Correio da Cidadania

Darwinismo social

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A catástrofe na região serrana do Rio de Janeiro é noticiada com todo alarde, comove corações e mentes, mobiliza governo e solidariedade. No entanto, cala uma pergunta: de quem é a culpa? Quem o responsável pela eliminação de tantas vidas?

 

Do jeito que o noticiário mostra os efeitos, sem abordar as causas, a impressão que se tem é de que a culpa é do acaso. Ou se quiser, de São Pedro. A cidade de São Paulo transbordou e o prefeito em nenhum momento fez autocrítica de sua administração. Apenas culpou o excesso de água caída do céu. O mesmo cinismo se repetiu em vários municípios brasileiros que ficaram sob as águas.

 

Ora, nada é por acaso. Em 2008, o furacão Ike atravessou Cuba de Sul a Norte, derrubou 400 mil casas, deu um prejuízo de US$ 4 bilhões. Morreram 7 pessoas. Por que o número de mortos não foi maior? Porque em Cuba funciona o sistema de prevenção de catástrofes naturais. No Brasil, o governo promete instalar um sistema de alerta... em 2015!

 

O ecocídio da região serrana fluminense tem culpados. O principal deles é o poder público, que jamais promoveu reforma agrária no Brasil. Nossas vastas extensões de terra estão tomadas pelo latifúndio ou pela especulação fundiária. Assim, o desenvolvimento brasileiro se deu pelo modelo saci, de uma perna só, a urbana.

 

Na zona rural faltam estradas, energia (o Luz para Todos chegou com Lula!), escolas de qualidade e, sobretudo, empregos. Para escapar da miséria e do atraso, o brasileiro migra do campo para a cidade. Assim, hoje mais de 80% de nossa população entope as cidades.

 

Nos países desenvolvidos, como a França e a Itália, morar fora das metrópoles é desfrutar de melhor qualidade de vida. Aqui, basta deixar o perímetro urbano para se deparar com ruas sem asfalto, casebres em ruínas, pessoas que estampam no rosto a pobreza a que estão condenadas.

 

Nossos municípios não têm plano diretor, planejamento urbano, controle sobre a especulação imobiliária. Matas ciliares são invadidas, rios e lagoas contaminados, morros desmatados, áreas de preservação ambiental ocupadas. E ainda há quem insista em flexibilizar o Código Florestal!

 

Darwin ensinou que, na natureza, sobrevivem os mais aptos. E o sistema capitalista criou estruturas para promover a seleção social, de modo que os miseráveis encontrem a morte o quanto antes.

 

Nas guerras são os pobres e os filhos dos pobres os destacados para as frentes de combate. Ingressar nos EUA e obter documentos legais para ali viver é uma epopéia que exige truques e riscos. Mas qualquer jovem latino-americano disposto a alistar-se em suas Forças Armadas encontrará as portas escancaradas.

 

Os pobres não sofrem morte súbita (aliás, na Bélgica se fabrica uma cerveja com este nome, Mort Subite). A seleção social não se dá com a rapidez com que as câmaras de gás de Hitler matavam judeus, comunistas, ciganos e homossexuais. É mais atroz, mais lenta, como uma tortura que se prolonga dia a dia, através da falta de dinheiro, de emprego, de escola, de atendimento médico etc.

 

Expulsos do campo pelo gado que invade até a Amazônia, pelos canaviais colhidos por trabalho semi-escravo, pelo cultivo da soja ou pelas imensas extensões de terras ociosas à espera de maior valorização, famílias brasileiras tomam o rumo da cidade na esperança de uma vida melhor.

 

Não há quem as receba, quem procure orientá-las, quem tome ciência das suas condições de saúde, aptidão profissional e escolaridade das crianças. Recebida por um parente ou amigo, a família se instala como pode: ocupa o morro, ergue um barraco na periferia, amplia a favela.

 

E tudo é muito difícil para ela: alistar-se no Bolsa Família, conseguir escola para os filhos, merecer atendimento de saúde. Premida pela sobrevivência, busca a economia informal, uma ocupação qualquer e, por vezes, a contravenção, a criminalidade, o tráfico de drogas.

 

É esse darwinismo social, que tanto favorece a acumulação de muita riqueza em poucas mãos (65% da riqueza do Brasil estão em mãos de apenas 20% da população), que faz dos pobres vítimas do descaso do governo, da falta de planejamento e do rigor da lei sobre aqueles que, ansiosos por multiplicar seu capital, ignoram os marcos regulatórios e anabolizam a especulação imobiliária. E ainda querem flexibilizar o Código Florestal, repito!
 
Frei Betto é escritor, autor de "A arte de semear estrelas" (Rocco), entre outros livros. Página na web e Twitter: http://www.freibetto.org/ twitter:@freibetto

 

Copyright 2011 – FREI BETTO – Não é permitida a reprodução deste artigo em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização do autor. Assine todos os artigos do escritor e os receberá diretamente em seu e-mail. Contato – MHPAL – Agência Literária (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

 

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Comentários   

0 #13 Você, o Frei Beto e muito maisRaymundo Araujo Filho 08-02-2011 15:57
Dulcinéia: No caso do Lulla, são Você, o Frei Beto e cerca de 84% da população que o acham digno de respeito e apoio político e, embora ele não seja nenhum limítrofe mental (talvez de caráter, sim, também clamam por um beneplácito a ele, jamais dado a qualquer político. Deve ser a cara de Koala Exótica Fantasiada de Ex Operário que ele tem....

Já a DiLLma, foi eleita apenas com cerca 35% dos elores aptos a votar, mas pelo visto o apoio que você, o Frei Beto e DESCARADAMENTE toda a mídia (aquela, o PIG, lembra?) elevarão este apoio rapidinho.

Mas, não me convencem, pois não expõem argumentos, apenas argumentações vazias e sem fundamentos. Aliás, é um diálogo político injusto este que me impõem estes ex debatedores e hoje, apenas defensores de governos.

Mas, Frei Beto e Dulcinéia, com as suas imensas misericórdias irão, certamente para o Céu.

Já eu, agnóstico que sou por convicção e ateu na prática, não sei o que me reserva o pós vida....
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0 #12 Frei Betto e RaymundoDulcinéa 07-02-2011 22:23
Sinto-me completamente afinada com as posições e os escritos de Frei Betto.
Como militante entendo todas as razões de ter saído do governo, até porque li os dois livros em que tratou do tema.
Entendo também porque, não obstante tudo, apoiou Dilma e escreveu um artigo aqui, o "Obrigado, Lula!" ao qual postei o pequeno comentário "Obrigada, Frei Betto!".
Quanto ao Raymundo já somos velhos conhecidos virtuais.
Concordei, Raymundo, com o que escreveu no artigo sobre as tragédias na região serrana do Rio e outros locais. Tenho a mesma indignação.
Mas não posso concordar com a dureza com que trata Lula e agora a Dilma, inclusive colocando os dois lls nos nomes deles. Não respondi seus emails porque viajei e só retornei no final de janeiro.
Um grande abraço, convergente e divergente, companheiro!
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0 #11 Faltou dizerWendell Setubal 06-02-2011 10:34
O que dizer do trêfego Carlos Minc? Foi secretário do Meio Ambiente do primeiro governo Cabral, deixou para ser ministro do governo Lula e agora voltou a ser secretário de Cabral. O que fez nos cargos em relação às encostas? O governo do qual fez parte pouco realizou de reforma agrária, atestado até pelo semiadesista MST. Onde estão as preocupações ambientais do sr. Minc, que adora dar entrevistas, mas apoiou Belo Monte, conciliou com o agronegócio mais do que Marina Silva, no Rio, liberou os eucaliptos, que haviam sido proibidos por uma lei do deputado Minc!!!! Ele mesmo, no poder, se desdisse, metamorfose ambulante tal como Luis Inácio. Enfim, além das questões gerais e estruturais, como a ausência de reforma agrária, há que se cobrar também de gente como Minc, que ocupou cargos no qual poderia ter começado a equacionar a questão das construções nas encostas. Não fez e ficou quase mudo em todo este final de janeiro trágico no Rio. Por fim, em adendo ao comentário do Raimundo, registre-se que o PT de São Gonçalo tem agora três secretarias na prefeitura, comandada por Aparecida Panisset, governo cheio de condenações por desvio de verba, favorecimento de ongs evangélicas ligadas a ela, enfim, o habitual no país.
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0 #10 EsqueciRaymundo Araujo Filho 04-02-2011 09:36
O nome do Cramunhão é general emílio garrastazu médice.

Nesta batida, tu chegas lá Diego! (Não digo em ser homenageado pela AMAN, afinal não se pode ter tudo
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0 #9 Ame-o ou Deixe-oRaymundo Araujo Filho 04-02-2011 09:25
No discurso do Diego, aí em cima, só faltou o Ame-o ou Deixe-o, do velho, morto e carcomido (mas homenageado pelos cadetes formandos da AMAN, em dez/2010.

Mas, Diego chega lá, tenho a certeza. E em nome do Povo....
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0 #8 Diego Silva 31-01-2011 21:35
Os caras se dizem socialistas mas repudiam seu próprio povo,fala-se de "lulofascismo" e etc. PQP, é difícil entender que o pessoal gosta do cara porque querendo ou não o probre vive melhor do que antes? Isso é fato irrefutável, um povo que vinha de Figueiredo, Sarney e tudo mais, quando veio um menos pior o povo se encantou. Esse é o fato. O cara sanou todos os problemas? Não. Poderia ter feito mais? Sim, mas não é difícil entender porque o pessoal gosta dele.Isso aí é coisa de comunista elitista que quer anarquisar mas não sabe estabelecer a ordem. Cara contaminado de cultura estrangeira, que repudia seu próprio povo. O Brasil é muito grande pra vocês!!
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0 #7 ÊSilva 31-01-2011 12:51
Já é reconhecido pela história a não existência de câmaras de gás no territorio nacional socialista. O cara está assistindo de mais Fantástico e Boris Casoy hehehe
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0 #6 Catástrofes SerranasJoão Rodrigues de Paiva Filho 31-01-2011 09:31
Lá fora o Brasil é um país que sempre está em pleno desenvolvimento, com tudo sob controle. Mas o que dizer desses problemas ambientais envolvendo pessoas inocentes? Sinceramente, acho que não está nada bem em nosso país. Só crescemos economicamente e nunca socialmente. Isso é uma vergonha, um insulto a todos nós brasileiros. O governo deve olhar mais para os pobres, algo que vá além do mero assistencialismo. Se não haver mudanças concretas nas estruturas de poder nada irá melhorar. Acho também, como o Betto, que a reforma agrária tem de ser feita, e logo. Senão o Brasil nunca será um país de todos, como diz a propaganda na televisão.
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0 #5 Pedro negreiros 29-01-2011 20:25
A frase é de um livro extremamentesimpatico a Cuba, escrito em 1960, que trazia Fidel na Capa e tinha o titulo: "Furacão sobre Cuba".
-"Juntem o Rio com o estado do Rio coloquem um Carlos Lacerda esquerdista na presidnecia e teremos uma ideia do que é Cuba".
Mas para frei Beto, furacões não incomodam à ilha...
Exceto, convenhamos, um furacão chamado Fidel...
Felizmente existe a internet, o depoimento de exilados, a demonstrar a trágica realidade de uma ilha que vive principalmente do trabalho escravo de seus médicos "voluntarios" no exterior, quase sem industrias e que importa 80% dos seus alimentos. Com a comida racionada extremamente, enquanto a burocracia privilegiaeda compra em lojas eSpeciais, recebe Frei Beto principescamente, etc.
Cuba era a maior renda percapita da America Latina antes de Castro.
Hoje está destruida. Poderia ser um gigantesco Rio de Janeiro, só que favorecida por muito turismo americano. Hoje, para a maior parte da população ( excluindo-se os burocratas e os principes das forças armadas) é pouco melhor que o Haiti...
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0 #4 misériajoão nelson silva 29-01-2011 01:35
Lembro Paulo, Capitulo 17, versículo 1 a 5 e seguintes.
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