Correio da Cidadania

Com Netanyahu não tem paz

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("Eu conheço a América. A América pode ser facilmente levada para a direção certa", Bibi Netanyahu, no assentamento de Offra - vídeo veiculado em Israel)

 

Para alguns desavisados, pode parecer positiva a proposta do primeiro-ministro de Israel de prorrogar o congelamento dos assentamentos em troca do reconhecimento de Israel pelos árabes. Não é bem assim.

 

Essa prorrogação seria apenas de dois meses e não impediria uma única obra. Quando acabou o prazo de 10 meses do congelamento, o governo de Tel-aviv aprovou rapidamente planos de construção de 1.600 edificações, garantindo sua execução, pois o congelamento só cobre obras ainda não aprovadas.

 

E o reconhecimento que Netanyahu deseja é o de "Israel, Estado judeu". Com isso, os árabes, que são 20% da população do país e ali vivem há centenas de anos, seriam considerados estrangeiros em sua própria terra. E se legitimaria a expulsão dos 700 mil residentes árabes nas guerras de independência, negando-se seu direito de voltar.

 

Evidentemente, a Autoridade Palestina recusou tal proposta e reafirmou que, sem congelamento, era o fim das negociações. Inaceitável para Obama.

 

Daqui a dois meses serão realizadas eleições legislativas nos EUA e o Partido Republicano aparece como favorito. Rompimento das negociações de paz seria péssimo para as chances do Partido Democrata.

 

Ciente de que sem congelamento a Autoridade Palestina vetaria as negociações, Obama vinha pressionando Netanyahu para aceitar renová-lo.

 

Ao mesmo tempo, prodigalizou-lhe ofertas das mil e uma noites. Segundo Michael Oren, embaixador de Israel nos EUA, declarou ao Washington Post na semana passada, foram generosos "incentivos" diplomáticos, financeiros e na área de segurança em troca dos ambicionados dois meses a mais. Incentivos explicitados por Uri Avnery em "His Father´s Boy" (Anti War, 11/10): "Armas, dinheiro, apoio político, todo um conjunto de garantias nas conversações que ainda nem começaram".

 

Netanyahu disse não. Ele quer mais. Como a mídia israelense informou na semana passada, o objetivo do primeiro-ministro israelense é que os EUA ratifiquem a promessa, que Bush teria feito, de que no futuro acordo de paz a Casa Branca não pediria a retirada de Israel dos territórios tomados aos árabes em 1967.

 

Até aí Obama não vai porque o colocaria contra decisão do Conselho de Segurança da ONU, a opinião pública mundial e também seus aliados no mundo árabe – Egito e Arábia Saudita, especialmente, além do Iraque, cujo apoio ele disputa com o Irã.

 

Obama prefere pressionar também a Autoridade Palestina. Qualificou a oferta de Netanyahu como "construtiva", apelando para que os palestinos retribuíssem com alguma concessão. Foi o que eles fizeram. Aceitariam eventualmente reconhecer Israel do jeito proposto. Antes, porém, o governo de Tel-aviv deveria definir os limites desse Estado. Se fossem os estabelecidos pela ONU, sem os territórios ocupados, tudo bem.

 

Claro, nenhuma das duas propostas era para valer. Netanyahu sabia que os palestinos jamais trocariam o reconhecimento pelo congelamento. Os quais, por sua vez, não tinham dúvidas de que renunciar aos assentamentos na Cisjordânia estava fora das intenções israelenses.

 

A jogada israelense visava provar que eles eram os "good guys" que queriam a paz, rejeitada pela intolerância dos "bad guys" palestinos. A contra proposta árabe mostrou que esse rótulo era imerecido.

 

A única concessão da Autoridade Palestina foi dar um mês para os EUA convencerem Israel a continuar o congelamento. Difícil de acontecer.

 

Obama sente-se fraco diante de Netanyahu, maciçamente apoiado pelos judeus americanos - 62%, conforme pesquisa recente da American Jewish Opinion. Apesar de representarem apenas 3% dos eleitores, eles pesam muito em estados como Nova York e Flórida, onde estão mais concentrados. E, o que é mais importante, estima-se que judeus americanos fornecem 40% das contribuições das campanhas eleitorais do Partido Democrata, além de sua causa ter a simpatia da maioria da grande mídia e dos padres e pastores fundamentalistas.

 

Para agradar esse público, tanto quanto para adoçar Netanyahu, o governo americano apressou-se a manifestar-se favorável ao reconhecimento internacional de Israel como "Estado judeu". Oficialmente, pelo porta-voz do Departamento de Estado, P. J. Crowley: "Nós reconhecemos a especial natureza do Estado israelense. É um Estado para o povo judeu". Exatamente o que postula o sionismo.

 

Por sua vez, o governo de Israel vem de aprovar a exigência de que os novos habitantes não-judeus jurem lealdade a Israel como "Estado judeu" para serem aceitos como cidadãos do país. Há ainda ameaças de desdobramentos indesejáveis, ministros do governo atual insistem em que essa exigência deva ser estendida também aos não-judeus residentes.

 

Comentando a exigência, declarou Ahmed Tibi, parlamentar árabe-israelense: "Nenhum Estado do mundo forçaria cidadãos ou aqueles que buscam a cidadania a jurar fidelidade a uma ideologia (sionismo). Israel provou que é uma democracia para judeus, não para árabes". O político trabalhista judeu Isaac Herzog foi até mais incisivo: "O fascismo está devorando as bordas da sociedade".

 

Tudo isso desfez as esperanças nas negociações de paz, dos poucos palestinos que as tinham.

 

Agora, eles se voltam para os EUA e a União Européia. Em reunião com os ministros do Exterior da França, Espanha e Finlândia, na Jordânia, Abbas, da Autoridade Palestina, pediu o apoio deles para uma declaração unilateral da independência da Palestina.

 

É um lance corajoso. Mas as primeiras reações da Europa foram animadoras. Kouchner, ministro do Exterior da França, afirmou que, embora preferindo que a paz saísse de negociação entre as duas partes, apoiaria a discussão da independência da Palestina no Conselho de Segurança da ONU.

 

Mas e os Estados Unidos? Ilusões à parte, Obama dificilmente topará.

 

Tudo indica que ele não topará brigar com o establishment do seu partido, a maioria dos deputados e senadores democratas, ora disputando eleições com financiamento dos lobbies judeu-americanos e/ou a maioria da mídia e dos padres e pastores de extrema-direita.

 

Até agora ele só fez ignorar os novos rumos da opinião pública do seu país. Pesquisas recentes mostram que ela não é mais pró-Israel como costumava ser: 66% dos americanos preferem não tomar partido no contencioso árabe-israelense; 62% são contra os assentamentos na Cisjordânia; para 43%, Israel é apenas um pouco importante para os EUA, contra 33% que acham importante. Finalmente, por 50% a 47%, vence a idéia de que, em caso de ataque a Israel, os EUA não devem mandar tropas.

 

Apesar desta mudança, Obama não tem tido coragem de mudar em relação a Tel-aviv, usando de ameaças para pôr os israelenses na linha. Prefere procurar acreditar que Netanyahu é um parceiro na busca de uma paz justa na Palestina. Embora os fatos não parem de provar o contrário.

 

Luiz Eça é jornalista.

 

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