Correio da Cidadania

A Paz e o Futuro

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Há algum tempo, a CNBB, diante dos escândalos que marcavam a República brasileira, alertou para o fato de que a corrupção representava séria ameaça à democracia. Democracia que foi reconquistada através de muita luta e coragem por parte daqueles que não se acomodaram e ofertaram a própria vida para resgatá-la. A sociedade brasileira vivia anos terríveis e sombrios. Operários, estudantes e intelectuais eram perseguidos e massacrados por uma ditadura cruel e feroz, que calava o Parlamento e castrava o Judiciário.

 

Obtida a vitória com o retorno ao Estado Democrático de Direito, a sociedade civil reconquistou o direito de livremente escolher seus representantes. Sobreveio, então, a primeira desilusão, com a eleição de uma verdadeira quadrilha, alçada ao poder e de lá expurgada através da pressão dessa mesma sociedade, frustrada na primeira tentativa de buscar solução aos graves problemas que assolavam o país. Vieram outras eleições e, concomitantemente, outras decepções. Projetos e sonhos de melhoria da vida de amplos setores da sociedade, secularmente excluídos, findaram por desaparecer, mediante a postura daqueles que, alçados ao poder, mudaram de lado, esqueceram o que prometeram e até do que um dia escreveram. Promessas não cumpridas, projetos sociais que, num piscar de olhos, transformaram-se em objetivos pessoais e inconfessáveis levaram, mais uma vez, à desilusão.

 

E, pior, o desencanto provocou reminiscências perigosas. Saudades do período sombrio passam  a freqüentar mentes doentias, abrindo espaço para os oportunistas. O retorno ao passado onde, aparentemente, reinavam a paz e a ordem unida, sai das esferas íntimas e avança em setores mais abrangentes, com uma platéia rigorosamente manipulada para ouvir e aceitar o discurso do farsante. É o canto da sereia, o ovo da serpente. É o retorno da força bruta que levará, segundo esse discurso, ao Nirvana, à paz dos cemitérios, à paz dos sem voz, à paz dos sem votos, à paz sem cidadania. Em conseqüência, à volta do medo, do terror, da prisão desmedida e sem controle, da tortura, à ausência dos direitos fundamentais inerentes a uma sociedade civilizada. Enfim, o triunfo do Estado Policial, todo poderoso e sem limites.

 

Mas não é essa a paz que a sociedade civilizada almeja. A verdadeira paz só sobreviverá no jardim da democracia, regado com o pleno exercício dos direitos fundamentais. No exercício pleno da cidadania, do sufrágio universal e pelo voto direto e secreto. Pela concretização dos objetivos da República Federativa, especialmente pela construção de uma sociedade livre, justa e solidária, tendo como fundamento a dignidade da pessoa e com a prevalência dos direitos humanos. E, primordialmente, pela certeza absoluta de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se a todos o direito à vida digna, à liberdade, à igualdade e à segurança.

 

Contudo, enquanto tais objetivos não forem alcançados e não ultrapassarem a condição de meros e vazios enunciados, corre-se o risco de se manter a sociedade refém de falsos profetas, manipulada por uma mídia aética que, estabelece como prioridade não o direito à informação, mas o lucro, enquanto mera empresa comercial, muitas vezes sem qualquer compromisso com a verdade. A eleição de seus representantes continuará a ser uma disputa em torno daqueles que possuem alicerce econômico que sustente suas caríssimas campanhas eleitorais. Candidatos bizarros, mas conhecidos por outros fatores, poderão exercer suas bizarrices.

 

É fundamental, portanto, urgente alteração no quadro político brasileiro, com o afastamento da política fisiológica constituída por indivíduos que agem apenas por interesses pessoais. Enquanto prosperar esse quadro, o salário mínimo continuará ínfimo e os vencimentos dos setores do alto da pirâmide permitirão que seus titulares continuem a não enfrentar problemas simples do cotidiano, como, por exemplo, trazer à mesa o suficiente para atender às suas necessidades básicas, bem como de seus familiares.

 

Claudionor Mendonça dos Santos é Promotor de Justiça e presidente do Ministério Público Democrático

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