externa, que não se restrinja a políticas macroeconômicas de curto prazo, precisaria desde logo ser objeto de conjecturas.

 

Mudanças de inserção externa, de perfil do investimento em bens públicos e do conjunto da política social certamente ocorrerão de forma não planejada nos próximos anos. Deixadas ao acaso, essas mudanças correm o risco da regressão e do retrocesso. Em tais circunstâncias, é oportuno discutir os novos rumos da inserção externa, do atendimento a necessidades básicas da população e da construção de infra-estrutura de bens públicos, de sorte a ensaiar um padrão de desenvolvimento humano que somente nas crises sistêmicas se pode cogitar seriamente.

 

Guilherme Costa Delgado é doutor em Economia pela UNICAMP e consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz.

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