Correio da Cidadania

Privatização não é sempre solução

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Passados quase 20 anos desde o início das privatizações das distribuidoras de energia elétrica, já se pode fazer um balanço do que foi prometido e do que realmente ocorre no país, com um primeiro semestre batendo recorde em falhas no fornecimento de energia elétrica em diversas regiões metropolitanas.

 

Desde o citado período, a distribuição elétrica é operada pela iniciativa privada. As distribuidoras gerenciam as áreas de concessão com deveres de manutenção, expansão e provimento de infra-estrutura adequada, tendo sua receita advinda da cobrança de tarifas dos seus clientes.

 

A tão propalada privatização do setor elétrico nos anos 90 foi justificada como necessária para a modernização e eficientização deste setor estratégico. As promessas de que o setor privado traria a melhoria da qualidade dos serviços e a modicidade tarifaria foram promessas enganosas. Os exemplos estão aí para mostrar que não necessariamente a gestão do setor privado é sempre superior à do setor público.

 

Desde 2006 é verificada na maioria das empresas do setor uma tendência declinante dos indicadores de qualidade dos serviços, com sua deterioração refletindo negativamente para o consumidor. A parcimônia da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) ante a decadência da prestação dos serviços é evidente. Criada no âmbito da reestruturação do setor elétrico para intermediar conflitos, acabou virando parte deles. A Aneel é cada vez mais questionada na justiça tanto por causa dos blecautes que ocorrem, já que não fiscaliza direito as prestadoras de serviço que acabam fazendo o que querem, como pelos reajustes tarifários.

 

Esta falta de fiscalização ilustra a constrangedora promiscuidade entre interesses públicos e privados dando o tom da vida republicana no Brasil. Os gestores da Aneel falam mais do que fazem.

 

O exemplo mais recente e emblemático no setor elétrico é da empresa AES Eletropaulo, com 6,1 milhões de clientes, que acaba de receber uma multa recorde de R$ 31,8 milhões (não significa que pagará, devido à expectativa de que recorra da punição, como acontece em quase todas as multas), por irregularidades detectadas como o de não ressarcimento a empresas e cidadãos por apagões, obstrução da fiscalização e falhas generalizadas de manutenção. A companhia de energia foi punida por problemas em 2009 e 2010, devido aos desligamentos ocorridos no início do mês de junho, quando deixou as famílias da capital paulista e região metropolitana três dias no escuro.

 

O que aconteceu na capital paulista não é exclusividade. Outras distribuidoras colecionam queixas de consumidores em todo o Brasil. Vejam o caso da Light, com 4 milhões de clientes, presidida por um ex-diretor geral da Aneel, com os famosos “bueiros voadores”, cuja falta de manutenção crônica tem colocado em risco a vida dos moradores da cidade do Rio de Janeiro.

 

A Companhia Energética de Pernambuco (Celpe), com 3,1 milhões de clientes, controlada pela Neoenergia, uma das maiores empresas do setor elétrico do país, também é outra das distribuidoras que têm feito o consumidor sofrer pela baixa qualidade da energia elétrica entregue e pelas altas tarifas cobradas.

 

Infelizmente, a cada apagão e a cada aumento nas contas de energia elétrica as explicações são descabidas e os consumidores continuam a ser enganados pelas falsas promessas de melhoria na qualidade dos serviços, de redução de tarifas e de punição às distribuidoras. O que se verifica de fato são somente palavras ao léu, sem correção dos rumos do que está realmente malfeito. A lei não pode mais ser para inglês ver, tem de ser real, e assim proteger os consumidores.

 

Mostrar firmeza e compromisso público com a honestidade e com a eficiência é o mínimo que se espera dos gestores do setor elétrico brasileiro.

 

Heitor Scalambrini Costa é professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

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