Correio da Cidadania

Primeiros dias do governo Dilma reforçam rumos incógnitos da política social

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Decorridos cerca de 50 dias do governo Dilma, permanecem ainda muitas incógnitas sobre os rumos estratégicos da política social. A mídia tem insistido muito nas notícias sobre cortes de até 60 bilhões de reais no Orçamento da União de 2011 e no reajuste do salário mínimo, sem incremento real. Mas este noticiário toca apenas em ajustes conjunturais de execução orçamentária. São de certa forma uma resposta simbólica e convencional do governo às pressões para conter a demanda pelos chamados "Bens-Salário".

 

O governo convencionalmente acomoda essas pressões na conjuntura, operando com decreto de contingenciamento do Orçamento. Resolveu limitar fortemente os gastos de custeio, diga-se de passagem, sem grande raio de manobra. Resolveu também, a título de política anti-inflacionária (neste caso o Banco Central), elevar os juros internos. Esta medida não é apenas simbólica, pois tem efeito imediato em todo o arranjo macroeconômico, com incerta contenção sobre os preços dos alimentos, mas com piora no desequilíbrio externo.

 

Quanto à política do salário mínimo, deve-se esclarecer que há aí uma inversão de prioridades do noticiário. A política de longo prazo, anunciada pela presidente Dilma por ocasião de sua fala na reabertura do Congresso, é de converter em Lei a regra informal vigente desde 2005 - reajuste pela inflação do INPC, mais incremento real com base na média do crescimento do PIB dos últimos dois anos. Mas essa regra, registre-se, não está sendo aplicada ao reajuste de 2011. Cortou-se o incremento real médio do biênio 2009 e 2010 e se aplicou apenas o INPC, com arredondamento, que resultou no valor de 545,00 reais.

 

Por outro lado, conquanto a presidente anunciasse na sua fala ao Congresso uma prioridade à Reforma Tributária, a única notícia concreta sobre este tema é a sua intenção de desonerar parte da contribuição patronal da folha de salários para a Previdência Social, o que em princípio não significa reforma tributária. Mas ao desonerar a folha, cria-se a necessidade de compensação com tributos, sob pena de sérios malefícios à Seguridade Social. Se realizar tal compensação, abre-se caminho para uma reforma tributária; e esta terá que revelar na fonte a ser tributada o seu caráter - progressivo, regressivo ou neutro, com o que se define o sentido da política tributária para a política social.

 

A área clássica da política social - Trabalho-Previdência, Saúde e Educação - compõe um campo muito vasto de benefícios e serviços públicos, que ao que tudo indica irá no mínimo manter direitos sociais básicos, já constitucionalizados e regulamentados em texto legal subseqüente. Mas, provavelmente, o que ainda não está claro para este governo, como de resto não esteve também para o anterior, é a existência de uma autônoma e desejável demanda por direitos sociais já regulamentados, principalmente dos benefícios monetários da Seguridade Social, de forma direta, e dos serviços do SUS, de forma indireta, para os quais a estrutura orçamentária vigente não está calibrada com recursos tributários suficientes. Daí os apelos conjunturais recorrentes aos cortes de custeio, vendidos sob o selo enganoso da austeridade fiscal, considerada apenas a restrição tributária existente para a área social.

 

Ora, tanto a desoneração de parte da Contribuição Patronal quanto a ampliação de cobertura da população atendida pela Seguridade Social, agora cada vez mais acossada por novos riscos ambientais, requerem recursos fiscais, que nas democracias de perfil social-democrata envolvem forte disputa distributiva. Isto tudo teria de passar pela sociedade, ir ao Congresso e suscitar vivo debate político, para ao fim e ao cabo de uma disputa democrática gerar mudanças na política tributária de caráter progressivo sobre a renda e a riqueza sociais.

 

Mas isto não está na agenda declarada da presidente. Não está na mídia, nem repercute no Congresso desta forma. Porém, virá à tona cedo ou tarde porque é real.

 

Para fechar, quero deixar claro que nada tratei da política agrária do novo governo neste texto, em parte porque nada foi anunciado de novo, em parte porque não cabe nos limites do artigo. Mas o tema é fundamental, caso se queira pensar o sentido distributivo do conjunto da política pública. Tratarei oportunamente deste tema, de forma específica.

 

Guilherme Costa Delgado é economista e membro da Comissão Brasileira de Justiça e Paz.

 

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Comentários   

0 #3 Palavras....Raymundo Araujo Filho 16-03-2011 06:08
Hoje ouvi o prof. Carlos Lessa dizer que a política do pré sal está sendo diametralmente oposta àquela propalada por Lulla, tendo se iniciado o vilipêndio, pelo próprio, assim como a maioria das iniciativas "sociais" tiveram o mesmo destino.

Quem vive de palavras é o twiter, não eu. A política precisa de FATOS para ser validada. Nem Cristãos vivem só de promessas....
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0 #2 Marciano 21-02-2011 10:26
Parabéns pela criticidade na elaboração do texto! Muito bons as publicações do Correio da Cidadania! abraços
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0 #1 Remindo Sauim 17-02-2011 06:53
Cada um escreve o que quer, mas nada é mais conhecida que a políca de ganhos sociais planejadas por Dilma.
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